BETTE DAVIS II

agosto 5, 2016

O próximo filme de Bette Davis foi o melhor de toda a sua trajetória artística: A Carta / The Letter / 1940, dirigido solidamente por William Wyler. Na trama (que prende a atenção do espectador do início ao fim), Leslie Crosbie (Bette Davis), esposa do administrador de um seringal na Malásia, mata Geoffrey Hammond (David Newell), e alega legítima defesa da honra. O marido de Leslie, Robert (Herbert Marshall), pede a seu amigo advogado Howard Joyce (James Stephenson), que a defenda; mas este desconfia da história contada por ela. Suas suspeitas se justificam, quando seu estagiário, Ong Chi Seng (Victor Sen Young), lhe oferece uma carta que Leslie escrevera para Hammond na dia de sua morte, pedindo-lhe que a visitasse, contradizendo assim que ele aparecera em sua casa inesperadamente e embriagado. Hammond confronta Leslie com esta prova, forçando-a a confessar o crime a sangue-frio, porém ela o convence a comprar a carta. O documento está na posse de Li-TI (Gale Sondergaard), a viúva eurasiana de Hammond, que pede dez mil dólares pela missiva e que Leslie traga pessoalmente o dinheiro. A transação é finalizada e, sem a prova da carta, Leslie é absolvida. Robert está pronto para perdoá-la, mas Leslie não conseque esquecer o amante, e vai ao encontro da morte que lhe fôra reservada por Li-Ti.

Bette Davis em A Carta

Bette Davis em A Carta

Em 1938, quando a Warner Bros. pensou em comprar os direitos de filmagem da peça de Somerset Maugham da Paramount, que havia produzido uma primeira versão cinematográfica em 1929, estrelada por Jeanne Eagels, o estúdio consultou o poderoso chefão da autocensura, Joseph Breen, a fim de saber sua reação antes de fechar negócio. Dois dias depois, Breen rejeitou o projeto na sua totalidade porque, tanto a peça quanto o filme de Jeanne Eagels continham adultério sem valores morais compensatórios, além de miscigenação e a impunidade de um crime. Para resolver esses problemas, o roteirista Howard Koch transformou a amante chinesa em uma esposa eurasiana, a fim de minimizar a miscigenação e eliminar a natureza ilícita do seu relacionamento com Hammond, e puniu Leslie pelo seu crime. No texto de Maugham e na sua primeira versão para a tela, Leslie sofria um outro tipo de punição: ela era condenada a viver uma existência melancólica com seu esposo, depois de ter confessado a ele que amava o homem que matara.

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Em termos cinematográficos, vale a pena descrever a sequência inicial: em uma calma noite tropical, a câmera focaliza a lua cheia iluminando a plantação, depois desce verticalmente pelo tronco de uma seringueira, desliza lateralmente para a direita passando por uma folhagem e pelo acampamento dos empregados do seringal, deitados em suas rêdes para dormir ou em beliches. Uma cacatua branca aparece empoleirada em uma cerca. Ouve-se o barulho de tiros, espantando a cacatua, que alça vôo de seu poleiro. Um homem sai de um bungalô colonial em direção à varanda. Um mulher o segue de perto com uma arma na mão. Ele desce a escada e ela desfere mais tiros nele, com o braço estendido. Quando deixa a arma cair, a câmera chega bem perto, e um close-up mostra sua expressão de desprezo e de raiva. Sem uma palavra ou um único corte, essa sequência de abertura introduz o clima, o cenário e a personagem principal do filme, tornando-se digna de uma antologia.

William Wyler dirige Bette em A Carta

William Wyler dirige Bette em A Carta

Gale Sondergaad em A Carta

Gale Sondergaad em A Carta

Outro momento marcante ocorre perto do final da história, quando Leslie diz para seu marido que não poderá mais manter seu casamento – que o fato de que ela furou o corpo de Hammond com seis tiros de pistola não mudou nada em termos de seu desejo -, exclamando histericamente: “With all my heart, I still love the man I killed”. A interpretação de Bette sobressai sobretudo quando sua personagem mente, ou antes, faz sentir ao espectador que ela mente; sua intensidade dramática consiste muito nos seus olhos grandes e expressivos. Wyler filmou com muito talento a impostura de sua heroína e usou a profundidade de campo e as sombras para criar a atmosfera apropriada ao melodrama.

Bette Davis e james Stephenson em A Carta

Bette Davis e james Stephenson em A Carta

Bette Davis e Herbert Marshall em A Carta

Bette Davis e Herbert Marshall em A Carta

A produção foi honrada com sete indicações para o Oscar: Melhor Filme, Atriz, Diretor, Fotografia (Tony Gaudio), Ator Coadjuvante (James Stephenson), Música – Partitura Original (Max Steiner) e Montagem (Warren Low). Ironicamente. Herbert Marshall, que faz o papel do marido traído de Leslie, havia encarnado o amante na versão fílmica de 1929.

Tanto Bette como sua colega Mary Astor acharam a história de Eu Soube Amar / The Great Lie ruim e propuzeram mudanças no script, que foram aceitas pelo diretor Edmund Goulding, obrigando a roteirista Lenore Coffee a reecrever no set, à medida em que as cenas estavam sendo filmadas.

Mary Astor e Bette Davis em Eu Soube Amar

Mary Astor e Bette Davis em Eu Soube Amar

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No enredo, o aviador milionário Pete Van Allen (George Brent) casa-se impulsivamente com a pianista Sandra (Mary Astor) mas, como ela não está legalmente divorciada, o casamento é declarado inválido. Pete percebe que não a ama e se casa com sua antiga namorada, Maggie (Bette Davis), sem se dar conta de que Sandra está grávida. Ele parte em um missão de mapeamento na selva amazônica, porém o avião sofre um acidente, e Pete é dado como morto. Maggie implora a Sandra que a deixe assumir a criação da criança e promete ajudar financeiramente sua carreira. Um dia, Pete retorna, e Maggie não lhe diz que o filho é de Sandra. Mas esta pede o bebé de volta, na esperança de que isso possa atrair seu amante novamente. Maggie acaba revelando a Pete que não é a mãe da criança e ele, ao saber da verdade, desiste do filho em favor de Sandra. Porém ela acaba por mandar o rebento de volta para Maggie e Pete.

Edmund Goulding dirige Bette e George Brent em Eu Soube Amar

Edmund Goulding dirige Bette e George Brent em Eu Soube Amar

No grand finale desse melodrama sobre o matriarcado, embalado pelo fundo musical de Max Steiner e Tchaikowsky, Maggie conta a verdade para Pete na presença de Sandra. Maggie explica que Sandra quer a criança porque é dela. “Bem”, diz Brent, ele é um belo homenzinho e vamos sentir falta dele”. Como Sandra na verdade não quer a criança, somente o homem que a procriou, ela caminha até o piano e começa a tocar um concerto frenético. Quando Maggie pergunta a Sandra o que ela vai fazer com o menino, ela responde friamente: “Estou deixando ele com sua mamãe”. Mary Astor conquistou a estatueta da Academia como Melhor Atriz Coadjuvante.

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James Cagney e Bette Davis em A Noiva Caiu do Céu

James Cagney e Bette Davis em A Noiva Caiu do Céu

Depois de se casar com o engenheiro aeronáutico Arthur Fansworth, Bette participou, sob a direção de William Keighley, de uma screwball comedy intitulada A Noiva Caiu do Céu / The Bride Comes C.O.D. / 1940 sobre um piloto endividado, Steve Collins (James Cagney) que é contratado pelo pai (Eugene Pallette) de uma jovem herdeira de poços de petróleo, Joan Winfield (Bette Davis), para trazê-la a sua presença – solteira – depois que ela anunciou que iria se casar com um chefe de orquestra (Jack Carson). Steve rapta Joan, mas seu avião cai em um deserto, onde ocorrem várias peripécias, e depois eles acabam se apaixonando um pelo outro. O argumento, embora pouco original, enseja boas situações cômicas e a presença de dois artistas eletrizantes como Bette Davis e James Cagney garante uma boa diversão.

Bette Davis em Pérfida

Bette Davis em Pérfida

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Bette reencontrou William Wyler em Pérfida / The Little Foxes / 1941, drama baseado na peça de Lillian Hellman, que havia sido encenada na Broadway com Tallulah Bankhead no papel principal. Passado em uma pequena cidade da Louisiana em 1900, o filme gira em torno dos Hubbards, uma familia voraz. Necessitando de 75 mil dólares para construir uma fábrica de tecidos de algodão, que certamente ensejará uma alta lucratividade, explorando a mão de obra barata, Ben (Charles Dingle) e Oscar (Carl Benton Reid) Hubbard planejam com sua irmã Regina (Bette Davis), fazer com que o marido dela, o banqueiro Horace Giddens (Herbert Marshal), se disponha a investir no empreendimento. Por motivos unicamente mercenários, Regina tenta interromper o idílio entre sua filha Alexandra (Teresa Wright) e um jovem editor idealista, David Hewitt (Richard Carlson). Horace fica sabendo das trapaças de sua mulher e recusa o pedido de dinheiro. Regina é tomada por uma raiva violenta e revela a Horace que nunca o amou. Vendo seu esposo sofrer um ataque cardíaco, ela se recusa deliberadamente a socorrê-lo, e assiste friamente a sua morte. Esta tragédia revela a Alexandra toda a cupidez de sua mãe. Quando Alexandra parte com David à noite, Regina os observa nas sombras da janela do seu quarto, completamente só.

William Wyler dirige Bette e Teressaa Wright em Pérfida

William Wyler dirige Bette e Teressaa Wright em Pérfida

Bette discordou veementemente com Wyler sobre como deveria compor a personagem de Regina Giddens. Ela queria interpretá-la como uma mulher sinistra, insensível, gananciosa, porém a visão que Wyler tinha de Regina era mais complexa Ele achava que Regina possuia várias nuanças: era tão graciosa e divertida quanto má, e muito sensual. “Eu queria que Bette a interpretasse de uma maneira mais suave”, ele disse, relutando em aceitar uma performance de uma nota só.

Dan Duryea, Charles Dingle, Carl Benton Reid e Bette Davis em Pérfida

Dan Duryea, Charles Dingle, Carl Benton Reid e Bette Davis em Pérfida

Wyler insistiu para que Bette fôsse ver a performance de Tallulah Bankhead na produção da Broadway, a fim de que ela tivesse uma idéia do que ele não queria. Mas aconteceu o oposto. Bette achava que a personagem fôra definida claramente por Lillian Hellman e saiu do teatro convencida de que a interpretação de Tallulah, compondo Regina como uma mulher cruel, é que estava de acordo a intenção da autora. Depois de outra briga com Bette a respeito de sua maquilagem e de Bette ter se afastado do set por dezesseis dias consecutivos, Wyler acabou cedendo, e ela continuou a interpretar Regina como uma fêmea monstruosa.

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A colaboração de Wyler com Gregg Toland surtiu resultados marcantes como, por exemplo, quando Oscar descobre que seu filho Leo (Dan Duryea) havia roubado os títulos negociáveis do cofre bancário de Horace. A cena, muito elogiada pelo grande cineaste russo Serguei Eisenstein, se passa no banheiro, onde os dois estão se barbeando, mas falando diretamente um com o outro através de seus respectivos espelhos.

Herbert Marshall e Bette Davis em Pérfida

Herbert Marshall e Bette Davis em Pérfida

Outro instante citado frequentemente por seu brilho inventivo é o que demonstra a crueldade de Regina. Ela começa com Regina dizendo a Horace que nunca o amou e se casou com ele somente por interesse material, precipitando um ataque cardíaco no marído. Ele tenta tomar seu remédio, mas a garrafa cai, e se quebra. Quando pede socorro a Regina, ela senta em um sofá diante da objetiva e não move um dedo para ajudá-lo. Horace sai de sua cadeira de rodas e tenta subir a escada para apanhar mais medicação em seu quarto, porém a câmera não o acompanha, permanecendo fixa no rosto impassivo de Regina enquanto ela ouve o colapso de Horace no fundo do quadro.

Pérfida arrebatou oito indicações para o Oscar da Academia: Melhor Filme, Diretor, Atriz, Atriz Coadjuvante (Patricia Colinge, que faz o papel de Birdie Hubbard, a esposa de Ben, e Teresa Wright), Roteiro Adaptado (Lillian Hellman), Direção de Arte (Stephen Gooson – decoração de interiores Howard Bristol), Música para filme dramático (Meredith Wilson), e Montagem (Daniel Mandell).

Monty Woolley, Bette Davis e Ann Sheridan em Satã Janta Conosco

Monty Woolley, Bette Davis e Ann Sheridan em Satã Janta Conosco

Depois desse drama, Bette envolveu-se com uma comédia deliciosa, Satã Janta Conosco / The Man Who Came to Dinnner / 1942 (Dir: William Keighley), baseada na peça de George S. Kaufman e Moss Hart, cujo assunto é o seguinte: Sheridan Whiteside (Monty Woolley), famoso comentarista do radio chega a Messala, Ohio para dar uma palestra. Contra sua vontade ele deve jantar na residência de Ernest (Grant Mitchell) e Daisy Stanley (Billie Burke), mas ao subir os degraus da entrada cobertos de gêlo, ele cai, e fratura o quadril. Quando Sheridan finalmente emerge de sua cama em uma cadeira de rodas, é para anunciar que planeja processar os Stanleys por dano no valor de 150 mil dólares. Ele então requisita os cômodos do andar térreo, o telefone e os empregados da casa para si mesmo e sua secretária Maggie Cuttler (Bette Davis), e deixa seus anfitriões doidos, intrometendo-se na vida particular da família e recebendo a visita de convidados bizarros, inclusive presos em liberdade condicional que fazem parte do seu fã clube da penitenciária.

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Bette defendeu com veemência a contratação de John Barrymore para o papel de Sheridan Whiteside. Ele se submeteu a um teste porém, como Hal Wallis comentou depois, “Eu não podia arriscar. O diálogo era muito complicado, e Barrymore estava bebendo tanto, que ele tinha que ler suas falas escritas em cartões colocados atrás da câmeras. Cogitado para ser Sheridan e também assumir a direção, Orson Welles recebeu uma proposta financeira tentadora, mas o filme acabou sendo entregue a William Keighley e a tarefa de interpretar o irascível “hóspede” ficou para Monty Woolley.

Bette Davis e George Brent em Nascida para o Mal

Bette Davis e George Brent em Nascida para o Mal

Escolhido para dirigir Nascida para o Mal / In This Our Life / 1942, John Huston sentiu-se prestigiado pelo fato de, apesar de ter feito apenas um filme (Relíquia Macabra / The Maltese Falcon / 1941), ser encarregado de uma produção de prestígio, liderada por estrelas como Bette Davis e Olivia de Havilland. Na sua autobiografia, ele disse: “nunca liguei para Nascida para o Mal, embora o filme contivesse algumas coisas boas. Pela primeira vez, creio eu, um personagem negro não foi apresentado como um criado dócil ou simples alivio cômico. Bette Davis me fascinou. Existe nela uma força elementar, ela traz dentro de si um demônio, que ameaça sair para for a e comer todo mundo. O estúdio tinha medo do demônio dela. Confundiam-no com superrepresentação . Esquecendo as objeções contra ela, deixei o demônio sair, e alguns críticos acharam que a interpretação de Bette foi uma das melhores de sua carreira”.

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Ela está realmente notável como Stanley Timberlake, a jovem egocêntrica, pertencente a uma família aristocrática da Virginia, acostumada a ter tudo o que quer por culpa da mãe, Lavinia (Billie Burke), em constante desavença como o marido, Asa (Frank Craven). Às vésperas de seu casamento com o advogado Craig Fleming (George Brent), Stanley foge com o cunhado, Peter (Dennis Morgan). A irmã, Roy (Olivia de Havilland), divorcia-se de Peter e volta suas atenções para Craig. A união de Stanley com Peter acaba em tragédia, pois ele comete suicídio. Stanley tenta reconquistar Craig, e é repudiada. Furiosa, sai pela estrada em alta velocidade atropelando uma mãe e seu filho, matando a criança. Para escapar da justiça, culpa Parry (Ernest Anderson), filho da cozinheira Minerva (Hattie McDaniell), declarando ter-lhe emprestado o carro na noite do acidente. O rapaz é preso. Craig o defende e pressiona Stanley. Ela procura auxílio com seu tio William (Charles Coburn), irmão de Lavínia, um solteirão que nutre afeição pouco natural pela sobrinha. Ele lhe faz uma proposta indecorosa e, depois de insultá-lo, Stanley sai em disparada. Perseguida pela polícia, sofre um desastre, morrendo na hora.

John Huston dirige Charles Coburn e Bette Davis em Nascida para o Mal

John Huston dirige Charles Coburn e Bette Davis em Nascida para o Mal

Com a ajuda do roteiro bem construído de Howard Koch e da cinematografia tristonha e sombria de Ernest Haller, Huston enfrentou com perspicácia este enredo cheio de armadilhas melodramáticas que, todavia, teve a coragem de incluir em seu bojo a sugestão dos desejos incestuosos do tio e as aspirações de escala social do jovem de cor acusado do atropelamento (Parry estudava Direito e trabalhava ao mesmo tempo como chofer da família e como estagiário de Craig), fatos raros no cinema americano da época.

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Claude Rains e Bette Davis em Estranha Passageira

Claude Rains e Bette Davis em Estranha Passageira

Paul Henreid e Bette Davis em Estranha Passageira

Paul Henreid e Bette Davis em Estranha Passageira

Estranha Passageira / Now Voyager / 1942 estudo psicológico em chave de women’s picture, dirigido com firmeza por Irving Rapper, deu a Bette outro grande papel de sua carreira – o de Charlotte Vale, uma solteirona pouco atraente, reprimida por uma mãe tirânica (Gladys Cooper) em uma imensa mansão bostoniana, que, auxiliada por um psiquiatra, Dr. Jacquith (Claude Rains), liberta-se de suas inibições e se transforma em uma mulher elegante e sedutora. Em uma viagem à América do Sul, ela conhece um arquiteto casado, Jeffrey Durrance (Paul Henreid). Os dois se apaixonam profundamente, mas ele, embora vítima de um matrimônio infeliz, não abandona sua mulher e suas duas filhas. De volta a Boston, a família de Charlotte fica espantada com sua transformação. Sua mãe, entretanto, tenta retomar o contrôle sobre a filha e, durante uma discussão com Charlotte, sofre um ataque cardíaco, e morre. Sentindo-se culpada e perturbada, Charlotte retorna à clínica do Dr. Jacquith, onde conhece Tina (Janis Wilson), uma das filhas de Jeffrey, que fisica e moralmente lhe faz lembrar de sua infância. Quando Tina melhora, Charlotte leva-a para sua casa com o consentimento do Dr. Jacquith. Mais tarde, Jeffrey e o Dr. Jacquith visitam Charlotte e Jeffrey fica encantado com a mudança de Tina. Charlotte diz a Jeffrey que vai cuidar de Tina e que ela foi uma dádiva que ele deu para ela, e a sua maneira de estar próxima dele. Quando Jeffrey lhe pergunta se está feliz, ela responde: “Bem, Jerry, não vamos pedir a lua, nós temos as estrelas”, enquanto a câmera faz uma panorâmica para o céu e a música de Max Steiner, premiada com o Oscar, aumenta de volume.

Irving Rapper orienta Bette e Paul Henreid na filmagem de Estranha Passageira

Irving Rapper orienta Bette e Paul Henreid na filmagem de Estranha Passageira

Bette Davis e Paul Henreid

Bette Davis e Paul Henreid

Esta frase final ficou célebre assim como o gesto de Jeffrey acendendo dois cigarros e dando um para Charlotte. A cena prevista no roteiro de Casey Robinson era esta: Jeffrey oferecia um cigarro para Charlotte, pegava um para ele, acendia o dele, depois tirava o cigarro da boca de Charlotte, dava para ela o dele, e punha o dela nos seus lábios. Henreid praticou esta cena com sua esposa Lisl, mas nenhum dos dois conseguiu fazê-la da maneira correta. Henreid então colocou dois cigarros na sua boca, acendeu ambos, e ofereceu um para sua esposa. Bette gostou da idéia e levou-a para Rapper, que a odiou. Bette – sempre propensa a dominar seu diretor – insistiu para que Hal Wallis viesse ao palco de filmagem e visse a cena. Wallis apareceu, viu a cena, e aprovou. De fato, Wallis gostou tanto da cena, que mandou Casey Robinson acrescentar mais duas ocasiões para o casal fazê- la no filme (cf. Ed Sikov).

Bette na Hollywood Canteen

Bette na Hollywood Canteen

Durante o Segundo Conflito Mundial, Bette ajudou a vender os bonus de guerra e, juntamente com John Garfield, inaugurou a Hollywood Canteen, uma buate situada no número 1415 do Cahuenga Boulevar, onde os soldados podiam frequentar gratuitamente e dançar com um punhado de estrêlas glamourosas, que também serviam as mesas e lavavam os pratos.

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aa9 hollywood canteenDurante os anos de guerra, Bette participou ainda de dois espetáculos recheados de astros interpretando eles mesmos, Graças a Minha Boa Estrela / Thank Your Lucky Stars / 1943 (cantando  “They’re Either Too Young or Too Old”) e Um Sonho de Hollywood / Hollywood Canteen / 1944; de um drama político de propaganda anti-nazista, Horas de Tormenta / Watch on the Rhine / 1943 e de dois melodramas femininos, Uma Velha Amizade / An Old Acquaintance / 1943 e Vaidosa / Mr. Skeffington / 1944.

Paul Lukas, Bette Davis e George Colouris em Horas de Tormenta

Paul Lukas, Bette Davis e George Colouris em Horas de Tormenta

Em Horas de Tormenta, filme baseado em uma peça de Lillian Hellman e com roteiro de Dashiell Hammett, Karl Muller (Paul Lukas) é o engenheiro alemão, patriarca da família Muller e Sara (Bette Davis) a sua esposa americana. Em 1940, os Mullers emigraram da Alemanha para os Estados Unidos com seus três filhos e se instalaram na casa da mãe de Sara (Lucille Watson) em Washington. Muller havia sido um líder anti-fascista no seu país, lutado com a Brigada Internacional na Espanha, e prisioneiro da Gestapo por seis mêses. Um conde romeno oportunista (George Colouris) descobre a identidade de Muller e planeja revelá-la aos agentes nazistas; mas Muller o mata e parte para a Alemanha em uma tentativa de resgatar seus companheiros de luta contra Hitler das garras dos nazistas.

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A maior parte da ação transcorre entre quatro paredes, porém a direção correta de Herman Shumlin e os diálogos e personagens bem concebidos por Lillian Hellman mantêm uma tensão constante. Segundo Bette revelou ao ser entrevistada anos depois por Dick Cavett, ela aceitou um papel secundário, porque achava que a história era muito importante e que a prosa de Miss Hellman era “superbrilhante”. Bette deixou Paul Lukas no primeiro plano e ele brindou o público com uma atuação marcante, que lhe deu o Oscar de Melhor Ator, tendo sido ainda indicado o filme, Dashiell Hammett na categoria de Melhor Roteirista, e Lucille Watson como Melhor Atriz Coadjuvante.

Bette e Arthur Farnsworth

Bette e Arthur Farnsworth

Em 25 de agosto de 1943, o marido de Bette, Arthur Farnsworth, faleceu aos 37 anos de idade de hemorragia cerebral, dois dias depois de ter caído na rua. Segundo Bette revelou para o diretor Vincent Sherman (com quem viveu um breve romance) ela teve uma discussão com seu marido a bordo de um trem que começava a sair da estação. Enfurecida, Bette o empurrou para a plataforma, gritando para que fosse embora, e ele, ao saltar do trem, caiu. Ela olhou para ver se Arthur estava bem e o viu com as mãos na cabeça. Quando Bette chegou ao seu destino, telefonou para casa e lhe disseram que ele não estava seriamente ferido. Bette ficou muito tempo atormentada, achando que foi essa queda que causara a morte de seu marido. (cf. Studio Affairs – My Life as a Film Director, University Press of Kentucky,1996).Vincent Sherman foi o diretor de Uma Velha Amizade e Vaidosa.

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Bette Davis e Miriam Hopkins em Uma Velha Amizade

Bette Davis e Miriam Hopkins em Uma Velha Amizade

No primeiro filme, Kit Marlowe, (Bette Davis), jovem romancista “séria” respeitada pelos críticos, mas pouco lida, retorna de Nova York para uma cidade pequena e aceita viver com sua amiga de infância, Millie (Miriam Hopkins), casada com o industrial Preston Drake (John Loder). Millie escreve romances de amor populares, que vendem bem. Apesar de suas rivalidades e temperamentos diferentes a amizade entre as duas continua através dos tempos. Preston se apaixona por Kit, mas ela o repele, para não destruir o lar de sua melhor amiga. Desesperado, Preston parte deixando a Kit a tarefa de educar sua filha Deirdre (Dolores Moran). Dez anos se passam. Com a declaração da Segunda Guerra Mundial, Preston, mobilizado, vem rever sua filha, sua ex-mulher e Kit. Ele lhes comunica seu noivado e parte para sempre. Um jovem, Rudd Kendall (Gig Young), ama Kit, e a pede em casamento, mas ela recusa. Mais tarde, Rudd se casará com Deirdre e Millie e Kit retomarão sua vida em comum.

Miriam Hopkins e Bette Davis em Uma Velha Amizade

Miriam Hopkins e Bette Davis em Uma Velha Amizade

Apesar do maniqueísmo do roteiro que opõe o Bem (Kit) ao Mal (Millie) ou, em outras palavras, a abnegação e o egoismo sem quaisquer nuanças, Uma Velha Amizade sustenta-se pela direção hábil e pelo confronto entre duas grandes atrizes. O contraste entre Kit e Millie reproduz-se em Vaidosa, no qual Fanny demonstra o mesmo egocentrismo de Millie enquanto Job evoca o personagem de Kit com sua seriedade, bondade e devoção. Aqui também duas interpretações são igualmente soberbas: o papel de Skeffington é um dos melhores da carreira de Claude Rains enquanto Bette Davis usa seu talento para interpretar com perfeição uma mulher que vive pela adulação dos homens e se recusa a envelhecer. Bette e Rains foram indicados para o Oscar.

Bette Davis em Vaidosa

Bette Davis em Vaidosa

No segundo filme, em 1914 na cidade de Nova York, Fanny Trellis (Bette Davis), ciente de seus encantos, pode escolher o homem que quiser para se casar. Ela escolhe o banqueiro judeu Job Skeffington (Claude Rains), a fim de salvar seu irmão Trippy (Richard Waring) da acusação de ter dado um desfalque na firma de Job, onde trabalhava. Os pretendentes de Fanny não se conformam com o seu casamento e continuam a perseguí-la. Pouco depois do nascimento da filha do casal, Fanny Junior (Marjorie Riordan), os Estados Unidos entram na Primeira Guerra Mundial e Trippy, que se alistara na Lafayette Esquadrille, vem a ser morto. Fanny culpa Job pela sua morte e ele percebe que Fanny nunca o amará.

Bette Davis e Claude Rains em Vaidosa

Bette Davis e Claude Rains em Vaidosa

Após o final da guerra, Job concorda com o divórcio e parte para a Europa com a filha. Anos depois, Fanny se envolve com Johnny Mitchell (Johnny Mitchell) um rapaz bem mais jovem do que ela. Depois de uma doença brusca que a envelhece subitamente, ela persiste em querer agradar aos seus antigos admiradores, mas sua côrte se dispersa. Sua filha, Fanny Junior, que retornara de Berlim, anuncia seu casamento com Johnny e Fanny fica totalmente só. Um dia, George (Walter Abel), primo de Fanny, anuncia para a prima que Job voltou após ter sido preso em um campo de concentração e espera que ela tome conta dele. Fanny hesita, porque teme que, por não ser mais bela, Job vai repudiá-la como fizeram os outros. Porém quando constata que seu ex-marido, torturado pelos nazistas, perdeu a visão, ela percebe que ele será o único homem, que se lembrará sempre dela como uma mulher bela e o recebe de volta em sua casa.

Bette Davis e John Dall em O Coração Não Envelhece

Bette Davis e John Dall em O Coração Não Envelhece

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Johnn Hoyt, Bette Davis, o diretor Bretaighne Windust, Jim Davis e Janis Paige na filmagem de Encontro no Inverno

Johnn Hoyt, Bette Davis, o diretor Bretaighne Windust, Jim Davis e Janis Paige na filmagem de Encontro no Inverno

Bette Davis e Rbert Montgomery em A Noiva da Primavera

Bette Davis e Rbert Montgomery em A Noiva da Primavera

Joseph Cottene Bette Davis em A Filha de Satanás

Joseph Cottene Bette Davis em A Filha de Satanás

Entre 1945 e 1949 Bette fez seis filmes O Coração Não Envelhece / The Corn is Green / 1945; Uma Vida Roubada / A Stolen Life / 1946; Que o Céu a Condene / Deception / 1946; Encontro no Inverno / Winter Meeting / 1948; Noiva da Primavera / June Bride / 1948 e A Filha de Satanás / Beyond the Forest / 1949, nos quais foi sucessivamente: Lilly Moffat, professora de meia idade que ajuda um jovem mineiro (John Dall) de um vilarejo do País de Gales a ingressar na Universidade de Oxford; as irmãs gêmeas Kate e Patricia Bosworth, uma assumindo a identidade da outra para conquistarem o homem (Glenn Ford), que ambas amavam; Christine Radcliffe, professora de música ameaçada por um compositor famoso (Claude Rains), seu ex-amante, quando anuncia seu casamento com um jovem violoncelista (Paul Henreid); Susan Grieve, poetisa amargurada pelo mal relacionamento que tem com sua mãe relaciona-se com um herói de guerra indeciso quanto à sua vocação religiosa (Jim Davis); Linda Gilman, redatora-chefe de uma revista que vive brigando com seu colega de redação (Robert Montgomery) no decorrer de uma reportagem sobre o casamento em uma pequena cidade do Indiana e acabam se apaixonando; Rose Moline, esposa negligenciada de um médico do interior (Joseph Cotten), que trai seu marido com um vizinho (David Brian), e depois é repudiada por ele, ocorrendo em consequência vários incidentes trágicos.

Bette, Paul Henreid e Claude Rains em Que o Céu a Condene

Bette Davis, Paul Henreid e Claude Rains em Que o Céu a Condene

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Esses filmes, dirigidos respectivamente por Irving Rapper, Curtis Bernhardt, Irving Rapper, Bretaigne Windust, Bretaigne Windust e King Vidor, não estão entre os melhores da carreira de Bette, merecendo destaque Que o Céu a Condene, por reunir novamente Bette com Paul Henreid e Claude Rains, seus parceiros de Estranha Passageira; por causa de suas ambições estéticas, sobressaindo a fotografia expressionista e a angulação inventiva de Ernest Haller, os cenários luxuosos e/ou modernistas de Anton Grot, o concêrto para violoncelo composto por Ernest Wolfgang Korngold; e pela cena antológica do jantar, no qual Claude Rains tenta abalar os nervos de Paul Henreid, para que ele falhe no seu teste como violoncelista.

Em 30 de novembro de 1945, Bette casou-se, aos 37 anos de idade, com William Grant Sherry, artista plástico e ex-boxeador profissional sete anos mais moço do que ela. Em 1949, A FIlha de Satanás marcou a última aparição de Bette Davis como contratada da Warner Bros., após dezoito anos de permanência neste estúdio.

2 Responses to “BETTE DAVIS II”

  1. Professor, adorei a matéria sobre Bette Davis, uma estirpe de atriz admirável e que não se faz mais. Entre seus filmes um dos meus favoritos é “Vitoria Amarga”.

  2. Obrigado Adilson. Seu blog vai muito bem. Gostei da matéria sobre Rebecca de Hitchcock.

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