JAMES CAGNEY I

abril 24, 2013

Embora tenha sido comumente associado ao filme de gângster, James Cagney brilhou com intensidade nos mais variados gêneros, sempre empolgando o público com suas interpretações inesquecíveis. Todos os seus filmes valem à pena serem vistos pela sua presença, pela força de sua personalidade, pela vitalidade que descarrega na tela, pelo estilo original e sutileza de sua representação.

James Francis Cagney Jr. (1899 -1986) nasceu na East 8th Street em Nova York e cresceu na área de Yorkville, para onde a família se mudou em 1901. Seu pai, de descendência irlandesa, era um atendente de bar, que se tornou brevemente proprietário de um saloon e morreu durante a epidemia de gripe espanhola em 1918. Sua mãe, Carolyn Elizabeth Nelson, de origem norueguesa, foi o suporte de uma família de cinco filhos.

Em Yorkville, James era um campeão das brigas de rua e, como na vizinhança viviam muitos imigrantes, ele se acostumou a ouvir não somente o idioma alemão, mas também o húngaro, chinês, espanhol, italiano, russo, polonês e sobretudo o iídiche.

Quando terminou seus estudos em uma escola pública, começou a trabalhar, aos quatorze anos de idade, como office-boy do New York Sun. Posteriormente, chegou a dar duro de dia, na Biblioteca Pública de Nova York; de noite, como bedel na East Side Settlement House; aos domingos, como vendedor de bilhetes na Hudson River Day Line.

Em 1917, James exerceu a função de mensageiro no clube The Friars, frequentado por atores da Broadway e nessa ocasião era comum ganhar ingressos para alguns espetáculos teatrais. Foi assim que ele viu Anna Pavlova dançar e descobriu que  a dança estava dentro de si.

Após se formar na Stuyvesant High School, James estudou desenho na Lenox Hill Settlement House, onde chegou a desenhar e pintar alguns cenários e pôsteres, além de prestar serviço à instituição como porteiro.

Certo dia, seu irmão Harry, que estava estudando medicina na Universidade de Columbia, falou com James que a universidade estava recrutando alunos para o Student Army Training Corps. Havia vaga para pessoas com talento para o desenho e, se ele ingressasse no SATC, receberia um diploma da Columbia e se tornaria um oficial do Exército no dia de sua formatura. James matriculou-se imediatamente e, durante o curso, usufruiu especialmente das aulas de alemão com o Professor Mankiewicz, pai do roteirista Herman J. e do diretor Joseph L. Mankiewicz. Entretanto, quando James Frances Cagney morreu, Cagney Jr. deixou a escola e aceitou emprego como empacotador na loja de departamentos Wanamaker, a fim de ajudar Harry a continuar seus estudos.

Um colega da Wanamaker, ex-artista do vaudeville, indicou James para substituir um amigo no côro masculino de uma revista musical intitulada Every Sailor e  ele foi, sem saber que teria que irromper no tablado vestido de mulher no meio de outras sete “beldades”.

No verão de 1920, James foi escolhido para integrar o coro de um musical da Broadway, Pitter Patter. Nessa ocasião, conheceu a dançarina Frances Willard Vernon, a “Billie”, e os dois se casaram em 1922, permanecendo juntos até a morte dele. Billie ficou intrigada com James porque, em vez de jogar cartas, como fazia a maioria dos rapazes do coro entre os números musicais, ele lia livros. Isto já era singular, mas quando Billie o ouviu, discutindo com outro colega interessado em literatura o romance “Jean-Christophe” de Romain Rolland, referindo-se ao livro como um roman-fleuve (romance longo contando a história de várias gerações de uma família), ela ficou impressionada com o fato de que alguém tão bonitinho pudesse ter tanta inteligência. Anos depois, Billie costumava brincar com James dizendo: “Naquele instante, decidí que você era o meu roman-fleuve”.

Quando o musical saiu de cartaz, James e Billie tentaram o teatro de variedades (o casal atuou junto em uma excursão pelo país com o espetáculo Lew Field’s Ritz Girls of 19 and 22),  procuraram em vão emprego na indústria do cinema em Los Angeles e, finalmente, de volta a Nova York, James obteve um papel dramático em Outside Looking In de Maxwell Anderson, ao lado de Charles Bickford, recebendo elogios pela sua interpretação.

A partir daí, suas perspectivas artísticas se ampliaram, com muito trabalho (Broadway, Women Go On Forever, The Grand Street Follies of 1928 (no qual James dançava um número intitulado From Tango to Taps com Sophia Delza), The Grand Street Follies of 1929, Maggie the Magnificent), até o sucesso com Joan Blondell em Penny Arcade, que o levou para Hollywood.

Al Jolson adquiriu os direitos de filmagem de Penny Arcade e, ao revendê-los para a Warner Bros., pediu a Jack Warner que fôsse ver a peça antes que ela saísse de cartaz, não somente para avaliar seu potencial como base de um filme sonoro, mas também para apreciar os talentos de James Cagney e Joan Blondell. Warner foi, ficou convencido, e contratou os dois artistas.

O diretor de Sinner’s Holiday (o título no cinema de Penny Arcade), John G. Adolfi, achou que eles possuíam o dinamismo necessário para assumir os papéis principais, porém Darryl Zanuck, não concordou, insistindo que Cagney e Blondell deveriam repetir os papéis secundários, que haviam interpretado na Broadway, ficando Grant Withers e Evelyn Knapp com os leading roles.

O próximo filme de Gagney, A Caminho do Inferno / Doorway to Hell / 1930, dirigido por Archie Mayo e com história de Roland Brown indicada para o Oscar, deu início a um ciclo de filmes de gângster e nele, James fazia o papel do melhor amigo e capanga de Louis Ricarno, apelidado de “Baby Face”, interpretado por Lew Ayres.

Subsequentemente, Cagney fêz duas pequenas participações em Other Men’s Women / 1931 (Dir: William Wellman) e O Milionário /  The Millionaire/ 1931 (Di: John G. Adolfi). Neste último, Cagney intervém em uma única cena de dois minutos, marcando sua presença, como um corretor de seguros, ao lado de George Arliss, um dos astros da Warner  nos anos trinta.

O segundo filme de gângster na carreira de Cagney foi O Inimigo Público / The Public Enemy / 1931. No enredo, dois amigos de infância Tom Powers (James Cagney) e Matt Doyle (Edward Woods), criados em um bairro pobre, enveredam pelo crime, na época da Lei Sêca. Tom acaba sendo metralhado por uma quadrilha rival e depois deixado agonizante na porta da casa de sua mãe. O diretor William Wellman recordou: “Quando ví os primeiros rushes, disse a Zanuck: ‘Houve um terrível engano. Os papéis estão trocados. Cagney é quem deve ser o tough guy e ter o papel principal. Zanuck respondeu: ‘Bem, você sabia que Eddie Woods está noivo da filha de Louella Parsons? (a poderosa colunista de Hollywood, protegida de William Randolph Hearst)’ Eu disse: ‘Pelo amor de Deus, você vai deixar uma jornalista dirigir seus negócios?’ E ele, vencido, concordou: ‘Mude-os’ Nós os mudamos e Cagney se tornou um astro”.

Duas cenas ficaram célebres: a primeira em que Cagney espreme um grapefruit no rosto de Mae Clarke e a cena final, quando o irmão de Cagney no filme abre a porta e o corpo dele, enrolado em ataduras ensopadas de sangue, como se fosse uma múmia, balança por uns momentos e cai de bruços no chão.

O filme foi recebido entusiasticamente pelos críticos e público e Cagney percebeu que seu contrato de sete anos estava totalmente inadequado quanto ao salário. Seu agente, William Morris, queixou-se ao estúdio. Não houve resposta. Cagney mudou de agente e o novo negociador, George Frank, dirigiu-se diretamente a Darryl Zanuck, argumentando que O Inimigo Público custara 151 mil dólares, já estava rendendo mais de 1 milhão de dólares nas bilheterias, e ainda iria entrar mais dinheiro nos cofres da Warner.

Enquanto aguardava a resposta dos patrões, Cagney fêz mais dois filmes, As Mulheres Enganam Sempre / Smart Money / 1931 (Dir: Alfred E. Green) e Travessuras de uma Loura ou Gente Esperta / Blonde Crazy / 1931 (Dir: Roy Del Ruth). No primeiro filme, ele atuou pela única vez ao lado de Edward G. Robinson, como assecla do chefão do jogo ilegal; no segundo filme, teve seu primeiro papel principal, contracenando com Joan Blondell. Cagney é Bert Harris, mensageiro de hotel e Blondell, uma camareira. Eles se metem a fazer trapaças e são enganados por um vigarista mais esperto (Louis Calhern) e sua cúmplice (Noel Francis). Cagney e Blondell se completaram magnificamente.

Terminadas essas filmagens, Cagney foi para Nova York. Após seis meses de suspensão por causa de sua revbeldia, ele voltou, ganhando mil dólares semanais. Seu irmão William, acompanhou- o, para cuidar de seus negócios e, ao mesmo tempo, tentar a sorte como ator no cinema.

O primeiro filme de Cagney depois da suspensão, foi Peso do Ódio / Taxi! / 1932 (Dir:  Roy Del Ruth), no qual ele interpreta o papel de Matt Nolan, líder de um grupo de choferes de taxi, que desafia o poderoso sindicato da classe. Sua esposa, Sue (Loretta Young) tenta em vão refrear-lhe a combatividade. Quando o irmão de Matt é morto, ele parte para a vingança. Ficou famosa a cena em que o ator, embora sendo católico, demonstrava sua fluência no idioma iídiche. Outra curiosidade foi a participação do então novato George Raft como seu rival em uma cena de concurso de dança Peabody.

Anos mais tarde, Cagney faria sempre questão de dizer que nunca havia pronunciado as palavras que seus imitadores sempre punham na sua boca: “You dirty rat!”. “Eu nunca disse isso”, ele insistia. Porém, em Peso do Ódio, pouco antes de descarregar sua arma na porta do vilão, Cagney grita: “Come on and take it, you dirty yellow bellied rat, or I’ll give you through the door!”.


Antes de deixar a Warner novamente, por insatisfação quanto ao seu salário e por estar descontente com o excesso de apresentações pessoais em campanhas de promoção dos filmes que o estúdio estava impondo aos seus astros, Cagney fêz  Delirante / The Crowd Roars /  1932 (Dir: Howard Hawks) e Tudo ou Nada / Winner Take All / 1932 (Dir: Roy Del Ruth). No primeiro filme, ele surge como Joe Greer, ás do automobilismo que tenta impedir que seu irmão, Eddie (Eric Linden) siga a mesma carreira e o adverte sobre o passado de Anne (Joan Blondell), uma loura por quem o jovem está interessado. Eddie casa-se com Anne e se torna campeão enquanto Joe, após ter causado acidentalmente a morte de um colega, entra em decadência. A namorada de Joe, Lee (Ann Dvorak), procura incutir-lhe confiança em si mesmo e afinal ele substitui Eddie em uma corrida e se reconcilia com o irmão. A cena que revela mais originalidade é a do desfecho, quando os pilotos feridos continuam a corrida nas ambulâncias que os levam para o hospital. No segundo filme, assume as feições de  Jim Lane, ídolo do ringue que, sem dinheiro por causa das farras, interna-se, graças a uma coleta de seus fãs, em uma casa de saúde no Novo México, onde conhece Peggy (Marian Nixon), que está sendo despejada. Para ajudá-la a pagar o aluguel, Jim volta a lutar e, animado com o sucesso, envolve-se com uma ricaça (Virginia Bruce). Para esse seu primeiro filme em ambiente de boxe, Cagney treinou durante três semanas com um pugilista verdadeiro, o campeão de peso médio, Harvey Perry.

Ao se afastar do estúdio, o ator deixou dois filmes em preparação: Bisbilhiotices / Blesssed Event20.000 Anos em Sing Sing / Twenty Thousand Years in Sing Sing, nos quais foi substituido respectivamente por Lee Tracy e Spencer Tracy. Em setembro de 1932, ele retornou mais uma vez à Warner, depois de ter chegado a um acordo pra receber três mil dólares semanais com possibilidade de aumentos.

Jack Warner contou nas suas memórias: “Cagney moveu tantas ações judiciais contra nós, que nossos advogados ficavam loucos. Tínhamos que encerrar cada ação, oferecendo-lhe um novo contrato, mas eu penso que, no final das contas,  ele merecia”. Jack apelidou Cagney de “the professional against-er”, título que este  ostentava com orgulho.

O primeiro filme de Cagney, após o retorno, foi Hard to Handle / Difícil de Lidar 1933 (Dir: Mervyn LeRoy), comédia de compasso frenético no qual ele fazia o papel de Lefty Merrill, promotor de maratonas de dança que se vê em apuros quando o sócio foge com o dinheiro do prêmio e a mãe (Ruth Donnelly) da vencedora (Mary Brian) tenta forçá-lo a se casar com a filha. Cagney detestava LeRoy, considerando-o um mau diretor, um conversa fiada que dependia dos seus fotógrafos e dava instruções as mais disparatadas para os atores. Achava inclusive que LeRoy era um bajulador, por ter se casado com a filha de Harry Warner, o presidente do estúdio.

No mesmo ano de 1933, seguiram-se O Furão / Picture Snatcher / 1933 (Dir: Lloyd Bacon), O Prefeito do Inferno / The Mayor of Hell / 1933 (Dir: Archie Mayo), Belezas em Revista / Footlight Parade / 1933 (Dir: Lloyd Bacon) e O Mulherengo / Lady Killer (Dir: Roy Del Ruth).

Em O Furão, Cagney é Danny Kean, ex-condenado, que vai trabalhar em um jornal como “fotógrafo de escândalos” e se apaixona pela filha (Patricia Ellis) do policial que o conduzira à prisão. Como sempre exuberante, ele garante a diversão nesta comédia despretensiosa e engraçada, dirigida com rapidez por Lloyd Bacon; porém Alice White quase rouba o filme como uma lourinha amalucada.

Em O Prefeito do Inferno, Cagney é Patsy Gargan, ex-escroque, que se torna superintendente  de um reformatório como prêmio dos políticos corruptos seus amigos. Inicialmente, ele não tem interesse na escola, mas sua simpatia pelos garotos, que cresceram nas favelas como ele próprio e sua atração pela enfermeira residente, Dorothy Griffith (Madge Evans), o convencem a levar o trabalho a sério. Este melodrama criminal eficiente, que na verdade pertence mais aos garotos e a seu líder carismático interpretado por Frankie Darro, ofereceu ainda um clímax inesperado, que agradou o público.

Em Belezas em Revista, Cagney é Chester Kent, produtor de prólogos musicados que eram apresentados nos palcos antes da exibição do filme. Neste musical de bastidores, alternando o lufa-lufa na preparação dos espetáculos com pequenos trechos cômicos e românticos, surgem sucessivamente, mais para o final, três números musicais formidáveis criados pelo gênio do coreógrafo Busby Berkeley, “Honeymoon Hotel”, “Shanghai Lil” e “By the Waterfall”. Cagney fala que nem uma metralhadora e sapateia naquele seu estilo saltitante em “Shanghai Lil” ao lado de Ruby Keeler.

Em O Mulherengo, Cagney é Dan Quigley, lanterninha de cinema que, ao ser despedido, trilha a senda do crime. Ele se esconde em Hollywood da polícia de Nova York, consegue uma “ponta” como índio em um filme e atinge o estrelato; porém seu  bando aparece e tenta convencê-lo a roubar a casa dos astros. Cagney comete nova “indelicadeza” com Mae Clarke (a moça do grapefruit em O Inimigo Público), desta vez arrastando-a pelos cabelos, e namora Margaret Lindsay, nesta sátira alegre, dirigida em um ritmo veloz por Roy Del Ruth.

No seu próximo filme, Bancando o Cavalheiro / Jimmy the Gent / 1934, Cagney iniciou sua longa e frutífera conexão com Michael Curtiz, que ele admirava e, ao mesmo tempo, desprezava. Cagney disse: “Mike era um bastardo pomposo, que não sabia como tratar os atores, mas ele certamente sabia como lidar com uma câmera”.

Na trama de Bancando o Cavalheiro, Cagney intrerpreta Jimmy Corrigan, um trapaceiro, que forja herdeiros, para se habilitarem em inventários, ainda não abertos. Ele quer reconquistar a ex-assistente (Bette Davis) e, para isso, tenta se transformar em um cavalheiro fino e elegante. Reunidos nesta comédia turbulenta, sob as ordens do astuto Michael Curtiz, Bette Davis e James Cagney têm novamente em sua companhia Alice White em gostosa caracterização de dumb blonde.

Cagney participou de mais três filmes no ano de 1934: O Homem Que Eu Perdí / He Was Her Man / 1934 (Dir: Lloyd Bacon), Aí Vem a Marinha / Here Comes the Navy (Dir: Lloyd Bacon) e Comprando Barulho / The St. Louis Kid (Dir: Ray Enright).

Em O Homem Que Eu Perdí, Cagney é Flicker Hayes, arrombador de cofres recém-saído da prisão, que concorda em praticar um roubo com os homens que o traíram e, depois do golpe, denuncia-os à polícia. Um deles escapa e persegue Flicker com seus capangas até San Francisco, onde ele conhece Rose (Joan Blondell), uma ex-prostituta, que vai se casar com um pescador português. No final da trama, para salvá-la, Flicker se entrega aos bandidos. Cagney e Blondell atuam juntos pela sétima e última vez.

Em  Aí Vem a Marinha, Cagney é Chesty O’Connor, rapaz temperamental, que vive infringindo as regras da Marinha e namora a irmã (Gloria Stuart) de seu superior hierárquico,  Biff Martin (Pat O’Brien), contra a vontade deste. Filmada a bordo do U.S.S. Arizona e na Base Naval de San Diego, foi o primeiro dos oito filmes que Cagney fez com Pat O’Brien e um dos melhores, tendo sido indicado ao Oscar de Melhor Filme de 1934.

Em Comprando Barulho, Cagney é Eddie Kennedy, chofer de caminhão combativo que se envolve em um conflito entre uma empresa de transporte e produtores de leite em greve. Injustamente acusado de assassinato, ele sai em busca do verdadeiro culpado e de sua namorada (Patricia Ellis), que fora raptada pelos agentes da transportadora. Cagney naquele tipo de filme que só a Warner sabia fazer, formou uma boa dupla com Allen Jenkins, seu coadjuvante em várias ocasiões.

Aplicando a fórmula semelhante à de Aí Vem a Marinha, a Warner realizou  Fuzileiros do Ar / Devil Dogs of the Air / 1935 (Dir: Lloyd) outro filme em ambientes militares autênticos. Desta vez, Cagney surge como Tommy O’Toole, um rapaz que, estimulado por um colega de infância, William Brannigan (Pat O’Brien), ingressa no Corpo da Aviação Naval. Sua indisciplina e o namoro com uma garçonete (Margaret Lindsay) fazem nascer uma rivalidade entre os dois. O’Brien e Cagney juntos sempre funcionaram muito bem, mas o maior destaque foi para as cenas aéreas e o desempenho de Frank McHugh – companheiro e Cagney em inúmeros espetáculos – como o chofer de ambulância que não consegue arranjar feridos para transportar. Por ocasião do lançamento de Fuzileiros do Ar, Cagney foi anunciado como um dos Dez Campeões de Bilheteria de Hollywood.

Seus filmes seguintes foram: G-Men Contra o Império do Crime / G-Men / 1935 (Dir: William Keighley), Filhinho de Mamãe / The Irish in Us / 1935 (Lloyd Bacon), Sonho de Uma Noite de Verão / A Midsummers Night’s Dream / 1935 (Dir: Max Reinhardt, William Dieterle), Cidade Sinistra / Frisco Kid / 1935 (Dir: Lloyd Bacon), Heróis do Ar / Ceiling Zero / 1935 (Dir: Howard Hawks), Pesos e Medidas / Great Guy / 1936 (Dir: John G. Blystone), Domando Hollywood / Something to Sing About / 1936 (Dir: Victor Schertzinger), Comprando Barulho / Boy Meets Girl / 1938 (Lloyd Bacon), até receber sua primeira indicação para o Oscar por sua atuação em Os Anjos de Cara Suja / Angels With Dirty Faces / 1938 (Dir: Michael Curtiz).

Em Contra o Império do Crime, Cagney é James “Brick” Davis, jovem advogado protegido e educado por um gângster, que se torna G-Man, para vingar a morte de seu melhor amigo. Em uma missão, ele é obrigado a matar seu antigo protetor e pensa em deixar o FBI. Depois, muda de idéia, para ajudar a amiguinha (Margaret Lindsay), mantida como refém pelo líder da quadrilha. Para “amansar” a censura, a Warner colocou Cagney do lado da lei neste melodrama criminal, um dos filmes mais populares do ator.

Em O Filhinho da Mamãe, Cagney faz o papel de um dos três filhos que Mamãe O’Hara (Mary Gordon) criou: Pat (Pat O’Brien), policial; Mike (Frank McHugh), bombeiro; e ele, Danny, promotor de lutas de boxe. Pat enamora-se de Lucille (Olivia de Havilland), mas esta gosta de Danny, surgindo o conflito entre os irmãos. Entrementes, um dos pugilistas de Danny fica impossibilitado de subir ao ringue e ele o substitui, ganhando a luta e a garota. Lloyd Bacon era um dos poucos diretores em quem Cagney confiava. Ele disse: “Lloyd conhecia seu ofício, porém gostava de apressar tudo, de ver tudo logo terminado. Algumas vêzes, estávamos ensaiando diante da câmera, ele filmava as cenas subrepticiamente e as colocava no filme”.

Sonho de Uma Noite de Verão é uma adaptação cinematográfica da peça de William Shakespeare, realizada pelo produtor e diretor teatral alemão Max Reinhardt com a ajuda de seu ex-discípulo William Dieterle.  A história é bastante conhecida. Em Atenas, Lisandro (Dick Powell) e Demétrio (Ross Alexander) estão apaixonados por Hérmia (Olivia de Havilland) enquanto Helena (Jean Muir) ama futilmente Lisandro. Puck (Mickey Rooney), escravo do Rei Oberon (Victor Jory), direciona o amor de Lisandro para Helena por meio de uma poção mágica. A mesma poção é usada por Oberon, para punir sua rainha, Titânia (Anita Louise), e ela se apaixona temporariamente por Bottom (James Cagney), tecelão transformado em asno, que estava ensaiando uma peça, para comemorar as núpcias de Teseu, Duque de Atenas (Ian Hunter) com Hipólita (Verree Teasdale). Quando amanhece, o encanto se desfaz e tudo volta ao normal.

Cagney nunca sentiu desejo de interpretar Shakespeare, porém Reinhardt achava que ele era o melhor ator em Hollywood. Reinhardt declarou em várias ocasiões que “Poucos artistas jamais tiveram a sua intensidade, a sua energia dramática. Cada movimento do seu corpo e suas mãos incríveis contribuem sempre para o que ele está tentando dizer”.

No entanto, no caso de Sonhos de Uma Noite de Verão, Cagney exagerou na interpretação, usou demais as suas mãos e abusou de uma risada incessante e irrelevante. A maioria dos críticos achou que o dinamismo de Cagney não casava bem com o personagem de Bottom. No filme, sobressai a fotografia deslumbrante de Hal Mohr que arrebatou o Oscar … sem ter sido indicado, caso único na história da Academia, em virtude da aplicação do write-in vote, prática então vigente, que permitia ao votante incluir na cédula um candidato próprio. Reinhardt trouxe o compositor vienense Erich Wolfgang Korngold, a fim de providenciar o arranjo da música de Mendelssohn, grande aquisição para a Warner, onde ele comporia algumas das melhores partituras de cinema de todos os tempos.

Em Cidade Sinistra, Cagney é o marujo Bat Morgan, que escapa de ser raptado para trabalhar em um navio e mata um notório bandido, tornando-se todo-poderoso nos antros da jogatina em Barbary Coast. Neste melodrama, parecido com Duas Almas se Encontram / Barbary Coast / 1935, mas inferior a ele, Cagney estranhamente vestido de colete brocado, compõe o tipo agressivo que costuma interpretar, tendo a seu lado mais numa vez Margaret Lindsay.

Em Heróis do Ar, Cagney é Dizzy Davis, piloto irresponsável, que volta para o antigo emprego sob as ordens de um velho companheiro, Jake Lee (Pat O’Brien). Após ser indiretamente culpado por um acidente com outro colega, testa um dispositivo para remover gelo das asas dos aviões, em um vôo suicida. A interpretação humana e contida de Cagney neste drama de aviação suscitou elogios da crítica.

Descontente mais uma vez com a Warner, Cagney ajuizou uma ação contra o estúdio e se tornou um ator free lancer, assinando contrato com a Grand National, Film Inc., uma pequena companhia fundada por Edward L. Alperson. No primeiro filme na Grand National Pesos e Medidas, Cagney personificou Johnny Cave, honesto funcionário do Departamento de Pesos e Medidas que fazia campanha contra os defraudadores e, embora sendo do lado da lei, não hesitava em usar métodos iguais aos deles. O filme reune de novo a dupla James Cagney e Mae Clarke. A certa altura da narrativa – é o que nos conta  John McCabe na extraordinária biografia de James Cagney (Carroll and Graf, 1997), da qual extraímos muitas informações para escrever este artigo -, Cagney  faz esta repreensão para Clarke: “Meu melhor amigo foi atropelado, está ocorrendo uma Guerra Civil na Espanha, temos um terremoto no Japão – e agora você põe este chapéu!”, apontando para a criação atrevida na sua cabeça.

Quando Cagney fêz oitenta anos de idade, perguntaram-lhe qual seria o seu filme, com exceção de A Canção da Vitória, que ele gostaria de rever e ele escolheu o segundo que fez para a Grand National, Domando Hollywood / Something to Sing About / 1937  (Dir: Victor Schertzinger), no qual ele interpreta o papel de Terry Rooney, cantor, dançarino e chefe de orquestra que faz dupla com sua namorada,  Rita Wyatt (a soprano Evelyn Daw). Cagney gostava das canções do filme, compostas pelo versátil diretor Swertzinger e tinha uma admiração particular pelo estilo dos dançarinos Johnny Boyle e Harland Dixon, seus antigos companheiros no vaudeville, que estavam seu lado no espetáculo.

John Mc Cabe nos informa que, nesta época, o ator viveu uma de suas mais curiosas experiências em Hollywood. Ele recebeu um telefonema de Charles Chaplin, convidando-o para uma visita à sua mansão em companhia de Billie. “Venha mesmo”, disse Chaplin, “Gostaria de discutir um assunto de negócios com você e passaremos um dia agradável”. Cagney ficou intrigado como aquele “assunto de negócios. “Que diabos, tínhamos em comum?. Então eu disse sim e nós fomos”. Depois de um almoço muito bem servido e uma longa conversa, o genial criador de Carlitos finalmente lhe disse que havia escrito um roteiro sobre Napoleão e perguntou a Cagney se ele estava interessado. Cagney, respondeu com toda delicadeza que não e teve que aguentar por mais algum tempo, segundo ele mesmo comentou, o palavrório exibicionista de Chaplin. “Raramente eu tive um dia mais entediante, mais desperdiçado do que aquele”.

4 Responses to “JAMES CAGNEY I”

  1. Excelente texto, como sempre! Vir a este site é sempre uma inspiração e um incentivo para continuar com meu trabalho sobre cinema clássico, pois ambos sabemos o quanto é cansativo pesquisar e escrever textos de qualidade como esse. James Cagney foi um dos atores que mais influenciaram a minha juventude cinéfila, graças aos anti-heróis que viveu nas telas e cujos filmes pude assistir nas madrugadas na TV nos anos 70 e 80. Prova maior de que era um grande ator, foi que em meio a tantos personagens memoráveis, tenha sido premiado com um Oscar justamente em um musical. Grande abraço, Professor!

  2. Olá Marcio. Que bom receber mais uma visita sua. Eu tinha pensado em fazer um artigo sobre Clara Bow, mas depois do seu (bem escrito e com lindas fotos), desistí. Parabéns.

  3. Saudações Professor A.C, tudo em paz?

    Fascinante matéria que pelo visto ainda tem muito que traçar. Cagney sem dúvida foi um ator eclético, apesar da fama de “pequeno gangster”, mas ele sabia como ser um gigante nas telas. Parabéns por este ingrediente cultural sobre este que foi um dos mais notáveis nomes da Sétima Arte. Abraços e tudo de bom!

    Paulo Néry Telles

  4. Olá, Nery. Prazer em revê-lo. Lí seu artigo sobre Stewart Granger. Eu quase o conhecí pessoalmente, quando estive em Los Angeles, em fevereiro de 1993, alguns meses antes de sua morte. Um amigo meu (brasileiro) era gerente da loja Laser Blazer, especializada nos laser discs, que era muito frequentada pelo pessoal do cinema, com os quais ele tinha intimidade e assim poderia ter me apresentado ao “sucesssor de Errol fFynn”. Passei um mês em Los Angeles e costumava passar na loja todos os dias; mas, infelizmente, nesse período, o Granger não esteve lá.Um forte abraço.

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