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OS FALSOS CARLITOS DO CINEMA

Houve vários imitadores de Carlitos e algumas vezes é difícil distinguir quais deles foram imitações inocentes ou “homenagens”, ou contrafacções de má fé do personagem universalmente célebre criado por Charles Chaplin.

O caso mais famoso levado aos tribunais foi contra o ator mexicano Carlos Amador (1892-1974). Embora Amador tivesse pouca semelhança física com o Charles Chaplin original, ele assumiu o pseudônimo de Charlie Alpin e em 1920 estrelou um filme intitulado The Race Track, produzido pela Western Feature Productions, no qual vestia-se como o Vagabundo (com roupa e maquilagem idênticos), copiava os maneirismos de Chaplin, e recriava seus lances cômicos rotineiros. Em 11 de julho de 1925 a Suprema Côrte do Estado da Califórnia decidiu a favor de Chaplin e ordenou que os negativos de The Race Track fossem destruídos. Por intermédio de seus advogados, Amador recorreu da decisão, mas não logrou êxito.

Charles Amador

Amador apareceu em três filmes da Vitagraph estrelados por Larry Semon (Scamps and Scandals; Well, I’ll Be; His Home Sweet Home e ao lado de James Parrott, Jobyna Ralston e Billy West em Bone Dry, todos de 1919, nenhum deles exibido no Brasil. No México foi o protagonista de: El Inocente / 1930; Terrible Pesadilla / 1931; El Dia DelTrabajo / 1935, também inéditos em nossas telas.

Bobby Dunn

Surgiram outras cópias ou “tributos” relacionados  com os atores Bobbie Dunn, Ray Hughes, e outros na Europa, como “Monsieur Jack” (André Sechan) e “Charlie Kaplin” (Ernst Bosser), e há também quem acuse o consagrado Harold Lloyd de ter se inspirado no trabalho de Chaplin para criar o seu personagem, Lonesome Luke; porém os imitadores mais famosos de Carlitos foram Billy West e Billie Ritchie.

 

Harold Lloyd como Lonesome Luke

O imigrante russo Roy B. Weissberg – que passou a usar o nome de William B. West quando estreou no palco aos quatorze anos de idade em 1909 – , usando idêntico traje e maquilagem do tipo chapliniano, copiava tão bem os seus gestos e movimentos, que chegou a fazer com que muitos espectadores o confundissem com o verdadeiro Carlitos, por exemplo, no filme The Rogue, no qual aparecia com Oliver Hardy.

West copiava Chaplin desavergonhadamente, mas com muita habilidade e conquistou o público pela força de seu próprio nome. Em 1917 e 1918 participou de muitos filmes produzidos pela King Bee ao lado de Oliver Hardy, revezando-se na direção Charles Parrott (Charles Chase) e Arvid G. Gillstrom, comparecendo também a atriz Leatrice Joy em alguns deles. Em 1922, abandonou a imitação de Chaplin em favor de um personagem mais elegante, de chapéu de palha e um bigodinho pintado a lapis que aparecia nas comédias feitas na Joan Film Sales Company e depois na Arrow Film Corporation. A partir de 1925, tornou-se produtor de alguns filmes com Oliver Hardy e Bobby Ray e das comédias com a personagem das histórias em quadrinhos “Winnie Winkle” (de Martin Branner), protagonizadas por sua esposa, Ethelyn Gibson.

Billy West em um de seus filmes, tendo a seu lado, à esquerda, Oliver Hardy (de bigode)

Billy West e seu novo personagem

Como ator, assumiu ainda pequenos papéis nos anos 30 primeiro para pequenas companhias independentes e depois para a Columbia (v. g. como um vagabundo em O Venturoso Vagabundo / Hallelujah I’m a Bum / 1933; como um repórter em Aconteceu Naquela Noite It Happened One Night/ 1934; como um ascensorista em O Homem Que Nunca Pecou / The Whole Town’s Talking / 1935). Na Columbia, atuou ainda como assistente de direção e, eventualmente, como gerente do Columbia Grill Restaurant. Morreu em 21 de julho de 1975 de um ataque cardíaco, quando estava saindo da pista de corridas do Hollywood Park. Chaplin nunca moveu ação judicial contra West e consta que certa vez ele viu a companhia de West filmando em uma rua de Hollywood e disse para West: “Você é um ótimo imitador”.

Billy West em O Bode Expiatório

No Brasil, Billy West era muito apreciado, sendo anunciado como “o único rival do aplaudido Carlito”. Embora os anúncios nos jornais da época só mencionassem os títulos em português, conseguí identificar os títulos originais (com exceção de um) dos filmes de West exibidos no Brasil, quais sejam: O Herói / The Hero; O Rival de Cupido ou Torpedeado por Cupido / Cupid’s RivalO Vilão / The Villain; Padeiros e Padarias / Dough NutsCamarins e Camarotes / Back Stage; O Bode Expiatório / The Goat; O Cozinheiro Principal ou O Mestre Cozinheiro / The Chief Cook; Aventuras Prodigiosas de Billy; Polícia Janota / The Fly Cop;  O Vadio The Hobo;  O Maçador / The Pest;  O Pequeno Lambão ou Rapazinho Lambão / The Candy Kid.

Billie Richtie, cujo verdadeiro nome era William Monro, nasceu em Glasgow na Escócia em 1878 e ingressou na Karno Fun Factory and Comedy Troupe, excursionando pelo mundo com Charles Chaplin e Stan Laurel, entre outros. Em 1916, ele deixou a Karno e começou a fazer filmes silenciosos para a companhia L-Ko, fundada por Henry “Pathé” Lehrman (distribuídos pela Universal), transferindo-se depois para o Sunshine Studios da Fox. As iniciais L-KO significavam Lehrman Knock-Out.

Billie Ritchie

Ritchie sempre alegou que Chaplin copiou a maquilagem de seu personagem de bêbado, que criara no palco na Inglaterra e depois reapareceu em solo americano no espetáculo “A Night in the English Music Hall”, embora ele próprio tenha sido apontado como um dos plagiadores de Carlitos. Seu personagem fílmico, chamado  Bill Smith, tinha semelhanças com Carlitos (mesma maquilagem, roupas, bigode e chapéu côco, giros com a bengala, atitudes, maneira de caminhar), porém apresentava uma peculiaridade substancial que o diferenciava do herói chapliniano: era um bêbado rude e agressivo e não um vagabundo mas um homem de uma pretenciosa e indefinida classe social.

Em 1919, avestruzes usados na filmagem de uma comédia atacaram o ator. Este acidente foi um dos muitos exemplos da prática comum de Lehrman de colocar atores em situações perigosas como, por exemplo, deixar vários leões sôltos entre os extras. Em outro filme, Billie foi catapultado para o ar por meio de mangueiras de água de alta pressão. O ataque machucou Billie seriamente e, nos dois anos seguintes, ele ficou confinado ao leito, vindo a falecer vítima de um cancer no estômago em 6 de julho de 1921, aos 42 anos de idade, deixando sua esposa Winifred e uma filha de vinte anos, Wyn. Winifred, parceira de Billie no teatro, foi empregada por Chaplin como responsável pelo guarda-roupa, mostrando que não havia animosidade entre os dois comediantes. Existem três versões quanto à questão de direitos autorais: 1. Chaplin nunca entrou com ação contra Ritchie; 2. Ele moveu ação judicial, mas por alguma razão a tentativa falhou; 3. Eles na verdade processaram-se mutuamente, porém ambas as ações foram julgadas improcedentes.

Billie Ritchie

Billie Richtie fez inúmeros filmes como ator, mas só encontrei nos jornais brasileiros da época (sem poder identificar alguns títulos originais) anúncios de: Endiabrados; A Vingança; Os Policiais Precisam CasarCasamento Fatal / The Fatal Marriage; Leões Esfomeados no Expresso da Meia-Noite / Roaring Lions in the Midnight ExpressLeões a Domicílio; Escapada e Lizzie ou  A Fuga de Lizzie/ Lizzie’s Escape; Amor e Cirurgia / Love and Cirurgy; Pondo Tudo em Papas ou Tudo em PapasA Sogra de Billie; Cupido no Hospital / Cupid in a Hospital, Pecado Dominical. Apareceram ainda outros títulos  em português de comédias que podem ser de Ritchie (v. g. Quando Lizzie Vai Ao Mar), mas sem confirmação. Os periódicos nacionais costumavam chamar Billie de “professor de Carlito e Fatty”. Fatty era Fatty Arbuckle, o queridíssimo Chico Bóia.

Houve ainda um tal de Cardo Charlot, apresentado nos anúncios dos jornais brasileiros no final dos anos dez como “Carlito em carne e osso, autêntico cômico da Studio-Film”. O ilegítimo Carlitos estreou no Teatro República com o seu parceiro Dick. Depois de curta temporada, foi mostrar seus dotes de mímica no Teatro Phoenix e, em seguida, no Grande Circo Pavilhão 7 de Setembro. Nessa oportunidade, destacava-se no programa determinada cena cômica, assim esclarecida: “esta pantomima foi registrada como fita cinematográfica, em 4 partes, na 1ª Companhia da Estudio-Films, no ano de 1914, e figura sob o título Carlito, Hussard da Morte” (cf. Correio da Manhã / RJ de  26 de maio de 1918). O emérito cronista e estudioso da nossa música e cultura popular, Jota Efegê, manifestou-se a respeito do dito anúncio: “Artimanha,  publicidade apócrifa, ou real, procurava-se com ela convencer o público  da legitimidade do famoso cômico, nos palcos e picadeiros cariocas” (Meninos, eu vi, Funarte, 2007).

José Vassalo Jr. / Carlitinhos

 

Finalmente, Jurandyr Noronha, pesquisador do cinema e cineasta, anotou no seu precioso Dicionário de Cinema Brasileiro 1896-1036, EMC Edições, 2008 o título de dois filmes carlitianos: Carlitinhos / 1921 e Carlitomania / 1931. O primeiro,  dirigido por José Medina, era uma comédia de 20 minutos, produzida pela Rossi Film, na qual a imitação de Charles Chaplin foi feita por um menino, José Vassalo Jr. Sobre o segundo, J. Noronha diz apenas que era um misto de ficção e documentário dirigido por Waldemar P. Zornig, sobre antigos profissionais que falam sobre os imitadores de Carlitos. Na revista Cinearte, recolhí mais estas informações: Carlitomania foi produzido pela S. A. Cinematográfica Paulista e seu ator principal era o mesmo José Vassalo, a esta altura, já adulto.

 

FRANK LLOYD

Diretor tecnicamente habilidoso, esquecido por alguns dicionários de cinema, ele realizou um punhado de clássicos de Hollywood nos anos 30, notabilizando-se especialmente no melodrama de época e aventura marítima, romântica ou histórica. Com seu estilo simples e despretencioso arrebatou o Oscar de Melhor Diretor por A Divina Dama / The Divine Lady em 1929 e Cavalcade / Cavalcade em 1933. O próprio Cavalcade e outro filme que dirigiu, O Grande Motim / Mutiny on the Bounty / 1935, também conquistaram o troféu da Academia e, além disso, outros dois filmes, Regeneração / Weary River e O Parasita / Drag, concorreram ao prêmio por Melhor Direção em 1929. Releva notar que Lloyd funcionou muitas vêzes também como roteirista e produtor.

Frank Lloyd

Sua carreira cinematográfica se estende dos tempos pioneiros do cinema silencioso, quando estreou como ator em 1913, através da “idade de ouro” de Hollywood nos anos 20, 30 e 40, até sua despedida como diretor em duas modestas produções na Republic em 1954 e 1955. Lloyd sempre se sentiu confortável sob o sistema de estúdio e nunca desejou ser um “autor”, mas sim proporcionar ao público um bom divertimento.

Frank William George Lloyd (1886-1960) nasceu em Glasgow, Escócia, filho de um engenheiro naval. Após atuar como ator em Londres, incluindo quinze semanas no Shepherd’s Bush Theatre, emigrou para o Canadá em 1909, e ali trabalhou em uma fazenda até que um encontro casual em Winipeg com a Walker Theatrical Enterprises, pequena companhia itinerante, encorajou-o a voltar para o teatro. Quando se apresentou em Edmonton, Alberta, conheceu sua futura esposa Alma Heller, que interpretava papéis de criada na Lewis and Lake Company.

Como ator, Lloyd também subiu ao palco no Century Theatre de Los Angeles em 1913 e, seguindo o conselho de um colega, pediu e obteve emprego na Universal, comparecendo em mais de cinquenta filmes, a maioria de um e dois rolos, quase sempre como vilão. Destes, o mais importante foi o drama histórico de seis rolos, Damon e Pythias / Damon and Pythias / 1914, estrelado por William Worthington e Herbert Rawlinson nos papéis título sob a direção de Otis Turner. Lloyd tinha o papel proeminente de Dyonisius, “o tirano de Siracusa” e a revista The Moving Picture World descreveu sua performance como “conscienciosa”.

Cena de Damon and Pythias

Lloyd atuou sob as ordens de outros diretores, inclusive a mais famosa das diretoras do cinema mudo, Lois Weber, porém foi com Otis Turner, então descrito como  “O Decano dos Diretores da Universal“, que ele aprendeu o ofício de realizador de filmes. Quando Turner fez uma viagem de férias a Nova York, a Frank Lloyd foi oferecida a oportunidade de assumir a direção, realizando ao todo 40 filmes de um e dois rolos.

No verão de 1915, Lloyd deixou a Universal para ingressar na recém-formada Pallas Pictures Inc., cujos filmes eram distribuídos pela Paramount e que, ao contrário da Universal, estava empenhada em produzir somente longas-metragens. A Pallas estava associada e dividia o estúdio com a Oliver Morosco Photoplay Co. e, dentro de poucas semanas, Lloyd estava dirigindo filmes para ambas as companhias.

O primeiro filme de Lloyd na Pallas foi The Gentleman from Indiana/ 1915, superprodução estrelada por Dustin Farnum, que ele dirigiria novamente em David Garrick / David Garrick/ 1916, baseado em uma peça sobre o famoso ator inglês do século XVIII e em Depois da Batalha/ The Call of the Cumberlands/ 1916, baseado em uma peça de ambiente rural. Além desses dois, Lloyd dirigiu mais nove filmes para a Pallas / Oliver Morosco / Paramount: Jane / 1915, The Reform Candidate / 1915, The Tongues of Men / 1916,  Madame La PresidenteMadame la Presidente / 1916, The Code of Marcia Gray / 1916, The Making of Maddalena / 1916, Casamento Internacional /  An International Marriage / 1916, The Stronger Love / 1916 e A IntrigaThe Intrigue.

William Farnum em A Tale of Two Cities

Entre 1916 e o final de sua carreira na Pallas e 1922, início de seu contrato com a Associated First National, Lloyd prestou serviço à Fox e à Goldwyn. Ele dirigiu um total de 28 longas – metragens, sendo 15 filmes na Fox ( Pecado de MãeSins of Her Parent/ 1916, O Poder do AmorThe Kingdom  of Love / 1917, O Preço do Silêncio / The Price of Silence/ 1917*, Thermidor/ A Tale of Two Cities / 1917*, Métodos Americanos / American Methods / 1917*, Febre de Vingança/ When a Man Sees Red / 1917*, Coração de Leão/ The Heart of a Lion/ 1917*, Os Miseráveis / Les Miserables / 1918*, O Cancro da Sociedade/ The Blindness of Divorce / 1918, Sangue Nobre / True Blue / 1918*, O Vingador Peregrino / Riders of the Purple Sage / 1918*, A Volta do Vingador / The Rainbow Trail / 1918*, Sacrifício de Irmão / For Freedom / 1918*, Justa Vingança / The Man Hunter / 1919*, A Sombra do Presídio / Pitfalls of a Big City / 1919) e 13 filmes na Goldwyn (O  Mundo e Suas Mulheres / The World and the Woman / 1919,  Os Amores de Letty / The Loves o fLetty / 1919, Sublime Dignidade / The Woman in Room 13 / 1920, A Horda de PrataThe Silver Horde / 1920, A Ré Misteriosa / Madame X / 1920, Sedutor Pela Voz / The Great Lover / 1920, O Lírio do Reino Florido / A Tale of Two Worlds / 1921, Uma Voz na Escuridão / A Voice in the Dark / 1921, Caminhos do Destino / Roads to Destiny / 1921, Vítima da SociedadeThe Invisible Power / 1921, Tentações Fatais / The Grim Comedian / 1921, A Vitória do Amor/ The Man From Lost River / 1921); O Dilúvio / The Sin Flood / 1922.

Norma Talmadge em A Duquesa de Langeais

Cena de O Dilúvio

Nessse período merece destaque os 11 filmes estrelados por William Farnum (marcados com asterisco), as adaptações de A Tale of Two Cities de Charles Dickens (Thermidor) e Les Miserables (Os Miseráveis) de Victor Hugo bem com os dois westerns de Zane Grey (O Vingador Peregrino e A Volta do Vingador), que seriam refilmados pela Fox em 1925 com Tom Mix. Os filmes mais importantes de Lloyd na Goldwyn foram: O Mundo e Suas Mulheres, drama tendo como pano de fundo a revolução russa, estrelado pela cantora de ópera Geraldine Farrar e seu marido Lou Tellegen; A Ré Misteriosa, o célebre melodrama baseado na peça de Alexandre Bisson, com Pauline Frederick no papel principal; e O Dilúvio, drama psicológico  com Richard Dix e Helene Chadwick, envolvendo um grupo eclético de pessoas confinadas em um saloon no rio Mississipi vítimas de uma inundação.

Deixando a Goldwyn, Lloyd tornou-se o que pode ser basicamente descrito como um realizador semi-independente, dirigindo filmes para serem distribuídos pela Associated First National Pictures. Sob contrato com a Jackie Coogan Productions  (formada pelo pai de Jackie, assessorado pelo produtor independente Sol Lesser), ele dirigiu Oliver Twist / Oliver Twist / 1922 e sob contrato com a Norma Talmadge Film Corporation e/ou Joseph M. Schenck Productions, ele dirigiu a esposa de Schenck, em quatro filmes: A Duquesa de Langeais / The Eternal Flame / 1922; A Voz do Minarete / The Voice from the Minaret; Dentro da Lei / Within the Law (este para Joseph M. Schenck Productions) e Cinzas de Vingança / Ashes of Vengeance (todos de 1923).

Lon Chaney e Jackie Coogan em Oliver Twist

Nesta fase de sua trajetória artística distinguem-se Oliver Twist (Charles Dickens) e A Duquesa de Langeais (Honoré de Balzac) por sua origens literárias nobres. Na realização de Oliver Twist, um dos filmes nos quais Lloyd funcionou também como adaptador, ele teve sob sua orientação, no papel título, o gracioso e espontâneo Jackie Coogan – que se tornara um astro graças ao seu desempenho ao lado de Charles Chaplin em O Garoto The Kid / 1921 e Lon Chaney como Fagin. Em A Duquesa de Langeais, adaptado livremente por Frances Marion, o diretor contou com a presença de Norma Talmadge como a coquette Antoine de Langeais, que acaba se tornando freira.

Reconhecendo a posição de destaque que Lloyd conquistara na indústria, a Associated First National (que a partir de 1924 tornou-se também produtora sob a denominação de First National Pictures) ofereceu-lhe um contrato generoso, cobrindo seus serviços também como produtor. Assim, entre 1924 e 1926, Lloyd produziu e dirigiu: Os Bois Negros ou O Que As Mulheres Querem / Black Oxen/ 1914, com Corinne Griffith; O Gavião do Mar / The Sea Hawk / 1924, com Milton Sills, Enid Bennett); Vigília Silenciosa / The Silent Watcher / 1924, com Bessie Love; O Segredo do Marido / Her Husband’s Secret / 1925, com Antonio Moreno, Patsy Ruth Milller; À Mercê da Sorte / Winds of Chance / 1925 e Uma Grande Aventura / The Splendid Road / 1925, ambos com Anna Q. Nilsson; e Missão de Amor/ The Wise Guy / 1926, com Mary Astor, Betty Compson.

Milton Sills e Enid Bennet em O Gavião do Mar                                                                                     

Desde a infância, Lloyd gostava de tudo que estivesse relacionado com o mar, navios e marinheiros e em Gavião do Mar, o mais famoso dos filmes citados, ele pôde transmitir esta afeição, dedicando-se a uma pesquisa intensa a respeito da história mourisca e cuidando para que esta produção não contivesse tomadas de miniaturas de navios flutuando em um tanque. Preferiu usar galeões espanhóis do século XVI de verdade, construídos especialmente para o filme e as réplicas de tamanho natural foram consideradas tão bem recriadas, que a Warner Bros. usou-as repetidamente em outros filmes náuticos. As melhores cenas são as de combate entre os galeões, porém o restante do espetáculo é demasiadamente longo e estático, e as cenas de ação com Milton Sills, não são tão espetaculares como as de Douglas Fairbanks, por exemplo, em O Pirata Negro / The Black Pirate, realizado em 1926.

Ainda na década de 20, Lloyd fez dois filmes para a Famous Players-Lasky / Paramount (O Capitão Sazarac / The Eagle of the Sea / 1926, com Florence Vidor e Ricardo Cortez, filme de aventura marítima envolvendo um grupo de patriotas francêses que tenta resgatar Napoleão de Santa Helena e as atividades do pirata Jean Lafitte – rebatizado de Sazarac – e Filhos do Divórcio / Children of Divorce / 1927, drama romântico com Clara Bow como uma jovem pressionada pela mãe mercenária a se casar por dinheiro) e mais seis filmes para a First National (Adoração / Adoration / 1928, com Billie Dove, Antonio Moreno; Regeneração / Weary River / 1929; A Divina Dama / The Divine Lady / 1929; O Parasita / Drag / 1929; Ruas de Amargura / Dark Streets / 1929 e Febre de Juventude / Young Nowheres / 1929).

Richard Barthelmess em Regeneração

Corinne Griffith e Victor Varconi em A Divina Dama

Ainda na First National, Lloyd dirigiu Richard Barthelmess (com quem havia feito Regeneração, O Parasita e Febre da Juventude, todos exibidos em versões muda e sonora) em O Filho dos Deuses / Son of the Gods / 1930 e O Chicote / The Lash / 1930 (filmado em Vitascope, 65mm); The Way of All Men / 1930 com Douglas Fairbanks Jr.; The Right of Way / 1931 com Conrad Nagel e Loretta Young e foi emprestado à Fox para assumir a direção de Lágrimas de Amor/ East Lynne / 1931, com Ann Harding, Clive Brook e à Caddo Co. de Howard Hughes para dirigir e produzir  Idade para Amar / The Age of Love / 1931, com Charles Starrett e Lois Wilson.

Lágrimas de Amor, melodrama sobre uma infeliz heroína da Era Vitoriana, Lady Isobel Dane (Ann Harding) que, após um casamento desfeito (com Conrad Nagel) e uma aventura amorosa frustrada (com Clive Brook), fica cega, passando ainda por outros tormentos; sob astuta direção de Lloyd e belíssima foto de John Seitz, o filme obteve indicação para o Oscar.

Lloyd fez em seguida, ainda na Fox, A Dama Errante / A Passport to Hell / 1932, com Elissa Landi e Paul Lukas; Cavalcade / Cavalcade / 1933, com Diana Wynyard, Clive Brook; Romance Antigo / Berkeley Square / 1933, com Leslie Howard, Heather Angel; Lábios de Fogo / Hoop-La / 1933, com Clara Bow, Preston Foster; e Cinderela à Força / Servant’s Entrance / 1934, com Janet Gaynor, Lew Ayres.

Diana Wyniard e Clive brook em Cavalcade

Elegante adaptação da peça de Noel Coward, que mostra os acontecimentos históricos do início do século XX e suas consequências sobre uma família da classe média inglesa, Cavalcade ganhou o Oscar de Melhor Filme, Direção e Cenografia (William S. Darling). Frank Borzage pensou que poderia ocupar a direção, mas foi substituído por Lloyd e as cenas de guerra ficaram a cargo de William Cameron Menzies. Frase de anúncio: “A marcha do tempo medida por um coração humano – um coração de mulher!”.

Heather Angel e Leslie Howard em Romance Antigo

Em Romance Antigo, fantasia romântica baseada na peça de John L. Balderston sobre o rapaz que passa a fazer frequentes incursões na Londres do século XVIII, reencarnando-se em um antepassado, Leslie Howard transmite com perfeição a tristeza sentimental do protagonista e seu desempenho proporcionou-lhe indicação para o Oscar da Academia.

O período mais fértil de Frank Lloyd como mestre dos filmes de aventura marítima romântica ou histórica foram os anos de 1935 a 1939, quando ele realizou sucessivamente: O Grande Motim / Mutiny on the Bounty/ 1935 (MGM), Sob Duas Bandeiras / Under Two Flags / 1936 (20thCentury-Fox), A Donzela de Salem / Maid of Salem / 1937 (Paramount), Uma Nação em Marcha / Wells Fargo / 1937 (Paramount), Se Eu Fora Rei / If I Were King / 1938 (Paramount) e A Conquista do Atlântico / Rulers of the Sea / 1939 (Paramount).

Charlese Laughton Clark Cable em O grande Motim

A MGM adquiriu os direitos de filmagem da trilogia campeã de vendas de Charles Nordoff e James Norman Hall (Mutiny on the Bounty, Men Against The Sea, Pitcairn Island) e os roteiristas aproveitaram material dos dois primeiros livros, baseando-se também no diário do Capitão Bligh que relatava os fatos reais sobre um motim ocorrido durante uma viagem do navio HMS Bounty com 46 pessoas a bordo e ordens para transportar mudas de fruta-pão do Taiti para as Índias Ocidentais. Construiu-se duas réplicas perfeitas do Bounty e dois meses levaram as filmagens nos Mares do Sul, com muitos prejuízos por causa do mau tempo. A produção de Irving Thalberg custou dois milhões de dólares, cifra bem elevada em tempo de Depressão e arrebatou o Oscar. Ao prêmio da Academia concorreram também Clark Gable, Charles Laughton, Franchot Tone, o compositor Herbert Stothart, os roteiristas Talbot Jennings, Jules Furthman e Carey Wilson e a montadora Margareth Booth. Laughton compôs um Capitão Bligh muito mais cruel que o verdadeiro, papel com o qual ficaria eternamente identificado.

Após terminar O Grande Motim, Lloyd retornou para a Fox (denominada 20th Century-Fox a partir de 1935,) a fim de fazer um último filme, Sob Duas Bandeiras, antes de se transferir para a Paramount, onde havia trabalhado nos anos 20. Os exteriores dessaaventura romântica na Legião Estrangeira, extraída do romance de Ouida – com Ronald Colman como o legionário disputado por Cigarette, a simples camponesa que acompanha a tropa (Claudette Colbert, substituindo Simone Simon) e pela aristocrática Lady Venetia (Rosalind Russell), e vem a ser alvo da inveja do enciumado comandante do forte, interpretado por Victor MacLaglen – foram rodados no deserto do Arizona. Otto Brower encarregou-se das cenas de batalha em locação, ficando Lloyd ocupado com as cenas mais íntimas, filmadas no estúdio. Darryl F. Zanuck interferiu arbitrariamente na montagem. Lloyd anunciou que nunca mais trabalharia na 20thCentury-Fox e cumpriu sua promessa. Frase de publicidade: “Um amor tão quente quanto as areias do Saara”.

Em Donzela de Salem, primeiro filme de Lloyd na Paramount (onde tinha a sua unidade de produção denominada Frank Lloyd Pictures), envolvendo fanatismo e superstição na Nova Inglaterra do século XVII, Claudette Colbert interpreta a jovem inocente acusada de feitiçaria; Fred MacMurray, o rebelde da Virginia, que a salva da fogueira após um julgamento de grande tensão; e Bonita Granville, a menina que motiva todo o conflito do filme, acusando a heroína falsamente. Filmado em estúdio no Paramount Ranch ao norte de Los Angeles e em locação em Santa Cruz, passando por uma velha aldeia de Salem em 1692. No primeiro script, cuidadosamente pesquisado por Lloyd e seus roteiristas, a personagem de Claudette Colbert morria na fogueira; mas Joseph Breen, o chefe da Production Code Administration, observou que, apesar da lenda, as feiticeiras em Salem eram enforcadas. Foi uma decepção para o diretor pois, pela primeira vez havia contratado formalmente o consultor técnico, Lance Baxter, que já havia feito pesquisa para ele informalmente na filmagem de Cavalcade e Sob Duas Bandeiras.

Joel McCrea e Frances Dee em Uma Nação em Marcha

Uma Nação em Marcha, mostra ficcionalmente a criação da Wells Fargo através da história do mensageiro Ramsay MacKay (Joel McCrea) e de sua esposa sulista, Justine (Frances Dee). Depois de passar por alguns dissabores como o de ter sido roubado quando transportava o dinheiro dos mineiros para San Francisco, Ramsay faz a firma prosperar mas, durante a Guerra Civil, suas carruagens são atacadas quando transportavam ouro para Washington. Ramsay encontra-se com o presidente Lincoln e concorda em apoiar a União, porém como o irmão mais novo de Justine foi morto lutando pelos Confederados, seu casamento é abalado. O filme é um pouco longo, mas cheio de ação.

Ronald Colman e Frances Dee em Se Eu Fôra Rei

Desprezando a exatidão histórica, o roteiro de Preston Sturges para Se Eu Fora Rei, enriqueceu com toques cômicos deliciosos a peça de Justin Huntly McCarthy, inspirada na figura de François Villon. Basil Rathbone foi indicado para o Oscar pela espirituosa composição do Rei Luís XI e Ronald Colman era mesmo o ator ideal para viver o personagem do poeta vagabundo da Idade Média, apaixonado pela dama Katherine de Vaucelles  (Frances Dee).

O enredo fictício de A Conquista do Atlântico– baseado na viagem verídica do SS Savannah em 1819 – descreve os esforços de um jovem marujo, David Gillespie (Douglas Fairbanks) e um mecânico visionário, John Shaw (o ator britânico Will Fyffe), para construir o primeiro navio a vapor a atravessar o Atlântico Norte de Liverpool para Nova York.   David fora imediato de um navio a vela comandado pelo brutal Capitão Oliver (George Bancroft), que naturalmente não fica contente em perder um bom imediato e ver a criação de um método de transporte rival. David namora Mary (Margaret Lockwood), filha de Shaw e o filme acompanha este romance e as tentativas e aflições de David e Shaw até que o navio chega a seu destino – mas infelizmente Shaw, ferido por uma explosão, morre, abençoando a união de David e Mary.

 Nos anos 40, Lloyd produziu e dirigiu Flama da Liberdade / The Howards of Virginia / 1940 na Columbia, com Cary Grant, Martha Scott, e voltou para a Universal, onde iniciara sua carreira em 1913, agora como produtor semi-independente à frente de sua Frank Lloyd Productions Pictures, Inc.  Na Universal, produziu e dirigiu Paixão e Vingança / The Lady From Cheyenne / 1941, com Loretta Young, Robert Preston e Esta Mulher me Pertence  / This Woman is Mine  / 1941, com Franchot Tone, John Carroll; e apenas produziu: Sabotador / Saboteur / 1942 de Alfred Hitchcock; A Indomável / The Spoilers / 1942 de Ray Enright; Espião Invisível / The Invisible Agent / 1942.

 

Flama da Liberdade conta a história de Matt Howard (Cary Grant), jovem fazendeiro dos meados do século XVIII, amigo de Thomas Jefferson (Richard Carlson), que se casa com Jane Peyton (Martha Scott), filha de uma família rica de Williamsburg, e depois, contra o desejo de sua esposa – cujo irmão (Cedric Hardwicke) é leal ao governo britânico -, se junta aos colonistas na luta revolucionária. A maioria dos pontos altos da Revolução Americana são recriados inclusive os tumultos causados pelo Stamp Act, o Boston Tea Party, e o discurso inflamatório  “Give me Liberty” de Patrick Henry.

Loretta Young e Robert Preston em Paixão e Vingança

Paixão e Vingança é um western feminista com uma história inventada sobre a adoção do voto feminino em 1869 no Território do Wyoming. O figurão Jim Cork (Edward Arnold) espera manipular a venda de lotes da cidade para obter mais poder, mas a professora Annie Morgan (Loretta Young) compra um dos melhores lotes, atrapalhando seu plano. O advogado de Cork, Steve Lewis (Robert Preston), resgata-a de um sequestro ordenado por Cork e tenta persuadí-la a abandonar a política, porém Annie, é dura na queda e, juntamente com outras mulheres, levam Cork ao tribunal e ainda conseguem convencer os legisladores a aprovar o sufrágio feminino.

Esta Mulher Me Pertence é uma aventura marítima passada em 1810, tendo como personagens centrais uma cantora, Julie Morgan (Carol Bruce) que, apaixonada por um caçador de peles canadense, Ovide (John Carroll), segue-o como clandestina em uma viagem no navio “Tonquin” para o Oregon, sem saber que se trata de uma expedição organizada por Robert Stevens (Franchot Tone), homem de confiança do investidor milionário John Jacob Astor. Quando é descoberta, o Capitão Thorne (Walter Brennan) não tem intenção de retornar ao cais, e assim começam a se desenrolar os acontecimentos, como a queda de Julie ao mar e seu salvamento por Ovide, ataque dos índios, explosão do “Tonquin”, dois homens a bordo cortejando a mesma mulher etc. O filme foi relançado em 1969 com o título de Fury at Sea.

Ao irromper o Segundo Conflito Mundial na Europa, a comunidade britânica em Hollywood se movimentou para levantar fundos para o British War Relief e o resultado foi Para Sempre e Um Dia / Forever and a Day / 1943, no qual um repórter americano, Gates Trimble Pomfret  (Kent Smith) quer vender a casa que pertence à sua família, mas a atual ocupante, Lesley Trimble (Ruth Warrick) pensa que esta deve ser preservada como um monumento àqueles que viveram ali. Ela lhe conta a história do prédio desde sua construção em 1804 até o presente. O filme termina com a casa sendo bombardeada pela blitz nazista, mas Gates e Lesley resolvem reconstruí-la.

Anna Neagle, Ray Milland e Claude Rains em Para Sempre e Um Dia

Produzido pela Anglo-American Film Co e distribuído pela RKO, com um elenco de dezenas de atores e atrizes na sua maioria de nacionalidade britânica (Victor MacLaglen, Ray Milland, Anna Neagle, Jessie Mathews, Claude Rains, Charles Laughton, Ida Lupino, Brian Aherne, Merle Oberon, Cedric Hardwicke, Nigel Bruce, Donald Crisp, Ian Hunter, June Duprez, Edmund Gwenn, Reginald Gardiner, Gene Lockhart, Roland Young, Robert Coote, Gladys Cooper, Dame May Witty, Richard Haydn, Elsa Lanchester) e alguns americanos (Buster Keaton, Robert Cummings, Kent Smith, Ruth Warrick etc.), vários roteiristas e sete diretores nascidos na Europa (Edmund Goulding, Cedric Hardwicke, Frank Lloyd, Victor Saville, Robert Stevenson, Herbert Wilcox, René Clair), Para Sempre e Um Diacomeçou a ser filmado em maio de 1941, antes de Pearl Harbor, e a contribuição de Frank Lloyd foi na direção  das cenas de abertura e encerramento  do espetáculo.

Em 1944, com o pôsto de major, Lloyd foi indicado para o comando da 13thAir Force Combat Camera Unit e nesta época dirigiu Air Pattern – Pacific, documentário de 42 minutos, distribuído pelo Office of War Information.  Em junho de 1944, ele foi condecorado com a Legion of Merit pelo presidente Roosevelt pelo seu trabalho em missões de fotografia de combate no Sul do Pacífico. Como civil, Lloyd retornou a Guam em 1945, para servir como coordenador de uma produção para o Army Air Corps de um short emTechnicolor de 35 minutos, The Last Bomb (mostrando vários bombardeios sobre Tóquio e terminando com a explosão causada pela bomba atômica), narrado por Reed Hadley e distribuído pela Warner Bros.

Silvia Sidney e James Cagney em Sangue Sob o Sol

No último filme de Lloyd na década de 40, Sangue Sobre o Sol / Blood on the Sun / 1945 (produzido pela William Cagney Productions), James Cagney, é Nick Condon, editor americano de um jornal de Tóquio nos anos 30 (e bom lutador de judô), que encontra um colega (Wallace Ford) morto logo depois de sua esposa, por ter obtido  uma informação sobre um plano militar japonês expansionista. Nick obtém a mesma informação e, com a ajuda de uma mestiça chamada Iris (Silvia Sidney), luta por sua sobrevivência e tenta levar a notícia para fora do país. O filme apresenta o estereotipo do japonês enganoso e risonho Na cena final do filme, em frente aos portões da Embaixada Americana, Nick é confrontado pelos seus perseguidores. Os japoneses verificam que ele não tem o documento que estão procurando, e tentam se fazer de bonzinhos. “Vocês têm um ditado, perdoa seus inimigos”, diz um japonês sorridente. “Certo, perdoa seus inimigos, mas antes faça com ele o que ele quis fazer com você”, responde Nick.

Cena de A Última Barricada

Lloyd só voltou a filmar, após a morte de sua esposa Alma, em 16 de março de 1952. Em vez de ficar gozando a aposentadoria em seu rancho, ele se consolou, assinando um contrato de dois anos com a Republic, onde fez seus derradeiros filmes, Xangai,  Cidade Maldita / The Shanghai Story / 1954, drama de espionagem passado em Shanghai após a tomada comunista da China com Ruth Roman e Edmond O’Brien, e A Última Barricada  / The Last Command / 1955, filmado em Trucolor, focalizando Jim Bowie (Sterling Hayden) e a secessão do Texas do Mexico, que levou ao episódio histórico do Alamo. Tal como já vinha acontecendo inúmeras vezes com os filmes de Lloyd, as cenas de ação foram assinadas por outros, neste caso, pelo diretor veterano da Republic, William Witney.

Em 1954, Lloyd casou-se com a roteirista divorciada, Virginia Kellog, quase vinte anos mais moça do que ele. Virginia fora indicada duas vezes para o Oscar por Fúria Sanguinária / White Heat/ 1949 e À Margem da Vida / Caged / 1950. Não somente Llloyd decidiu se afastar definitivamente da direção, mas também sua esposa anunciou que estava abrindo mão de sua carreira para ser apenas Mrs. Frank Lloyd.

HOMENAGEM AO CAMONDONGO MICKEY

Nas comemorações dos 90 anos de Mickey Mouse eu não podia deixar de homenageá-lo, pelo prazer que deu a milhões de crianças e adultos de várias gerações, especialmente durante seu percurso cinematográfico, quando se expandiu sua imensa popularidade.

Walt Disney com Mickey

Personagem a partir do qual se construiu o mundo de sonho de Walt Disney e o seu império industrial, o “camondongo da fuzarca” é provavelmente a imagem mais difundida no mundo, transformando-se em um ícone universal. Embora atacado como símbolo do capitalismo americano, Mickey encantou e continua encantando pessoas de todas as nacionalidades com sua imagem doce e honesta e suas aventuras, primeiro transmitidas no cinema e depois transportadas para tiras de jornais, revistas de quadrinhos, livros infantis, televisão e outros meios de comunicação e diversão.

Nos quadrinhos, o personagem apareceu pela primeira vez no Brasil no Tico-Tico, com o título de Aventuras do Ratinho Curioso, aparecendo depois v. g., na Gazetinha, Suplemento Juvenil, Mirim, O Lobinho, Guri, Gibi, Albuns das Edições Melhoramentos, Seleções Coloridas da EBAL, e em revista própria da Editora Abril. A partir de julho 1942, O Suplemento Juvenil, O Mirim e O Lobinho patrocinaram todos os filmes da Walt Disney exibidos no Cineac-Trianon do Rio de Janeiro, colaboração eficiente entre aquele cinema de filmes curtos tão a gôsto da meninada e as três revistas que lideravam a imprensa infantil.

Nos cinemas, os desenhos curtos de Mickey Mouse foram distribuídos nos Estados Unidos primeiramente por Pat Powers (Patrick A. Powers, Celebrity Pictures) e depois sucessivamente pela Columbia (a partir de fevereiro de 1930), United Artists (a partir de dezembro de 1930) e RKO (de março de 1936 a setembro de 1954). No Brasil, a United Artists abriu seu escritório no Rio de Janeiro em 1926 e, a partir de março de 1933, passou a distribuir seus filmes, juntamente com os da Columbia e os da British Dominium, incluídos entre eles os desenhos curtos do Mickey, as Sinfonias Singulares  / Silly Symphonies, O Gato Estopim (Krazy Kat) e Scrappy (Chiquinho).

O Cinema Glória na Cinelândia, escolhido para iniciar a exibição dessa produção tornou-se logo conhecido como “A Casa do Camondongo Mickey” (e a cabine de projeção particular da UA era chamada de “O Buraco do Camondongo Mickey”). Em 9 de março de 1933, foi apresentado o seguinte programa: um número do “Jornal Paramount” / Paramount News; Camondongo Mickey em Sonho de Rato; Douglas Fairbanks, Maria Alba e William Farnum em Robinson Crusoe Moderno / Mr. Robinson Crusoe / 1932. Na entrada, o público recebia o primeiro exemplar do programa do Glória, em cujas páginas se encontrava a colaboração do escritor e jornalista maranhense, membro da Academia de Letras, Humberto de Campos

O Glória mantinha matinées oferecendo para a meninada um seriado, um filme de cowboy, além dos desenhos animados, que podiam ser os do camondongo Mickey ou as Sinfonias Singulares. Depois passou a promover também uma Sessão Camondongo Mickey aos domingos às 10 horas da manhã com preços reduzidos para a criançada.

Quando os desenhos de Mickey passaram a ser distribuídos pela RKO, eles foram lançados no Cinema Rex. Inaugurado em  22 de dezembro de 1938, o Cineac Trianon fechou contrato com a RKO-Radio para a exibição dos desenhos de Walt Disney. Posteriormente, o Gloria mostrou também desenhos do Popeye (no início conhecido como Marinheiro MataSete), distribuídos pela Paramount. Após o fim do contrato com a RKO, os filmes de Disney foram distribuídos pela Buena Vista Film Distribution Company, fundada em 1953.

 

Nos anos 30 foram realizados 91 desenhos curtos de Mickey, mas nos anos 40 a produção decresceu para somente 10 desenhos e terminaria nos anos 50 com apenas 3 filmes. Após 1940, a popularidade de Mickey diminuiu devido à concorrência do Pato Donald, do Pateta e do Pluto (antigamente chamado de Plutão, vulgo Topa Tudo), e também porque o camondongo calmo e sensível não se prestava para os desenhos feitos para o esforço de guerra – os outros três eram mais enfezados e temperamentais e portanto propícios para lutar contra as fôrças do Eixo. Conforme informação colhida no livro Doing Their Bit – Wartime American Animated Short Films 1939-1945 de Michael S. Shull e David E. Wit (McFarland, 2004), Mickey não estrelou nenhum “desenho de guerra” enquanto o Pato Donald surgiu em 15 desenhos, O Pateta em 3, e Pluto em 6 desenhos, “servindo ao seu país e fazendo a sua parte”.

Durante a Segunda Guerra Mundial, ambas as partes beligerantes tomaram precauções contra um eventual ataque químico. Nos Estados Unidos, Disney e a fábrica Sun Rubber Company criaram uma máscara anti-gás com a cara deu camondongo Mickey, para tentar tornar menos aterradora para as crianças a situação de ter que usá-la.

Embora o estrelato fílmico de Mickey estivesse em declínio nos anos 50, o personagem era muito reconhecível e amado para desaparecer da cultura popular e ele acabou reaparecendo na televisão, cujo advento aliás contribuiu para o desaparecimento  da exibição de desenhos animados curtos nas salas de cinema. Assim, as novas gerações puderam rever os cartoons do camondongo famoso em programas como O Clube do Mickey e Disneylândia.

Termino com uma curiosidade: em abril de 1936, a companhia de revistas do Teatro Recreio apresentou “Aleluia” de Joracy Camargo – o conhecido autor de “Deus lhe Pague”, um dos maiores sucessos de Procópio Ferreira – , que apresentava um quadro intitulado “Desenhos Animados” com Aracy Côrtes como Betty Boop, Oscarito como o Marinheiro Popeye, Willy Thompson como Al Jolson, Janot e Lou como Frankenstein e sua noiva e Eva Todor (ainda bem mocinha) no papel do Camondongo Mickey.

Como os dados biográficos desse ratinho fôfo com cara de menino são bastante conhecidos – tudo já foi dito sobre Walt Disney e seus filmes – tive dificuldade em encontrar algo inédito para brindar o aniversário do simpático roedor hollywoodiano e acabei optando por uma filmografia dos seus desenhos de curta-metragem exibidos comercialmente nos cinemas com os títulos em português corretos.

Trata-se de uma pesquisa dificíl, porque quando os jornais da época do lançamento dos filmes os indicavam, não davam o título original correspondente. Para dificultar a pesquisa, muitos dos que escrevem sobre Walt Disney no Brasil costumam traduzir ao pé da letra os títulos originais dos desenhos curtos (muitas vezes sem alusão a esse detalhe, v. g. Plane Crazy traduzido por Avião MalucoSteamboat Willie traduzido como O Vapor Willie; Barn Dance traduzido por A Dança do Celeiro) ou usar títulos em português de desenhos criados para a televisão, video cassetes ougames, dando a impressão de que certos filmes foram exibidos nas telas dos cinemas brasileiros, quando não foram.

F I L M O G R A F I A:

1928 -1929

Plane Crazy

Steamboat Willie

Gallopin’ Gaucho

The Barn Dance

The Opry House

When the Cat’s Away

The Plow Boy

The Barnyard Battle

The Karnival Kid

Mickey’s Follies

Mickey’s Choo- Choo

The Jazz Fool

Jungle Rhythm

The Hounted House

Wild Waves

1930

Just Mickey ou Fiddlin’Around

The Barnyard Concert

The Cactus Kid

The Fire Fighters

The Shindig

The Chain Gang

The Gorilla Mystery

The Picnic

Pioneer Days

1931

The Birthday Party / Dia de Aniversário

Traffic Troubles / Contra-Mão

The Castaway / Ninguém Me Quer

The Moose Hunt / Caçador Corajoso

The Delivery Boy / O Mensageiro

Mickey Steps Out / Mickey Sai do Sério

Blue Rhythm

Fishin’Around / Pescador Amador

The Barnyard Broadcast / Estação Irradiadora

The Beach Party / Festa Balneária

Mickey Cuts Up / Bancando o Sabido

Mickeys’ Orphans / Mickey, Pai de Órfãos (indicado ao Oscar)

1932

The Duck Hunt / Pato do Mato

The Grocery Boy / Secos e Molhados

The Mad Dog / Cachorro Louco

Barnyard Olympics / Olimpíadas Animadas

Mickey’s Revue / Revista de Mickey

Musical Farmer / Diga Isso Cantando

Mickey in Arabia / Mickey na Arábia

Mickey’s Nightmare / Sonho de Rato

Trader Mickey / Mickey, o Mercador

The Whoopee Party / Na Gandaia

Touchdown Mickey / Turuna do Football

The Wayward Canary / O Camondongo e o Canário

The Klondike Kid  / Tirando a Laska

Mickey’s Good Deed / Ato de Bondade

1933

Building a Building / Arranhando o Céu (Indicado ao Oscar).

The Mad Doctor / Médico Maníaco

Mickey’s Pal Pluto / Anjo Camarada

Mickey’s Mellerdramer / Melodrama de Mickey (paródia de “A Cabana do Pai Tomás com Mickey em papel duplo como Uncle Tom e Topsy, Minnie Mouse como Eva, Clarabelle Cow / Clarabela como Eliza, Horace Horsecollar / Horácio como Simon Legree)

Ye Olden Days / Nos Bons Tempos

The Mail Pilot / O Piloto do Correio Aéreo

Mickey’s Mechanical Man / O Autômato de Mickey

Mickey’s Gala Premiere/ A Grande Estréia

Puppy Love / Na Quadra Azul dos Amores

The Steeple-Chase / Salto e Galope

The Pet Store / Bichos de Estimação

Giant Land / O Castelo do Gigante

1934

Shanghaied / Marujo à Muque ou Marinheiro a Muque

Camping Out / Caçador de Mosquitos

Playful Pluto / Cão Brincalhão

Gulliver Mickey / A Ilha dos Liliputianos

Mickey’s Steamroller / O Compressor

Orphan’s Benefit/ Espetáculo de Benefício

Mickey Plays Papa / Camondongo Mickey Banca o Papai

The Dog-Napper / Cachorro Roubado

Two-Gun Mickey / Mickey Não Erra Tiro

1935

Mickey’s Man Friday / A Sexta-Feira de Mickey

The Band Concert / A Banda do Barulho (primeiro desenho de Mickey colorido)

Mickey’s Service Station / Autosocorro de Mickey

Mickey’s Kangaroo / Cangurú a Muque

Mickey’s Garden / O Jardim de Mickey

Mickey’s Fire Brigade / Bombeiro de Mickey

Pluto’s Judgement Day/ O Dia do Juízo de Pluto

On Ice / Pato Gelado

1936

Mickey’s Polo Team /O Campeão de Polo

Orphan’s Picnic / Piquenique dos Orfãos

Mickey’s Grand Opera / Ópera de Mickey

Thru The Mirror / Através do Espelho

Mickey’s Rival / O Rival de Mickey

Moving Day / O Dia de Mudança

Alpine Climbers / O Alpinista

Mickey’s Circus / O Circo de Mickey

Donald and Pluto / Donald e Pluto

Mickey’s Elephant / O Elefante de Mickey

The Worm Turns / Os Vermes Se Vingam

Don Donald / Don Donald

Magician Mickey / Mickey Mágico

Moose Hunters / Valentes Caçadores

Mickey’s Amateurs / A Troupe de Mickey

Modern Inventions / Invenções Modernas

Hawaiian Holiday / Férias do Hawaii

Clock Cleaners / Na Hora da Limpeza

Lonesome Ghosts / Fantasmas na Solidão

1938

Boat Builders  / Engenheiros Desastrados

Mickey’s Trailer / O Trailer de Mickey

The Whalers

Mickey’s Parrot / Papagaio Malandro

The Brave Little Tailor (Indicado ao Oscar)

1939

Society Dog Show /

The Pointer / O Perdigueiro (Indicado ao Oscar)

1940

Tugboat Mickey / Rebocador de Mickey

Mr. Mouse Takes a Trip / O Sr. Camundongo de Viagem

1941

The Little Whirlwind / O Pequeno Furacão

The Nifty Nineties / Tempos Alegres

Orphan’s Benefit / Benefício de Órfãos

1942

Mickey’s Birthday Party / O Aniversário de Mickey

Symphony Hour / Hora Sinfônica

1947

Mickey’s Delayed Date

1948

Mickey Down Under / Aventura na Austrália

Mickey and the Seal

1951

R’coon Dawg

1952

Pluto’s Christmas Tree

1953

The Simple Things


Como complemento deste artigo, sugiro uma visita aos meus posts: A Época Clássica do Desenho Animado Americano (24/9/2010); Trajetória de Walt Disney no Desenho Animado (10/12/2011); Desenhos Animados de Propaganda durante a Segunda Guerra Mundial (10/12/2011).

AS WAMPAS BABY STARS

De 1922 a 1934, a Wampas (The Western Association of Motion Picture Advertisers), associação de encarregados da publicidade das grandes companhias de cinema americanas, selecionava anualmente 13 “estrelinhas” promissoras sob contrato com os estúdios e que, mais tarde, poderiam ou não transformarem-se em grandes “estrelas”. Eles as lançavam com muita divulgação e as felizardas escolhidas eram apresentadas formalmente em uma festa de debutante, conhecida como “Wampas Frolic”, evento coberto pela mídia, tal como a cerimônia do Oscar hoje em dia.

Na lista de vencedoras estiveram nomes famosos de Hollywood como Bessie Love, Colleen Moore, Eleanor Boardman, Evelyn Brent, Laura La Plante, Clara Bow, Dolores Costello, Dolores Del Rio, Joan Crawford, Fay Wray, Janet Gaynor, Mary Astor, Joan Blondell, Loretta Young, Ginger Rogers, Jean Arthur, Anita Page, Frances Dee, Joan Blondell.

Jacqueline Logan em O Rei dos Reis

Lon Chaney e Mary Philbin em O Fantasma da Ópera

Julanne Johnston e Douglas Fairbanks em O Ladrão de Bagdad

Outras, apesar de não terem sido grandes estrelas, marcaram sua presença na tela em um determinado papel (v. g. Jacqueline Logan como Maria Madalena em O Rei dos Reis / The King of Kings / 1927 de Cecil B. DeMille; Lila Lee como Carmen em Sangue e Areia / Blood and Sand / 1922, com Rudolph Valentino; Patsy Ruth Miller como Esmeralda em O Corcunda de Notre Dame / The Hunchback of Notre Dame / 1923, com Lon Chaney; Mary Philbin como Christine em O Fantasma da Ópera / Phantom of the Opera / 1925, também com Lon Chaney;  Julanne Johnston como a Princesa em O Ladrão de Bagdad / The Thief of Bagdah / 1924, com Douglas Fairbanks; Olive Borden como Lee Carlton em Três Homens Maus / Three Bad Men / 1926, de John Ford;

Mary Brian e Betty Bronson em Peter Pan

Harold Lloyd e Jobyna Ralston

Mary Brian como Wendy em Peter Pan / Peter Pan / 1924 de Herbert Brennon) ou em mais de um (v. g. Louise Lorraine em vários seriados mudos; Kathryn McGuire em dois filmes de Buster Keaton, Marinheiro por Descuido / The Navigator e Bancando o Águia / Sherlock Jr, ambos de 1924; Jobyna Ralston em sete comédias com Harold Lloyd; Marceline Day como Charlotte de Vauxelles em Amor de Boêmio / The Beloved Rogue / 1927, com John Barrymore e Vampiros da Meia-Noite / London After Midnight  / 1927 como Lucille, com Lon Chaney;

Fredric March e Rochelle Hudson em Os Miseráveis

Rochelle Hudson e Claudete Colbert em Imitação da Vida

James Cagney e Anita Louise em Sonho de Uma Noite de Verão

Anita Louise em Maria Antonieta

Paul Muni e Anita Louise em A História de Louis Pasteur

Rochelle Hudson como Jessie, a filha de Claudette Colbert em Imitação da Vida  / Imitation of Life / 1934 e como Cosette em Os Miseráveis / Les Miserables / 1935; Anita Louise como Titania em Sonho de Uma Noite de Verão / A Midsummer Night’s Dream / 1935, como Maria em Adversidade / Anthony Adverse / 1936, como Annette Pasteur em  História de Louis Pasteur/ The Story of Louis Pasteur / 1936, como a Princesa de Lamballe em Maria Antonieta / Marie Antoinette / 1938;  Karen Morley como Sonia em Arsène Lupin / Arsene Lupin / 1932, com John e Lionel Barrymore, como Poppy em A Vergonha de uma Nação / Scarface / 1932, como Anna Novak em Inferno Negro / Black Fury / 1935, ambos com Paul Muni, e  como Mary Sims em O Pão Nosso OurDaily Bread / 1934  de King Vidor; Gloria Stuart como Flora, a noiva do Dr. Griffin (Claude Rains) em O Homem Invisivel / The Invisible Man / 1933, como “Dotty”, em Aí Vem a Marinha / Here Comes the Navy / 1934, com James Cagney e Pat O’Brien e, muitos anos depois, indicada como Melhor Atriz Coadujvante por sua atuação como Old Rose em Titanic / Titanic / 1997.

Wampas Baby Stars 1922-1934

1922: Maryon Aye, Helen Ferguson, Lila Lee, Jacqueline Logan, Louise Lorraine, Bessie Love, Kathryn McGuire, Patsy Ruth Miller, Colleen Moore, Mary Philbin, Pauline Starke, Lois Wilson, Claire Windsor.

Wampas Baby Stars 1922

Foi feito um short de 6 min. com as Wampas Baby Stars de 1922.

1923: Eleanor Boardman, Evelyn Brent, Dorothy Devore, Virginia Browne Faire, Betty Francisco, Pauline Garon, Kathleen Key, Laura La Plante, Margaret Leahy, Helen Lynch, Derelys Perdue, Jobyna Ralston, Ethel Shannon.

Evelyn Brent

1924: Clara Bow, Elinor Fair, Carmelita Geraghty, Gloria Grey, Ruth Hiatt, Julanne Johnston, Hazel Keener (Barbara Worth), Dorothy Mackaill, Blanche Mehaffey (Joan Alden, Janet Morgan), Margaret Morris, Marian Nixon, Lucille Ricksen, Alberta Vaughn.

Clara Boa em primeiro plano

1925: Betty Arlen, Violet Avon (Violet La Plante), Olive Borden, Anne Cornwall, Ena Gregory (Marian Douglas), Madeline Hurlock, Natalie Joyce, June Marlowe, Joan Meredith (Catherine Jelks), Evelyn Pierce, Dorothy Revier, Duane Thompson, Lola Todd.

Olive Borden

1926: Mary Astor, Mary Brian, Joyce Compton, Dolores Costello, Joan Crawford, Marceline Day, Dolores Del Rio, Janet Gaynor, Sally Long, Edna Marion, Sally O’ Neil,Vera Reynolds, Fay Wray.

Foi feito um short de 6 min. com as Wampas Baby Stars de 1926.

1927: Patricia Avery, Rita Carewe, Helene Costello, Barbara Kent,  Anita Page, Natalie Kingston, Frances Lee, Mary McAllister, Gladys McConnell, Sally Phipps, Sally Rand, Martha Sleeper, Iris Stuart, Adamae Vaughn.

Anita Page

1928: Lina Basquette, Flora Bromley, Sue Carol, Ann Christy, June Collyer, Alice Day, Sally Eilers, Audrey Ferris, Dorothy Gulliver, Gwen Lee, Molly O’Day, Ruth Taylor, Lupe Velez.

Wampas Baby Stars 1928

1929: Jean Arthur, Sally Blane, Betty Boyd, Ethlyne Clair, Doris Dawson, Josephine Dunn, Helene Foster, Doris Hill, Caryl Lincoln, Anita Page, Mona Rico, Helen Twelvetrees, Loretta Young.

1930: Por causa da mudança drástica do cinema silencioso para o falado e do país em choque diante do desastre de Wall Street, a Wampas eliminou sua seleção anual.

1931: Joan Blondell, Constance Cummings, Frances Dade, Frances Dee, Sidney Fox, Rochelle Hudson, Anita Louise, Joan Marsh, Marian Marsh, Karen Morley, Marion Shilling, Barbara Weeks, Judith Wood (Helen Johnson).

Joan Blondell

1932: Lona Andre, Lillian Bond, Mary Carlisle, June Clyde, Patricia Ellis, Ruth Hall, Eleanor Holm, Evalyn Knapp, Dorothy Layton, Boots Mallory, Toshia Mori, Ginger Rogers, Marian Shockley, Gloria Stuart, Dorothy Wilson.

Mary Carlisle

Devido aos empates, a Wampas apresentou mais de 13 “Babies” neste ano. Uma delas, Lillian Miles, deixou de comparecer e foi desqualificada tendo sido substituída pela japonesa Toshia Mori, a única asiática selecionada como Wampas Baby Star, o que lhe proporcionou o papel mais significativo de sua carreira  em  O Último Chá do General Yen / The Bitter Tea of General Yen / 1922 (Dir: Frank Capra), que estava de início reservado para Anna May Wong.

Toshia Mori

1933: Oficialmente, a seleção da Wampas foi cancelada devido à Depressão mas, não oficialmente, o motivo foi a pressão das majors, preocupadas com o excesso de controle da associação sobre suas estrelas.

1934: Judith Arlen, Betty Bryson, Jean Carmen (Julia Thayer), Helen Cohan, Dorothy Drake, Jean Gale, Hazel Hayes, Ann Hovey, Lucille Lund, Lu Anne Meredith, Gigi Parrish, Jacqueline Wells (Diane Duval, Julie Bishop), Katherine Williams, Mary Kormman, Dorothy Granger, Lenore Keefe, Naomi Judge e IreneWare.

Neste ano derradeiro de sua existência, a Wampas decidiu dar oportunidade também para atrizes freelance aspirantes ao estrelato. As vencedoras, nenhuma das quais obteve proeminência na indústria, apareceram em dois filmes, O Templo da Beleza / Kiss and Make Up / 1934 da Paramount (Dir: Harlan Thompson, com Cary Grant, Genevieve Tobin, Helen Mack e Jovens e Formosas / Young and Beautiful / 1934 da Mascot (Dir: Joseph Santley, com William Haines, Judith Allen).

No primeiro filme, o Temple de la Beauté do Dr. Maurice Lamar (Cary Grant) em Paris atrai mulheres de todas as partes do mundo. Uma das criações mais estimadas do Dr. Lamar é Eve Caron (Genevieve Tobin), que ele transformou em uma perfeição visual. Entretanto, o marido de Eve, Marcel (Edward Everett Horton), está furioso com Lamar por ter mudado a aparência de sua esposa. Eve (Helen Mack), a  secretária de Lamar, forma o quarteto  dessa comédia romântica que poderia ser melhor se houvesse  Lubitsch na direção. Um jornal carioca da época do lançamento do filme no Brasil, definiu assim as Baby Wampas Stars de 1934: “um rancho de pequenas que fariam perder o juízo a Santo Antonio”.

No segundo filme, o assessor de imprensa Bob Preston (William Haines), da Superba Pictures, convence seu patrão a contratar sua namorada June Dale (Judith Allen),  aspirante a atriz; porém a pressão intensa dos lances mirabolantes de publicidade criados por Bob, faz com que ela sinta o desejo de desfrutar das alegrias simples de uma pacata vida de casada.  Quando June começa a suspeitar de que Bob está mais interessado no êxito de suas campanhas publicitárias do que nela, briga com ele, e sai com um rico admirador, Gordon Douglas (John Miljan), provocando ciúme no namorado. Depois de alguns incidentes turbulentos, Bob e June compreendem que foram feitos um para o outro. Tais acontecimentos propulsionam essa comédia romântica modesta, que oferece alguns bons momentos cômicos, a música da orquestra de Ted Fio Rito, uma festa muito interessante, onde aparecem dançarinos mascarados usando roupas que caracterizam alguns artistas famosos de Hollywood (John Barrymore, Clark Gable, Wallace Beery, Maurice Chevalier, Stan Laurel e Oliver Hardy, George Arliss, Buster Keaton, Jimmy Durante, Joe E. Brown, Charles Chaplin, Eddie Cantor, Adolphe Menjou), a presença do sempre hilariante  Franklin Pangborn e, é claro, o desfile das meninas da Wampas. Haines, destituído da MGM, da qual fôra um dos maiores top money making stars, ainda estava em boa forma no seu fim de carreira na Mascot da Poverty Row.

Judith Allen

Ainda em 1934, a Paramount nomeou suas próprias seis “protegidas”: Evelyn Venable, Frances Drake, Dorothy Dell, Helen Mack, Elizabeth Young e Ida Lupino. A Fox fez o mesmo, apontando suas “debutantes”: Pat Patterson, Drue Leyton, Alice Faye, Claire Trevor, Rosemary Ames. As “Paramount Protegees of 1935” foram: Wendy Barrie, Grace Bradley (Boyd), Katherine DeMille, Gertrude Michael, Gail Patrick, Ann Sheridan. Em 1936, surgiram as “Flash Lighter Starlets” (Helen Burgess, Frances Gifford, Kay Hughes, Janice Jarrett, Rosina Lawerence, Joan Perry, Cecilia Parker, Barbara Pepper, June Travis, Helen Wood). Em 1938, as companhias de cinema selecionaram suas “Lucky 13” starlets: Mary Maguire, Jane Bryan, Mary Russell, Jacqueline Wells (depois conhecida como Julie Bishop), Phyllis Brooks, Betty Jaynes, Helen Troy, Olympe Bradna, Barbara Read, Joan Woodbury, Sigrid Curie, Franciska Gaal e Margaret Tallichet. Em 1940, a Motion Picture Publicists Association escolheu 13 “Baby Stars”: Ella Bryan, Lucia Carroll, Peggy Diggins, Lorraine Elliott, Jayne Hazard, Joan Leslie, Kay Leslie, Marilyn (Lynn) Merrick, Gay Parkes, Lois Ranson, Sheila Ryan, Patricia Van Cleve, Tanya Widrin.

Paramount Protegees of 1935

Em 1956, um grupo de artistas sob a liderança da ex-Wampas Ginger Rogers selecionou 15 moças bonitas, supostamente para serem conhecidas como “The Wampas Baby Stars” mas, como não havia mais a Western Association of Motion Picture Advertisers, a idéia malogrou. Porém a seleção aconteceu, tendo sido escolhidas: Phyllis Applegate, Roxanne Arlen, Jolene, Fay Spain, Brand, Donna Cooke, Barbara Hoffman (Eden), Jewell Lain, Barbara Marx, Lita Milan, Norma Nilsson, Ina Poindexter, Violet Rensin, Dawn Richard e Delfin (ou Del-Fin) Thursday.

Barbara Eden

Dessas  quinze, as mais conhecidas foram Barbara Eden, como Jeannie na série de TV, Jeannie é um Gênio/ I Dream of Jenniee ao lado de Elvys Presley em Estrela de Fogo / Flaming Star / 1960, de Don Siegel; Barbara Marx, como esposa de “Zeppo” Marx e depois de Frank Sinatra; Lita Millan, por seu papel em A Vida de um Gângster / I Mobster / 1959  de Roger Corman; e Fay Spain, como a Rainha Antinea de Atlantis em Hércules na Conquista da Atlântida / 1961 / Ercole alla Conquista di Atlantide / 1961, de Vittorio Cottafavi. As demais, não pontuaram, como se diz nas pesquisas eleitorais.

VINCENT SHERMAN

Ele era um exemplo típico de “diretor de estúdio”, artesão competente e cuidadoso, realizador de um punhado de obras de qualidade e lembrado particularmente pelos filmes que fez nos anos quarenta na Warner Bros. onde, por causa de sua habilidade para orientar os melodramas do estúdio, se tornou o diretor favorito de estrelas como Bette Davis, Joan Crawford, Ann Sheridan e Ida Lupino.

Vincent Sherman

Vincent Sherman (1906 – 2006), cujo verdadeiro nome é Abraham Orovitz (na verdade Horovitz, mas seu pai tirou o H “para americanizá-lo”), nasceu em Vienna, Georgia. Estudou na Oglethorpe University em Atlanta e, quando sua família se mudou para esta cidade, ele arranjou um emprego na Enterprise Distributing Company como vendedor de westernsmudos de Buddy Roosevelt e Buffalo Bill Jr., filmes de ação com Reed Howes e alguns filmes “de sociedade”, como eram chamados aqueles nos quais os homens apareciam de terno e as mulheres com vestidos e todos ficavam parados mais ou menos no mesmo lugar e falavam por intertítulos – porque o som ainda não havia sido inventado (cf. Studio Affairs – My Life as a Film Director Vincent Sherman, University of Kentucky,1996).

Passado algum tempo, Abraham trabalhou como repórter policial no Atlanta Journal e se matriculou na Faculdade de Direito da cidade; porém acabou se convencendo de que seu destino era o teatro, e partiu para Nova York, onde viviam alguns parentes, na companhia de James Larwood, seu colega na Oglethorpe University, com o qual havia escrito uma peça intitulada “The Steeple”.

James arrumou um lugar em um jornal e Abraham procurou um agente ou produtor que o ajudasse a se tornar ator. O recepcionista do escritório do agente Chamberlain Brown lhe perguntou como se chamava e ele respondeu: “Abe Orovitz”. “Não vai dar, ninguém conseguirá pronunciá-lo e muito menos soletrá-lo. Vamos conseguir algo mais simples. Como é o nome de solteira de sua mãe?”. Abe falou: “Schurman or Sheerman, não tenho certeza”.  O recepcionista pensou em voz alta: “Sherman, nada mau, Qual é o primeiro nome do seu pai?”. Abe disse: “Harry”. “Este é um nome muito comum. Qual o primeiro nome de sua mãe?”. A resposta foi: “Vinnie”. O recepcionista repetiu o nome várias vezes. “Vinnie, Vinnie, Vincent. … e concluiu: “Tudo bem, garoto. Este será o seu nome daqui em diante – Vincent Sherman. Volte amanhã e eu vou tentar marcar uma entrevista com Mr. Brown”. No dia seguinte, Sherman se encontrou com um ator que ele conhecera e lhe contou o que aconteceu. “Boa sorte”, ele lhe desejou, sorrindo. “Mas cuidado. Mr. Brown é bicha”. Espantado, Abe achou que era melhor ficar longe do escritório de Brown, e nunca mais voltou (cf. Studio Affairs).

Depois de muitas tentativas frustradas, Sherman finalmente atuou como figurante no Theatre Guild na peça “Marco Millions” de Eugene O’Neill, estrelada por Alfred Lunt no papel de Marco Polo e dirigida por Rouben Mamoulian e depois em “Volpone”, na versão de Stefan Zweig da peça de Ben Johnson, na qual Lunt fazia o papel de Mosca. Subsequentemente, Sherman foi contratado para estudar o papel de alguns atores para substituí-los em caso de necessidade, chegando a interpretar os pequenos papéis para os quais se preparara.

Vincent Sherman e John Barrymore em O Conselheiro

Após mais alguma atividade nos palcos – entre elas, como um rapaz judeu pobre que, espancado pela polícia e preso por fazer discursos comunistas, é defendido por um  advogado também judeu (Otto Kruger) na peça de Elmer Rice “Counsellor at Law” -, Sherman foi convidado para repetir o mesmo papel na versão cinematográfica (aqui intituladaO Conselheiro), personificando o advogado (que Paul Muni também interpretara no teatro).

No ano seguinte, Sherman apareceu em  filmes B da Columbia – Asas da Velocidade / Speed Wings / 1934 (Dir: Otto Brower com Tim McCoy); Detetive Invisível / Hell Bent for Love/ 1934 também conhecido como Highway Patrol (Dir: D. Ross Lederman com Tim McCoy); Girl in Danger / 1934 (Dir: D. Ross Lederman com Ralph Bellamy); O Crime de Helen Stanley / The Crime of Helen Stanley / 1934 (D. Ross Lederman com Ralph Bellamy); One is Guilty / 1934 (Dir: Lambert Hillyer com Ralph Bellamy), estes três últimos da série Inspector Trent – e da Warner (Alibi da Meia-Noite / Midnight Alibi / 1934 (Dir: Alan Crosland com Richard Barthelmess);  O Caso do Cão Uivador / Case of the Howling Dog/ 1934 (Dir: Alan Crosland com Warren William).

Entre 1935 e 1938, Sherman atuou em / ou dirigiu as peças: “Judgement Day”, “Volpone”, “Sailors of Catarro”, “Black Pit”, “Waiting for Lefty”, “Battle Hymn”, Bitter Stream”, “It Can’t Happen Here”, “Dead End” e outras. Em 1938, convidado por Bryan Foy, chefe do departamento de filmes  classe B da Warner, ele escreveu scripts para alguns filmes: No Limiar do Crime / Crime School (Dir: Lewis Seiler com Humphrey Bogart e os Dead End Kids); Filhos Sem Lar / My Bill (Dir: John Farrow com Kay Francis); Coração do Norte / Heart of the North (Dir: Lewis Seiler com Dick Foran); Contra a Lei / King of the Underworld (Dir: Lewis Seiler com Humphrey Bogart e Kay Francis); O Orgulho do Turfe  / Pride of the Blue Grass (Dir: William McGann com Edith Fellows); e finalmente assumiu a direção de A Volta do Dr. X / The Return of Dr. X. / 1939.

 

Neste filme de horror / ficção científica, Humphrey Bogart, ainda no início de carreira, interpreta o papel de um criminoso que morreu na cadeira elétrica e, ressuscitado por um cientista, necessita de sangue humano fresco para continuar sua ressurreição. Sherman ainda não dominava a técnica (não conhecia nada de lentes, ângulos, cortes) mas, com a ajuda do fotógrafo Syd Hickox, foi em frente, e fez um trabalho que agradou ao público e ao seu patrão, Jack Warner.

Graças aos irmãos gêmeos roteiristas Julius e Philip Epstein, que o indicaram para substituir Anatole Litvak na direção da comédia-dramática Desafio ao Destino/ Saturday’s Children / 1940 – baseada em uma peça de Maxwell Anderson sobre uma moça (Ann Shirley) que se casa com um inventor cheio de sonhos (John Garfield) e os dois enfrentam uma vida de privações econômicas -, Sherman obteve mais um sucesso de público e elogio dos patrões.

Porém Brian Foy não tinha a intenção de abrir mão dele e o trouxe de volta para o departamento B, onde ele fez: O Homem Que Falou Demais/ The Man Who Talked Too Much / 1940, drama de tribunal no qual um promotor (George Brent) que renunciou ao seu cargo por ter enviado um inocente para a cadeia, envolve-se com um gangster (Richard Barthelmess) e depois se volta contra ele para defender seu irmão  (William Lindigan); Fugindo ao Destino/ Flight from Destiny/ 1941, drama criminal no qual um professor de filosofia (Thomas Mitchell), ao saber que só tem seis meses de vida, comete um assassinato, para ajudar dois jovens amantes (Geraldine Fitzgerald, Jeffrey Lynn); e A Voz da Liberdade / Underground/ 1941, drama de guerra sobre as atividades de uma estação de rádio clandestina na Alemanha e uma família  (da qual fazem parte Jeffrey Lynn e Philip Dorn) separada pelo Nazismo.

Cena de Balas contra a Gestapo, vendo-se no centro Peter Lorre, Humphrey Bogart, Edward Brophy e Kaaren Verne

Este último filme obteve o aplauso dos resenhistas e o apoio da bilheteria, e elevou Sherman à categoria de diretor de filme classe A. Seu primeiro compromisso nesta condição foi o divertido Balas Contra a Gestapo / All Trough the Night / 1942, estrelado por Humphrey Bogart  (que a esta altura já havia feito O Último Refúgio / High Sierra  e Relíquia Macabra/ The Maltese Falcon). Tal como A Voz da Liberdade, foi um filme de propaganda de guerra – só que, desta vez, conjugando ação, suspense e comédia -, focalizando um grupo de apostadores profissionais de Nova York que desbarata um bando de sabotadores nazistas (Conrad Veidt, Peter Lorre, Judith Anderson).

Sherman dirigiu em seguida seu melhor filme até então, É Difícil Ser Feliz / The Hard Way/ 1943, drama com Ida Lupino em grande forma no papel de uma mulher ambiciosa e dominadora que impele sua irmã (Joan Leslie) mais nova e talentosa para o mundo do entretenimento, a fim de que ambas possam sair da pobreza. Durante a filmagem, Ida se desentendeu com Sherman e, abalada também pela morte de seu pai, teve que ser internada em um hospital. No primeiro dia em que voltou para frente das câmeras, ela teve uma crise de histeria e, quando pôde voltar ao trabalho, as desavenças com o diretor aumentaram. Na estréia do filme, ela saiu no meio da projeção. Compreendendo muito bem as atrizes temperamentais, Sherman telefonou para Ida em busca de uma reconciliação. Ela estava encantadora, como se eles nunca tivessem brigado.

Ida Lupino e Paul Henreid em Viveremos Outra Vez

Ida fez mais dois filmes sob as ordens de Sherman, o drama Viveremos Outra Vez In Our Time / 1944 e a comédia Que Falta Faz Um Marido / Pillow to Post / 1945, ambos passados em ambiente da Segunda Guerra Mundial, o primeiro na Polonia às vésperas da invasão nazista e o segundo nos Estados Unidos, na frente doméstica – o primeiro melhor do que o segundo, mas nenhum dos dois  no mesmo nível artístico de É Difícil Ser Feliz.

Bette Davis e Miriam Hopkins em Uma Velha Amizade

Sherman precisou de muita autoridade para conduzir Bette Davis  (a maior atração do estúdio) e Miriam Hopkins no sólido drama Uma Velha Amizade / Old Acquaintance / 1943, pois a dupla havia atuado antes em Eu Soube Amar The Old Maid / 1939 (Dir: Edmund Goulding) e desde então, começaram a surgir comentários sobre a rivalidade entre elas. Houve de fato certa competição e ciúme na filmagem de Uma Velha Amizade, Miriam querendo chamar mais atenção do que Bette. Quando Miriam terminou sua participação no filme, ela e Bette não estavam mais se falando. No enredo, elas são duas amigas de infância: uma, romancista respeitada pelos críticos, mas pouco lida; a outra, autora de romances de amor populares que vendem bem. Só que, na tela, apesar das rivalidades e temperamentos diferentes, a amizade entre as duas continua através dos tempos.

Sherman orienta Bette Davis na filmagem de Vaidosa

Como Sherman revelou em sua autobiografia, foi durante a filmagem de Uma Velha Amizade, que Bette Davis declarou que estava apaixonada por ele, mas eles só iniciaram o  caso, quando estavam filmando Vaidosa / Mr. Skeffington / 1944 -depois que o marido dela, Arthur Farnesworth faleceu. Sherman ainda teria um relacionamento tempestuoso com Joan Crawford e outro mais breve – apenas uma tarde – com Rita Hayworth, quando estavam filmando Uma Víuva em Trinidad / Affair in Trinidad/ 1952. Sua esposa Hedda, supostamente sabia desses casos, mas os aceitou como inevitáveis no ambiente cinematográfico.

Bette Davis em Vaidosa

Cena de Vaidosa vendo-se  Walter Abel,  Bette Davis e Claude Rains

Em Vaidosa, outro filme muito bom de Sherman, Bette protagoniza uma mulher da alta sociedade de Nova York muito cortejada e obcecada por sua própria beleza. Ela se casa por conveniência com um banqueiro judeu (Claude Rains). Os anos passam, ela envelhece, perde a beleza. Mas o marido fica cego, após ser torturado pelos nazistas e, para ele, ela será sempre bela. Bette Davis e Claude Rains foram ambos indicados para o Oscar.

Depois de Vaidosa, Sherman fez o já citado Que Falta Faz um Marido com Ida Lupino e, devido ao êxito comercial deste filme, o produtor Alex Gottlieb mandou chamá-lo quando Michael Curtiz se negou a dirigir a continuação de uma comédia que  dirigira intitulada Janie Tem Dois Namorados / Janie/ 1944.  A sequência também foi rejeitada por Joyce Reynolds, a jovem atriz que criou o papel. Sherman tentou se esquivar, mas Jack Warner insistiu, e ele acabou aceitando, porque gostou do elenco que incluia Joan Leslie (Janie), Robert Hutton (seu marido), Edward Arnold e Ann Harding (o pai e a mãe de Janie), Robert Benchley (o sogro de Leslie). Uma novata, Dorothy Malone, fez sua estréia no papel da “outra mulher”. O filme intitulou-se Janie Se Casa/ Janie Gets Married, mas foi um fracasso comercial.

Seguiram-se na filmografia de Sherman dois filmes que merecem destaque, produzidos especificamente para realçar a figura da “Oomph Girl”, Ann Sheridan: A Sentença / Nora Prentiss / 1947 e A Cruz de um Pecado/ The Unfaithful/ 1947.

Kent Smith e Ann Sheridan em A Sentença

Em A Sentença, um médico casado, Dr. Richard Talbot (Kent Smith) atende uma cantora de boate, Nora Prentiss (Ann Sheridan), e os dois iniciam um romance. Quando ele não cumpre sua promessa de pedir o divórcio, Nora resolve aceitar o convite de seu patrão e admirador, para atuar na nova boate em Nova York. Talbot então forja sua própria morte, trocando de identidade com um paciente morto, e parte com Nora. Mas acaba sendo condenado por ter matado a si mesmo. O desespero do médico e seu fim patético e irônico dão certo conteúdo noirao filme, sem falar na fotografia expressionista de James Wong Howe.

Zachary Scott, Ann Sheridan e Lew Ayres (o advogado que defende a assassina) em A Cruz de um Pecado

A Cruz de um Pecado, refilmagem disfarçada de A Carta / The Letter / 1940 de William Wyler, conta a mesma história de uma mulher aparentemente irrepreensível (Ann Sheridan) que foi infiel ao marido e mente sobre as circunstâncias que a levaram a matar um homem, mas transfere a ação para Los Angeles logo após a Segunda Guerra Mundial, e tem um desfecho diferente, a adúltera reconciliando-se com o esposo (Zachary Scott). Mesmo sem contar com um roteiro pronto, Sherman deu início à filmagem, e conseguiu realizar um drama eficiente, no qual analisa mais uma vez com êxito a psicologia feminina.

Viceca Londfors e Errol Flynn em As Aventuras de Don Juan

Após ter sido contemplado com um novo contrato mais vantajoso, Sherman foi requisitado – a pedido de Errol Flynn por recomendação de Ann Sheridan – para dirigir As Aventuras de Don Juan / The Adventures of Don Juan / 1949, projeto que já vinha sendo desenvolvido pela Warner desde 1945, mas que não pudera ser concretizado por falta de um bom scripte de uma greve de diretores de arte. Aos 38 anos de idade, Flynn já estava começando a sofrer os efeitos do que ele chamaria nas suas memórias de “My Wicked, Wicked Ways”, e precisou ser dublado em várias cenas de ação. Durante o climático duelo com o vilão (Robert Douglas), Sherman não conseguia encontrar alguém para dar aquele salto de uma imensa escadaria até que o futuro Tarzan Jock Mahoney aparecesse. Apesar de todos os problemas Sherman e o produtor Jerry Wald conseguiram realizar um filme suntuoso (com indicações para o Oscar de Figurinos, Direção de Arte e Decoração de Interiores) e movimentado, embelezado pelo glorioso Technicolor e com o acompanhamento da música inspirada de Max Steiner.

Depois de um grande espetáculo de reconstituição histórica como As Aventuras de Don Juan, Sherman quis abordar uma história simples, que investigasse somente a condição humana e escolheu uma adaptação de “The Hasty Heart”, peça de John Patrick que a Warner havia comprado há alguns meses; porém Jack Warner lhe pediu que fizesse também um outro filme, para dar trabalho a seis atores que estavam ganhando sem fazer nada: Edmond O’Brien, Gordon Mac Rae, Virginia Mayo, Viveca Lindfors, Dane Clark e Richard Rober.

Patricia Neal e Richard Todd em Coração Amargurado

Assim surgiram Coração Amargurado / The Hasty Heart/ 1949 e Alguém Deixou Este Mundo / Backfire / 1950. O primeiro, produzido pela ABPC (Associated British Pictures Corporation), da qual a Warner detinha 40% das ações, e rodado em Elstree, é um drama de guerra supercomovente com Ronald Reagan, Patricia Neal e Richard Todd, este último em uma performance que lhe proporcionou uma indicação para o Oscar como um escocês orgulhoso e nada sociável, mortalmente ferido que não sabe que vai morrer, mas acaba descobrindo o seu destino. O segundo, com aqueles atores citados que estavam na boa vida, é um drama criminal com o tema noir – mas sem o estilo visual dark– do veterano de guerra envolvido com o desaparecimento de um amigo e uma narrativa com sete retrospectos, cheia de peripécias que se sucedem em um ritmo rápido, fazendo com que o espectador se esqueça do excesso de coincidências.

Joan Crawford, David Brian e Kent Smith em Os Desgraçados Não Choram

Os três próximos filmes, dirigidos como sempre com segurança e sapiência técnica por Sherman, tiveram como estrela Joan Crawford, dois deles, Os Desgraçados Não Choram / The Damned Don’t Cry/ 1950 (Joan como uma mulher humilde que se torna amante do líder de uma quadrilha que explora o jôgo, a prostituição e o tráfico de entorpecentes) e Adeus, Meu Amor/ Goodbye My Fancy / 1951 (Joan como uma deputada que retorna à escola que cursara para receber um título honorário e renova um antigo romance), foram produzidos pela Warner, e o terceiro, A Dominadora / Harriet Craig/ 1950 (adaptação da peça laureada de George Kelly com uma interpretação correta de Joan no papel da mulher egoísta e despótica, mas não tão persuasiva quanto a de Rosalind Russell na versão anteriormente levada à tela com maior precisão por Dorothy Arzner) para a Columbia.

Joan Crawford e Robert Young em Adeus, meu Amor

Após filmar um western apenas regular, Estrela do Destino / The Lone Star/ 1952, na MGM com Clark Gable e Ava Gardner, Sherman dirigiu Rita Hayworth em Uma Viúva em Trinidad / Affair in Trinidad/ 1951 na Columbia, quase uma refilmagem de Gilda/ Gilda / 1946) que, sem ser espetáculo desprezível, é inferior ao filme de Charles Vidor.

Rita Hayworth recebe instruções de Sherman na filmagem de Uma Viúva em Trinidad

Tal como muitos indivíduos talentosos de Hollywood durante os anos cinquenta, Sherman sofreu os efeitos da HUAC (House Un-American Activities), tendo sido colocado, não em uma lista negra, mas em uma lista cinza menos conhecida, sob a alegação de ter apoiado organizações e roteiristas comunistas. Apesar de todos os esforços para limpar seu nome, ele não conseguiu arrumar emprego em Hollywood, e partiu para a Europa, onde dirigiu  Defendo o Meu Amor/ Difendo il Mi Amore/ 1955 (com Martine Carol, Gabrielle Ferzetti, Vittorio Gassman), tendo sido filmadas cenas adicionais, com as quais não concordava, por Giulio Macchi. Sherman nunca viu o filme finalizado.

Quando seu nome foi retirado da lista cinza (por interferência de um congressista que fazia parte da HUAC e era amigo de seu agente), Sherman pôde trabalhar novamente, refilmando 70% do que Robert Aldrich havia rodado de Clima de Violência / The Garment Jungle / 1957 / Columbia (drama criminal sobre a influência de escroques na atividade dos sindicatos da indústria de roupas, valorizado pela admirável fotografia em preto-e-branco de Joseph Biroc e as interpretações de Lee J. Cobb e Richard Boone); Sementes de Paixão / The Naked Earth / 1958 / Twentieth Century-Fox (aventura africana rotineira com Richard Todd e Juliette Greco) e  O Moço de Filadélfia / The Young Philadelphians / 1959 / Warner (melodrama desenrolado na alta sociedade com um herói arrivista (Paul Newman) e alguns conflitos de classe, com bom acabamento cenográfico e interpretações consciensiosas de Newman, Barbara Rush e Alexis Smith).

Paul Newman e Barbara Rush em O Moço de Filadélfia

Nos anos sessenta, Sherman dirigiu corretamente, mas com pouco ardor, O Gigante de Gelo/ Ice Palace/ 1960 / Warner (história melodramática de Edna Ferber abordando a amizade de dois homens (Richard Burton, Robert Ryan), que se torna rivalidade paralelamente à transformação do Alaska de território em Estado) e   Escândalos Ocultos/ A Fever in the Blood / 1961 / Warner, drama focalizando um julgamento criminal, onde vários candidatos a governador (um senador (Don Ameche), um promotor (Jack Kelly) e um juiz da Suprema Côrte (Efrem Zimbalist)  usam para favorecer suas ambições políticas. Ainda na mesma década, a Twentieth Century-Fox requisitou Sherman para dirigir Debbie Reynolds (por sugestão dela) em Furacão de Saias/ The Second Time Around / 1961 / Twentieth Century-Fox (western cômico tendo como centro das atenções uma jovem viúva (Debbie Reynolds) que parte para uma pequena cidade do Oeste, trabalha em uma fazenda, é cortejada por um vizinho (Andy Griffith) e pelo dono do cassino local (Steve Forrrest), e acaba se elegendo xerife).

O último filme de Vincent Sherman foi Cervantes, O Jovem Rebelde  / The Young Rebel / 1967, co-produção ítalo-franco-espanhola (Landau-Unger/Alexander Salkind) perturbada por problemas financeiros (devido ao qual, por exemplo, em vez das quatro semanas previstas a colossal batalha naval de Lepanto foi filmada em apenas três dias) e com o ator alemão Horst Buchholz sem vigor interpretativo para personificar uma figura de tanta personalidade como o autor do imortal Don Quixote. O filme foi remendado grosseiramente na montagem à revelia do cineasta  e, apesar de contar no seu elenco com atores de prestígio como Gina Lollobrigida, José Ferrer, Louis Jourdan, Francisco Rabal e Fernando Rey, encerrou melancolicamente a carreira cinematográfica do cineasta. Ele continuou trabalhando na televisão até 1983.

AS COMÉDIAS DA EALING

Em 1901, o produtor pioneiro Will Barker fundou a Autoscope Company e, no mesmo ano, construiu um estúdio ao ar livre – um palco, andaimes e um fundo de cenário – em Stamfort Hill, norte de Londres. Em 1907, Barker comprou uma mansão em Ealing, oeste da capital londrina, e edificou três estúdios com paredes e tetos de vidro para as suas produções cinematográficas. Em 1911, ele realizou seu primeiro filmes de dois rolos, Henry VIII, no qual o consagrado ator de teatro Sir Herbert Beerbohm Tree (pai de vários filhos ilegítimos entre eles Carol Reed e Peter Reed, progenitor de Oliver Reed) interpretou o papel do Cardeal Wolsey. Em 1913, Barker estava preparando seus atores para o estrelato entre eles Blanche Forsythe e Fred Paul, que apareceram em East Lynne, primeiro filme britânico de seis rolos, dirigido por Bert Haldane. Em 1915, Barker colocou a nova estrela Blanche Forsythe no papel principal de um drama histórico, Jane Shore, a Rosa de Yorke /  Jane Shore, empregando centenas de figurantes, e foi comparado a Griffith.

Will Barker

Em 1920, Barker vendeu o estúdio para a General Film Renters Company, que logo encerrou suas atividades. Durante algum tempo, as instalações foram usadas por produtores independentes e eventualmente, em 1929, compradas pela Associated Radio Pictures Company que, em 1931, construiu um novo estúdio muito perto do velho Barker Studio. A firma era encabeçada pelo ator-empresário Sir Gerald du Maurier, Reginald Baker (contador), Stephen Courtauld (diretor financeiro, membro da riquíssima família da indústria têxtil) e Basil Dean.

Sir Gerald du Maurier

Basil Dean

Dean começou no mundo do espetáculo como ator aos dezoito anos de idade e depois produziu muitas peças e filmes. Ele foi o orientador mais influente do estúdio durante os anos 30 e responsável pelo desenvolvimento da carreira de dois artistas do music-hall, que se tornaram os astros mais populares e bem pagos do período: Gracie Fields e George Formby.

Em 1931, o estúdio mudou seu nome para Associated Talking Pictures e, tal como os demais estúdios do Reino Unido, fez seus próprios filmes e alugou espaço para outras companhias produtoras. Na segunda metade dos anos trinta, David Lean trabalhou na Associated Talking Pictures como montador e Ronald Neame como cinegrafista. Em 1938, após un desentendimento com os Courtald, Dean deixou a companhia e Michael Balcon – que havia sido fundador e presidente da Gainsborough Films, diretor de produção na Gaumont British, e encarregado da produção na MGM-British -, tornou-se o novo chefe do estúdio. Na sua gestão, Balcon trouxe vários ex-colegas da Gaumont British para trabalharem juntos entre eles o ator-diretor Walter Forde e os diretores Sidney Gilliat e Robert Stevenson.

Ealing Studios nos anos 50

Michael Balcon

Ao mesmo tempo, a denominação do estúdio mudou de Associated Talking Pictures para Ealing Studios. Balcon era homem de equipe, encorajando idéias e iniciativas. Durante vinte anos em Ealing ele formou um grupo de diretores talentosos, muitos dos quais haviam sido montadores com Charles Crichton, Charles Frend, Robert Hamer, Leslie Norman e Thorold Dickinson e roteiristas como Alexander Mackendrick, Harry Watt e Basil Dearden, que formou uma longa parceria com o produtor-diretor-cenógrafo Michel Relph. Balcon também deu força para muitos novos roteiristas, inclusive T.E.B. Clarke que escreveu o roteiro de Hue and Cry/ 1947.

Alberto Cavalcanti

Em 1942, o brasileiro Alberto Cavalcanti, diretor, produtor, roteirista e diretor de arte se juntou a Balcon e introduziu a influência documentarista nos filmes de ficção. Cavalcanti fez no Estúdio Ealing, 48 Horas/ Went the Day Well?/ 1942; Champagne Charlie/ 1944, Nicholas Nickleby (na TV) / The Life and Adventures of Nicholas Nickleby / 1947. Entre os filmes produzidos no estúdio nos anos quarenta e cinquenta , distinguiram-se ainda: Johnny Frenchman/ 1945; Na Solidão da Noite/ Dead of Night/ 1945; The Loves of Joanna Godden/ 1947; Corações Aflitos/ The Captive Heart/ 1946; A Manada / TheOverlanders / 1946; Frieda/ Frieda / 1947; It Always Rains on Sunday/ 1947; Heróis Anônimos/ Against the Wind  / 1948, Sarabanda/ Saraband for Dead Lovers / 1948; Epopéia Trágica / Scott of the Antarctic/ 1948; A Lâmpada Azul / The Blue Lamp / 1950; Martírio do Silêncio / Mandy / 1950; Mar Cruel / The Cruel Sea  / 1953; A Morte de um Herói / The Ship That Died of Shame/ 1955; Justiça Final / The LongArm / 1956.

Apesar de ter oferecido ao público bons filmes de todos os gêneros, o estúdio ficou famoso pelo ciclo de comédias inteligentes, produzidas a partir do final dos anos quarenta e na década de cinquenta, que consolidaram o estilo característico do humor britânico e conservam até hoje intacto todo o seu encanto.

Para homenagear o esforço do conhecido estúdio inglês aqui estão algumas informações sobre as suas seis melhores comédias:

UM PAÍS DE ANEDOTA / PASSPORT TO PIMLICO / 1949 (84 min.)

Dir: Henry Cornelius. Rot: T. B. Clarke. Foto: Lionel Barnes. Dir. Arte: Roy Oxley. Mús: Georges Auric. Mont: Michael Truman.

No verão, em Pimlico, bairro residencial do centro de Londres, faz muito calor. Quando o merceeiro Arthur Pemberton (Stanley Holloway) tenta convencer a assembléia local a construir uma piscina e um playground em um terreno vazio, uma bomba – vestígio do conflito mundial recentemente terminado – explode, e ele descobre um tesouro medieval e também um tratado, transferindo o bairro de Pimlico ao ducado de Borgonha. Este tratado, faz dos habitantes de Pimlico cidadãos estrangeiros em território britânico e, portanto, não submetidos às leis do país. A primeira reação do grupo é acabar com o regime de restrições em que vivem. Assim rasgam seus cartões de racionamento e permanecem nos bares dançando e bebendo depois da hora regulamentar de fechamento. Legalmente, os argumentos dos Pimlicanos são irrefutáveis. Os meios diplomáticos se alarmam e o govêrno toma providências: instala barreiras aduaneiras nos limites do bairro, corta o fornecimento de água e energia elétrica, e ordena o bloqueio alimentar aos nativos de Pimlico. Em pleno metrô, a alfândega controla as entradas e saídas. Mas os próprios habitantes de outros bairros manifestam sua solidariedade, fazendo com que víveres sejam entregues aos seus novos vizinhos de fronteira. Por fim, um compromisso é encontrado: os habitantes de Pimlico “emprestarão” seu tesouro à Corôa que, em troca, lhes pagará juros.

Cena de Um País de Anedota

Um País de Anedota marca o início do período curto (1949-1955), mas admirável, durante o qual os estúdios Ealing empreenderam a tarefa de redefinir a comédia inglesa, impondo-lhe a sua marca. O filme passa uma nostalgia através da união social dos anos de guerra, lembrada afetuosamente como “the finest hour” (o melhor momento) da Inglaterra. Isto fica mais explícito em duas sequências mais para o final do filme: a primeira, em um cinejornal louvando a resistência da “pequena e corajosa Borgonha” – exatamente como a Grã- Bretanha se viu na primeira parte da Segunda Guerra Mundial – e a segunda, em um longa sequência de montagem, na qual a populacão de Londres vem em auxílio dos borgonheses assolados pela fome, arremessando-lhes víveres de carros e trens – evocando diretamente o celebrado “espírito de Dunquerque”.

Cena de Um País de Anedota

Cena de Um País de Anedota

Esta investigação do caráter britânico (ou especificamente inglês) está no âmago de Um País de Anedota.Apesar de sua resistência obstinada, os borgonheses nunca perdem de vista a sua verdadeira identidade nacional, como a frase mais memorável do filme deixa claro: “Nós sempre fomos ingleses e e sempre seremos ingleses, e é exatamente porque somos ingleses que estamos defendendo nosso direito de sermos borgonheses”.

Com um espírito de fantasia parecido com o de René Clair, de quem ele foi um colaborador (em Um Fantasma Camarada/ The Ghost Goes West), Henry Cornelius usou com inteligência todos os elementos cômicos de um assunto de total novidade, desencadeando, em um ritmo delirante, peripécias que chegam a um absurdo total. Os intérpretes ajudam muito, cada qual compondo seu tipo com autoridade.

ALEGRIA A GRANEL / WHISKY GALORE / 1949 (82 min.)

Dir: Alexander Mackendrick. Rot: Compton Mackenzie, Angus Macphail, Foto: Gerald Gibbs. Dir. Arte: Jim Morahan. Mús: Ernest Irving. Mont: Joseph Sterling.

Em 1943, em plena guerra, os habitantes de uma ilha perdida no litoral escocês, se vêem diante de uma situação terrível: não há mais whisky! E neste período de racionamento não serão as quatro garrafas permitidas pelas autoridades ao pub local que irão satisfazer as gargantas desses grandes consumidores da bebida. Então, quando vem a notícia de que o SS Cabinet Minister está afundando ao largo da ilha com seu carregamento de 50 mil caixas de whisky, a população fica em um estado de excitação próxima do delírio. Uma vasta operação de salvamento é elaborada e cabe ao capitão Waggett (Basil Radford), comandante da milícia, impedir a pilhagem. Ele avisa aos funcionários da alfândega, que vasculham a cidade, mas não encontram nada.

Cena de Alegria a Granel

Alegria a Granelfoi adaptado de um romance de Compton Mackenzie que, por sua vez se baseou na história verdadeira de um famoso incidente em 1941, no qual o SS Politician – cuja carga incluia 22 mil caixas de whisky – naufragou perto das ilhas Hébridas de Eriskay e South Ulst; dezenas de barcos de todas as ilhas vizinhas logo partiram para o local, resgatando 7 mil caixas.

Cena de Alegria a Granel

O filme é uma celebração do espírito rebelde dos ilhéus, como também uma homenagem aos poderes revigorantes do scotch, que restaura magicamente uma comunidade em profunda depressão por causa do desejo de um “pequeno trago”. Ao contrário da comédia suave de Um País de Anedota, o humor de Alegria a Granelassume às vêzes um tom mordaz às custas do pomposo burocrata Wagget, cujos esforços para frustrar a busca dos ilhéus por whisky, resulta apenas na sua própria ruina.

Cena de Alegria a Granel

Uma sequência memorável da luta dos indivíduos teimosos (e simpáticos) contra  uma autoridade mais poderosa é aquela em que os ilhéus,  avisados a tempo, de que os funcionários da alfândega irão chegar com Waggett – que os havia acionado – escondem as garrafas de whisky em todos os lugares inimagináveis entre eles dentro de um bueiro, de um saco de água quente, de uma caixa registradora e, em uma imagem final, dentro de uma cama portátil, que será ocupada por alguém com ar de inocente.

AS OITO VÍTIMAS / KIND HEARTS AND CORONETS / 1949 (106 min.)

Dir: Robert Hamer. Rot: R. Hamer, John Dighton baseado romance “Israel Rank” de Roy Horniman. Foto: Douglas Slocombe. Dir. Arte: William Kellner. Mús: Mozart. Mont: Peter Tanner.

Em 1868 na Inglaterra, às vésperas de ser executado por assassinato, Louis Mazzini (Dennis Price), duque d’Ascoyne, escreve suas memórias. Ele é descendente de uma família de nobres, cuja mãe havia sido deserdada, por ter se casado com um cantor italiano plebeu, morto logo após o seu nascimento. Sabendo que apenas oito parentes ainda vivos (Alec Guinness) o separam do honroso título nobiliárquico, Mazzini resolve eliminá-los uma a um. Ele consegue realizar seu objetivo, mas a Scotland Yard o prende, acusando-o de um crime, que ele não cometeu: a morte do marido de sua amiga de infância, Sibella (Joan Greenwood), que se tornara sua amante e ficara enciumada por ele ter se casado com Edith (Valerie Hobson), a viúva de sua primeira vítima. Julgado pelos seus pares, a Câmara dos Lordes o condena à morte. Pouco antes de sua execução, Sibella, que havia tramado tudo, lhe propõe um acordo: ela irá inocentá-lo, exibindo a carta que seu marido, arruinado, havia deixado, antes de se suicidar. Em troca, Mazzini deverá fazer desaparecer sua esposa e se casar, com ela. As memórias de Mazzini terminam assim. De manhã, o carrasco se apresenta, mas a execução é suspensa. Sibella manteve sua promessa. Porém ele percebe que esquecera o manuscrito, que relatava seus assassinatos, no interior da prisão…

 

Essa sátira social macabra – estigmatizando a aristocracia inglesa – que estabelece suas próprias leis baseadas no desprezo do gênero humano e na segregação – mistura ironia e cinismo, e é exposta em um tom sêco e dissimulado, eminentemente britânico.

O jovem arrivista, fleugmático e determinado, nos faz entrar no seu jôgo e, sem sentirmos remorso ou consciência pesada, nos tornamos seu cúmplice. No filme o crime perde o seu sentido de violência e aparece sob um manto de suavidade e “finura”. A platéia aguarda a eliminação dos d’Ascoynes com ansiedade e não pode reprimir uma gargalhada à medida que as vítimas vão sendo eliminadas.

Cena de As Oito Vítimas

São muito divertidos os meios engenhosos pelos quais Mazzini se livra dos seus parentes – sobressaindo aquele empregado na morte de Rufus d’Ascoyne, um general do exército entediante, que vive relembrando suas batalhas no seu clube. Quando um garçom lhe traz um pote com caviar, ele interrompe seu relato para observar: “Eu costumava ter muito desta coisa na Criméia. Algo que os russkies(um termo desdenhoso para se referir aos russos) fazem realmente bem”. Em seguida ele espeta a faca no pote e uma bomba escondida dentro dela explode, fazendo-o em pedacinhos.

Dennis Price no final de As Oito Vítimas

Além da boa história e dos diálogos incisivos e espirituosos, o sucesso de As Oito Vítimas deveu-se à composição múltipla de Alec Guiness, interpretando oito papéis diferentes  (inclusive o de uma solteirona sufragista), pequena proeza que o ator realizou com desenvoltura e humor bem como à atuação primorosa de Dennis Price, que encarnou com frieza o vingador intimamente ferido pelas humilhações sofridas, porque o desdém que ele sentia pelos seus familiares era incompatível com a expressão visível de qualquer sentimento de ordem afetiva.

O título do filme é derivado de um verso de Alfred Tennyson, que se tornou um provérbio inglês – Kind hearts are more than coronets-, que significa um bom coração vale mais do que os títulos de nobreza.

O MISTÉRIO DA TORRE / THE LAVENDER HILL MOB / 1951 (78 min.)

Dir: Charles Crichton. Rot: T.E.B. Clarke (premiado com o Oscar). Foto: Douglas Slocombe. Dir. Arte: William Kellner. Mús: George Auric. Mont: Seth Holt.

Há vinte anos, Henry Holland (Alec Guinness), modesto funcionário do Banco da Inglaterra, em uma rotina impressionante, controla o transporte de barras de ouro da fundição para o Banco, mas acalenta o sonho de se tornar milionário, roubando um dos carregamentos. A primeira dificuldade é a negociação das barras na própria Inglaterra. O jeito então é exportá-las, impasse que o acaso resolve, fazendo-o conhecer um fabricante de “souvenirs”, Alfred Pendlebury (Stanley Holloway), cuja especialidade são moldes de chumbo da Tôrre Eiffel, que em Paris são vendidos aos turistas. O plano é executado com o auxílio de dois ladrões profissionais, Shorty (Alfie Bass) e Lackery (Sidney James), os incidentes se multiplicam, o roubo torna-se assunto do Estado, e uma desabalada perseguição tem início. Penburry é preso, Holland consegue fugir com seis estatuetas de ouro, mas ele será apreendido um ano depois no Rio de Janeiro, onde conseguiu levar durante algum tempo a vida faustosa dos seus sonhos.

Stanley Holloway e Alec Guinness em O Mistério da Torre

Stanley Holloway e Alec Guinness em O Mistério da Torre

Filmagem de O Mistério da Torre

 

Esta comédia policial mostra a aventura de um modesto bancário que se liberta da sua rotina, utilizando sua velha fama de honestidade e sua paciência adquirida como burocrata, para praticar um roubo meticulosamente arquitetado mas, mesmo assim, sujeito ao imprevisto. É o acaso que motiva as sequências mais animadas do filme como, por exemplo, a perseguição de Holland e Pendlebury com a tremenda confusão que eles armam para a Scotland Yard, utilzando o rádio (uma sátira irreverente à polícia inglesa) ou a descida vertiginosa da Tôrre Eiffel pelas escadas em espiral empreendida pelos dois principais membros do bando, para impedir que um grupo de colegiais leve, de volta à Inglaterra, a “evidência” do seu malfeito.

Cena de O Mistério da Torre

Outro momento muito engraçado com um notável sentido de sátira ocorre quando Pendlebury e Holland resolvem embarcar apressadamente da França para a Inglaterra e enfrentam cômicamente uma série de exigências aduaneiras. A visita ao colégio também arranca boas risadas do público, notadamente quando a aluna gorducha insiste em ficar com a sua tôrre apesar das propostas de “propina” por parte dos dois ladrões.

Alec Guinees e Audrey Hepburn (em uma ponta) em O Mistério da Torre

Alec Guiness está magnífico no papel do humilde e aparentemente inofensivo fiscal do banco que se transforma no chefe brilhante e eficiente da quadrilha de Lavander Hill e Stanley Holloway é um coadjuvante à sua altura em termos interpretativos.

O HOMEM DO TERNO BRANCO / THE MAN IN THE WHITE SUIT / 1951 (85 min.)                                                                                                                           Dir: Alexander Mackendrick. Rot: Roger MacDougall, A. Mackendrick, John Dighton baseado peça de MacDougall. Foto: Douglas Slocombe. Dir. Arte: Jim Morahan, Mús: Benjamin Frankel. Mont: Bernard Gribble.

Sidney Stratton (Alec Guinness), servente do laboratório de pesquisa de uma fábrica textil, mas formado em química, tem uma idéia-fixa, na qual trabalha clandestinamente – a invenção de um tecido que jamais suja ou rasga. Após várias peripécias, Stratton conclui com êxito suas pesquisas. O fio indestrutível é triunfantemente exbido a Mr. Birnley (Cecil Parker), o dono da fábrica, mas o herói se esquecera de que o objetivo da indústria não é fabricar senão produtos que tenham de ser periodicamente substituidos. Tendo à frente o poderoso (e decrépito) Sir John Kierlaw (Ernest Thesiger), os grandes industriais exigem que Stratton lhes dê a fórmula, que jamais será utilizada e os sindicatos operários, com mêdo do desemprêgo, desejam a mesma coisa. Capital e Trabalho se unem para perseguir o inventor intransigente.

Cena de O Homem do Terno Branco

Esta história tragicômica mostra bem a cupidez dos patrões e o egoismo com que enfrentam qualquer progresso que não resulte em lucros e o egoismo basicamente igual dos operários, que vêem no progresso a alteração de seu “status quo” e, por isso, se reunem aos donos da fábrica para combater o invento revolucionário. Há uma cena, em que o inventor, perseguido nas ruas pelos Rolls-Royces dos patrões em pânico e por seus colegas de fábricas enfurecidos, pode contar com o auxílio de uma criança (que despista os perseguidores), mas não com o auxílio de uma velhinha de uma casa de cômodos, pois ela percebe que o tecido não sujável e indestrutível vai privá-la de seu meio de vida – a lavagem de roupa.

Alec Guinness em O Homem do Terno Branco

O filme faz uma crítica ácida tanto da empresa como da mão de obra sindicalizada e, como contraste, apoia e avaliza o espírito individualista do cidadão médio. Vestindo o imaculável terno branco feito com o seu tecido prodigioso, que brilha na obscuridade, Stratton parece um “cavaleiro andante, iluminando seu caminho pelo mundo” como define Daphne (Joan Greenwood), a filha do industrial – a certa altura da narrativa vemos uma imagem dele lutando com uma tampa de uma lata de lixo como se fosse um escudo. O terno evidentemente simboliza pureza, inocência, e a verdade desinteressada da ciência.

Cena de O Homem do Terno Branco

Cena de O Homem do Terno Branco

Alec Guinness e Joan Greenwood em O Homem do Terno Branco

O diretor soube utilizar todos os recursos da técnica, inclusive o som – o barulho  do complicado aparelho do inventor que nós ouvimos como leitmotiv ao longo de todo o filme, exprime às mil maravilhas a marcha inexorável e angustiante do progresso, e produz um efeito cômico irresístivel. No final, a multidão ataca o homem do terno branco, e a estrutura do tecido – para alegria de todos – subitamente se desintegra, deixando-o de cueca, humilhado. Porém, na cena derradeira do filme, quando Stratton se afasta da câmera, surge a música-tema associada ao aparelho barulhento do inventor, sugerindo que talvez ele consiga superar o problema da instabilidade de sua roupa e vai começar tudo de novo.

QUINTETO DA MORTE / THE LADYKILLERS / 1955 (97 min.)

Dir: Alexander Mackendrick. Rot: Willliam Rose. Foto: Otto Heller em Technicolor. Dir. Arte: Jim Morahan. Mús: Tristram Cary. Mont: Jack Harris,

Mrs. Wilberforce (Katie Johnson), velhinha cândida e bondosa, hospeda no seu sobrado antigo em Londres o “professor” Marcus (Alec Guinness), figura estranha e dentuça com testa larga e cabelos desgrenhados, que se diz músico, membro de um quarteto de cordas, e obtém permissão para ensaiar (invariavelmente o minueto de Bocherini) em seus aposentos com os amigos. Os outros “músicos” são: One Round, brutamontes de voz surda com cara de pugilista (Danny Green); Claude, o falso “Major” Courtney (Cecil Parker), gorducho bigodudo com um sorriso nervoso; Harry (Peter Sellers), rapaz meio desastrado com aparência de delinquente juvenil e Louis (Herbert Lom), sujeito com pinta de assassino profissional. Marcus expõe aos companheiros os planos de um roubo, que lhes renderá 60 mil libras. O assalto é bem sucedido e os cinco bandidos pedem para a velha apanhar a mala com o produto do roubo, que eles esconderam na estação de King’s Cross, pois ela é a última pessoa no mundo capaz de atrair suspeitas da polícia. Mrs. Wilbeforce concorda, acreditando que se trata de uma encomenda do interior para o seu hóspede. Quando finalmente ela percebe com que gente está metida, os cinco delinquentes procuram intimidá-la, dizendo-lhe que, para todos os efeitos, ela é cúmplice do assalto. Porém o retrato austero do seu falecido marido, um capitão da marinha mercante que afundou com seu barco, inspira Mrs. Wilberforce: ela e o “quinteto” comparecerão à delegacia para devolver o dinheiro. Diante disso, os larápios resolvem eliminá-la. Os cinco tiram a sorte, mas quem executará a tarefa? As discussões conduzem a brigas e os cinco bandidos acabam por se matarem entre si (apenas o último morre acidentamente).  Ao contar sua história para a polícia, Mrs. Wilberforce é considerada doida e aconselhada a ficar com a grana.

A Lady e os Killers

 

Esta comédia criminal macabro-satírica, que fechou com chave de ouro o ciclo do estúdio Ealing, contém vários elementos noir (tipos sinistros e inquietantes, passos e silhuetas ameaçadoras na noite, assalto a carro blindado, iluminação em claro-escuro (apesar do uso da cor), uma série de mortes, e a presença de uma mulher fatal (embora muito peculiar); mas tais elementos são usados para se obter efeitos cômicos da melhor qualidade.

Cena de Quinteto da Morte

Abundante em achados humorísticos  (v. g. a sequência do chá das velhas senhoras ao qual os criminosos são obrigados a participar; a mala que contém o produto do roubo transportada até a casa de Mrs. Wilberforce por dois policiais, pois ela fôra parar na delegacia por ter descido de um taxi a fim de defender um cavalo da irritação de um verdureiro, provocando um conflito, tratado em tom de pastelão; o enterro do “Major”, seu corpo colocado dentro de um carrinho de mão, empurrado pelo brutamontes e acompanhado pelo cérebro do grupo com se fosse um padre; a morte do “professor” Marcus atingido pelo sinal ferroviário e caindo dentro de um vagão), possuindo em cada personagem um tipo curioso e em cada ator um especialista em composição (sobressaindo naturalmente a interpretação deliciosa de Katie Johnson – então com 87 anos), o espetáculo é inusitado e imensamente divertido.           .

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MAX OPHULS II

Em 1950 Ophüls encerrou sua fase americana e retornou à França, onde realizou seus últimos quatro filmes: Conflitos de Amor/ La Ronde / 1950, O Prazer/ Le Plaisir / 1952; Desejos Proibidos / Madame D …/ 1953 e Lola Montez / Lola Montès / 1955.

Anton Walbrook, Danielle Darrieux e Daniel Gélin em Conflitos de Amor

Simone Simon e Serge Reggiani em Conflitos de Amor

Odette Joyeux e Jean-Louis Barrault em Conflitos de Amor

Em Conflitos de Amor (Rot: Jacques Natanson e M. Ophüls baseado livremente na peça “Reigen” de Arthur Schnitzler), na Viena de 1900, o narrador (Anton Walbrook), que faz a Roda do Amor girar como um carrossel, apresenta os amores da prostituta Léocadie (Simone Signoret) com o soldado Franz (Serge Reggiani). Depois, Franz seduzindo a empregadinha Marie (Simone Simon), que iniciará no sexo o jovem de boa família, Alfred (Daniel Gélin). Alfred, por sua vez, faz sucumbir a virtude de Emma (Danielle Darrieux), uma mulher casada. Emma se reune com seu marido Charles (Fernand Gravey) no seu leito conjugal e falam sobre Stendhal. Charles busca uma aventura amorosa com a costureirinha Anna (Odette Joyeux), que é uma presa fácil do poeta-dramaturgo Robert Kuhlenkampf (Jean-Louis Barrault), que a abandona, para se encontrar com a atriz (Isa Miranda) que, por sua vez, se entregará ao conde (Gérard Philie), blasé e cerimonioso. Ele não voltará para um segundo encontro, passando a noite com Léocadie. E assim a Roda termina, onde havia começado.

Daniel Gélin e Danielle Darrieux em Conflitos de Amor

Fernand Gravey e Danielle Darrieux em Conflitos de Amor

Max Ophüls dirige Danielle Darrieux em Conflitos do Amor

Gérard Philipe e Simone Signoret em Conflitos de Amor

Simone Signoret e Serge Reggiani em Conflitos de Amor

A idéia do narrador omnisciente que não somente introduz os espectadores em cada história, mas assume pequenos papéis e intervém durante a transição de um episódio para outro é original e, algumas vêzes, humorística (v. g, a cena em que o mecanismo que movimenta o carrossel para, quando Alfred falha momentaneamente durante o ato sexual, e depois volta a funcionar, quando ele se recupera do fracasso copulativo ou quando o meneur du jeu corta um pedaço de celulóide, censurando um momento mais ousado da trama). Entre cada um dos encontros amorosos,  volta a imagem insólita do carrossel e a melodia de uma valsa  langorosa (Oscar Straus / Louis Ducreux) em perfeita harmonia com o visual ophulsiano, como sempre apoiado em suntuosos interiores (Jean D’Eaubonne) e na movimentação da câmera (Christian Matras), destacando-se o longo traveling de abertura que permite ao narrador mudar de roupa para se tornar um personagem de 1900, atravessar um palco de teatro que se transforma em um estúdio de cinema,  cantar “tourne, tourne,  mes personnages … “ e começar a animar a sarabanda  de relacionamentos efêmeros em busca do prazer sensual. Pena que haja um excesso de dialogação em algumas situações, tornando-as um tanto monótonas.

O Prazer (Rot: Jacques Natanson, M. Ophüls) é baseado em três contos de Guy de Maupassant: Le Masque, La Maison Tellier e Le Modèle. Em Le Masque (A Máscara), um homem mascarado, elegantemente vestido, vai ao Palais de la Danse, e demonstra grande agilidade, antes de cair no salão, esgotado. Tiram-lhe a máscara, trata-se de um velho (Jean Galland). Um médico (Claude Dauphin) o acode e o leva para casa, onde sua esposa (Gaby Morlay), resignada, lhe explica que seu marido, ex-cabelereiro outrora muito estimado pelas mulheres, continua comparecendo nos bailes, na tentativa de recuperar o frescor de sua juventude. La Maison Tellier  (A Casa Tellier) é um bordel frequentado tanto por marujos como por “respeitáveis senhores”. Uma noite, os frequentadores do local encontram a porta fechada. Os burguêses ficam desolados e os homens do mar brigam entre si. A cafetina Madame Julia (Madeleine Renaud) e suas “pensionistas” partiram para uma aldeia da Normandia, a fim de assistirem à primeira comunhão da filha do irmão de Julia, o carpinteiro Joseph Rivet (Jean Gabin). Na igreja, comovidas, elas vertem lágrimas nostálgicas de sua pureza perdida e, por contágio, fazem chorar todos os presentes.  No caminho de volta, elas colhem flores nos campos para enfeitar a Maison Tellier e, quanto a Rivet, ele fica atraído particularmente por Madame Rosa (Danielle Darrieux), uma das “pensionistas”. Em Le Modèle (A Modêlo), Jean (Daniel Gélin), um jovem pintor, apaixona-se por uma de suas modêlos, Joséphine (Simone Simon). Quando ele se cansa dela e tenta romper o relacionamento, a jovem se joga pela janela do ateliê. O remorso obrigará Jean a cuidar de Joséphine, imobilizada em uma cadeira de rodas, por toda a sua vida. Esta última história é contada, tal como as duas precedentes, por um narrador (Jean Servais) que desta vez aparece como um amigo de Jean.

Jean Galland em O Prazer

Jean Gabin e Danielle Darrieux em O Prazer

Simone Simon e Daniel Gélin em O Prazer

Para Ophüls, a adaptação (livre) dos três contos de Maupassant serviu de pretexto para um exercício diretorial de uma virtuosidade deslumbrante (travelings rodopiantes no salão de dança e volantes em uma visita à Mansão Tellier vista unicamente do exterior; interposição de objetos e partes do cenários entre a câmera e os personagens), e para uma reflexão sobre o prazer (a futilidade do prazer evocada melancolicamente em A Máscara; sua gravidade, mostrada com tristeza mórbida em A Modelo, e sua inocência e simplicidade,  apresentada com ironia e alegria no parêntese bucólico de A Casa Tellier) e a felicidade ( “a felicidade não é alegre”, conclui o narrador). Armam-se assim cenas inesquecíveis: o mau humor dos clientes do lupanar; a viagem de trem e a intrusão de Julien Ledentu (Pierre Brasseur), um caixeiro viajante excitado pela prova das ligas; as lágrimas de Rosa e de suas companheiras na igreja; o lirismo no campo florido, digno de Jean Renoir; o agradecimento murmurado por Madame Rosa a Rivet, que se desculpa timidamente por haver faltado com o respeito; o silêncio da noite campestre que não deixa as moças dormirem; Rosa e um menino que tem igualmente medo do escuro, adormecendo tranquilos nos braços um do outro; o contraponto entre os prazeres mundanos e os rústicos, com sua natureza, e a pureza da gente rural.

Em Desejos Proibidos  (Rot: M. Ophüls, Marcel Achard, Annette Wademant baseado no romance homônimo ade Louise de Vilmorin), para pagar suas dívidas, a Condessa de … (Danielle Darrieux) resolve se desfazer de um par de brincos de diamantes em forma de coração, presente de casamento de seu marido, o Conde André de … (Charles Boyer). Vende-os ao joalheiro da família (Jean Debucourt), rogando sigilo, e simula tê-los perdido na Ópera. O zêlo do administrador do teatro conduz o caso à polícia e, em consequência, aos jornais. Preocupado com a situação, o joalheiro leva as jóias ao Conde que torna a comprá-los, para presenteá-los agora a uma amante (Lia de Leo), que está remetendo para Constantinopla … sem bilhete de volta. Lá os brincos são vendidos para alimentar a roleta e comprados por um diplomata italiano, Barão Frabrizio Donati (Vittorio de Sica). Quando Donati assume seu novo pôsto em Paris, ele fica encantado pela Condessa, e quando o Conde (que também é general) parte para manobras militares, o Barão tem oportunidade de cortejá-la e lhe oferecer os brincos. Habituado e lisongeado com a atração que a mulher desperta nos salões, o Conde não leva a sério o flerte. O mesmo acontece com a mulher e o diplomata, até descobrirem que se amam. Ela tenta esquecê-lo, viajando. mas em vão. O barão lhe escreve sem parar, e ela acaba se encontrando com ele. A condessa se embaraça nas suas mentiras para fazer crer a seu marido que reencontrou seus brincos. O general a obriga a dar os brincos para uma sobrinha, os revende, e a Condessa os compra, considerando-os agora como relíquias. Furioso, o general desafia o rival para um duelo. A Condessa, que havia ofertado os brincos para o altar da Virgem para salvar o barão, corre para impedir o combate mas, ao ouvir o primeiro tiro (que, presumivelmente, matou o diplomata), sofre um ataque cardíaco e morre.

Dannielle Darrieux em Desejos proibidos

Charles Boyer e Danielle Darrieux em Desejos Proibidos

Danielle Darrieux e Vittorio De Sica em Desejos Proibidos

A história – que poderia ser um vaudeville agradável, mas se torna um drama com observações sarcásticas sobre a Belle Époque – é organizada engenhosamente em torno da circulação de um par de pedras preciosas e esta circularidade é tratada no mesmo estilo barroco que se tornou a marca pessoal de Ophüls. Grande requinte nos cenários (Jean D’Eaubonne) e figurinos (Georges Annenkov, Rosine Delamare), ângulos e enquadramentos bem estudados (Christian Matras), diálogos nos quais transparece o espírito fino de Marcel Achard, bela partitura (Oscar Straus / George Van Parys), interpretação insubstituível do trio central, despontando porém Danielle Darrieux, que soube criar com inteligência a personagem fútil e frívola de Madame de …. , completam o quadro, e confirmam que a arte do cineasta vienense atingiu o seu apogeu.

No seu lançamento, Lola Montès (Rot: Cecil Saint-Laurent, M. Ophüls, Annette Vademan baseado no romance de Saint-Laurent “La Vie Extraordinaire de Lola Montès”) foi mal recebido pelo público, a tal ponto que os produtores o retiraram de cartaz, para ser apresentado de novo  com uma redução considerável da metragem e uma montagem que tornava a narrativa linear, retirando exatamente o que melhor caracterizava a originalidade da técnica empregada pelo diretor. De modo que ele só foi visto na edição original, com os flash-backs, muito mais tarde.

Em 1880, Maria Dolorès Porriz y Montez, dançarina e cortesã conhecida como Lola Montès (Martine Carol), é exibida em um circo gigantesco em New Orleans, onde Monsieur Loyal, um mestre de cerimônias (Peter Ustinov), com a ajuda da trupe, ilustra passagens de sua vida, e os espectadores podem interrogá-la sobre seu passado. Cinco retrospectos de lembranças de Lola pontuam a representação. 1. Na Itália, Lola termina sua aventura com Franz Lizt (Will Quadflieg), que se tornara tediosa; 2. Em Paris, para se esquivar de um casamento por interêsse com um barão velho e rico, Lola se entrega, e depois se casa, com o tenente Thomas James (Ivan Desny), o amante de sua mãe. 3. Na Escócia, Lola se liberta do marido alcoólatra e brutal. 4. Em Nice, Lola interrompe sua dança para esbofetear o maestro Pirotto (Claude Pinoteau), seu amante, após ter descoberto que ele era casado. Em seguida, perante toda a platéia, ela entrega à mulher dele (Jacqueline Canterelle) o bracelete que o músico lhe dera. 5. Na Baviera, onde foi concorrer a um concurso de Ópera, ela se torna amante do Rei Ludwig I (Anton Walbrook), e depois é obrigada a deixar o país, porque sua presença desagradou a população, causando uma revolta. Na sua fuga, Lola é protegida por um estudante (Oskar Werner), que se propõe a desposá-la; porém ela recusa, porque um futuro menos pacífico, mais corajoso, mais digno dela, a tenta: o circo.  Doente, em plena decadência, Lola executa todas as noites um salto mortal e, após ser encerrada em uma gaiola dourada, fica exposta aos espectadores, que pagam um dólar para beijar sua mão.

Peter Ustinov e Martine Carol em Lola Montès

Anton Walbrook, Martine Carol e Max Ophüls na filmagem de Lola Montès

Martine Carol e Oskar Werner em Lola Montès

Anton Walbrook e Martine Carol em Lola Montès

Na versão restaurada de Lola Montès, pode-se perceber a ambição formal do cineasta, como sempre fazendo a câmera (Christian Matras) acompanhar a marcha dos personagens ou se movimentar eufóricamente, para nos mostrar o reverso de um espetáculo, aquilo que ninguém viu: o rosto interior de Lola, sua intimidade e, ao mesmo tempo, denunciar a exploração da decadência de uma mulher fatal lendária em benefício da curiosidade indecente dos espectadores, que lhe fazem perguntas indiscretas. A crítica de Ophüls estava adiante de seu tempo e foi sublinhada por uma encenação onde o seu rebuscamento estético chegou a um ponto culminante, servido pelas cores berrantes e pelo CinemaScope.

Martine Carol em Lola Montès

Cena de Lola Montès

As cenas de circo são todas memoráveis com seus motivos purpúreos e dourados que sugerem esplendor e suntuosidade, mas cuja acumulação revela sua natureza opressiva e mórbida, pois Lola é de fato uma prisioneira desse mundo, uma heroína despossuída de si mesma, fatigada, debilitada, e quase em agonia.  Já os retrospectosque fazem reviver em desordem alguns momentos de uma existência tumultuada, eles são tratados mais convencionalmente e, por contraste, em cores mais suaves. Os cenários de Jean d’Eaubonne e o vestuário de Annenkov e Marcel Escoffier (para Martine Carol) também contribuem para o delírio barroco ophülsiano. Entretanto, o brilho plástico e toda aquela algazarra permanente no picadeiro em  torno de uma figura imóvel que mal se sustenta em pé e se exprime por uma voz inaudível, não foi capaz de disfarçar algumas lentidões no ritmo da narrativa. Martine Carol, super estrela e símbolo erótico do cinema francês na época, era uma atriz de recursos limitados, mas se saiu muito bem, principalmente nas sequências circenses compondo sóbriamente uma máscara de morta-viva, enquanto Monsieur Loyal explorava  comercialmente o relato de sua vida escandalosa.

O último filme Max Ophüls, exibido no Brasil como Lola Montez, talvez tenha sido um dos motivos que apressaram sua morte em Hamburgo aos 54 anos de idade, no dia 26 de marco de 1957, vitimado por uma doença cardíaca, de que sofria há muito tempo, dois anos após tentar desesperadamente preservar a integridade de sua obra.

MAX OPHULS I

Ele foi um exímio narrador de histórias de amor, que confirmaram sua sensibilidade romântica, sua identificação com a consciência e os apuros femininos, sua preferência por temas relacionados com a Viena do final do século, e seu gôsto pelo estilo barroco. A chave de sua brilhante encenação era o domínio do plano-sequência, especialmente da câmera continuamente em movimento e a luxúria decorativa, ambos usados sempre com notável compreensão cinematográfica.

Max Ophuls

Max (Maximilian) Ophüls nasceu em Saarbrücken, Alemanha, filho de Leopold Oppenheimer, fabricante de roupas e dono de várias lojas no país e de sua esposa Helen. Quando iniciou sua carreira teatral, Max adotou o sobrenome de Ophüls, para não criar dificuldades para os pais, porque sua família, muito respeitada no âmbito da indústria têxtil, desaprovava seu desejo ardente pelo teatro.

Ele estreou no palco em 1919 e atuou no Teatro Aachen de 1921 a 1923 porém, decepcionado com a carreira de ator, abandonou o tablado pela encenação, tornando-se o primeiro diretor do teatro da cidade de Dortmund. Em 1924, dedicou-se à produção teatral e se tornou diretor criativo do Bürgtheater de Viena. Em 1926, casou-se com a atriz Hilde Wall, com quem teve um filho, Marcel, o futuro documentarista de Le Chagrin et la Pitié/ 1971.  Em 1929, com cerca de duzentas peças no seu currículo, Ophüls iniciou sua trajetória cinematográfica como assistente de Anatole Litvak na UFA, em Berlim.

Em 1931, no período que viu a emergência do cinema sonoro, Ophüls dirigiu seu primeiro filme, a comédia curta Dann schon lieber Lebertran (Eu prefiro óleo de fígado de bacalhau), seguindo-se seu primeiro longa-metragem, Die verliebte Firma / 1932 (A Companhia Apaixonada), que gira em torno da filmagem de um musical em uma idílica aldeia alpina: quando a estrela temperamental (Anny Ahlers) abandona a produção, é substituida por uma jovem funcionária do correio local (Lien Deyers) e os rapazes da equipe se apaixonam por ela, inclusive o diretor da companhia produtora (Gustav Frölich). No mesmo ano,Ophüls realizou Die verkaufte Braut (A Noiva Vendida) em cuja trama, passada na Bohemia no século dezenove, o condutor de carruagem Hans (Willy Domgraf-Fassbaender) se apaixona pela filha do prefeito Maria (Jarmila Novotna), que está prometida para Wenzel (Paul Kemp), filho de um fazendeiro rico que, por sua vez, apaixonado por Esmeralda (Annemarie Sörensen), filha do diretor do circo. São duas comédias musicais muito divertidas, a segunda aproximando-se mais da opereta (pois foi baseada em uma composição de Smetana), e em ambas já se vislumbra a sensibilidade romântica do diretor, sua mise-en-scènefrenética, e sua capacidade de construir com exatidão os ambientes nos quais transcorre a ação.

Lien Deyers e Heinz Rühmann em Lachende erben

Conheço apenas um trecho de Lachende erben / 1933 (Herdeiros Sorridentes), a terceira comédia que Ophüls fez na UFA. É a história de um rapaz, Peter Frank (Heinz Rühman), que herda do tio uma vinícula, sob a condição de que não poderá consumir bebida alcoólica durante um mês. Como Peter não tem a reputação de ser sóbrio, as tentações se multiplicam, e ainda por cima ele se apaixona pela filha (Lien Deyers) de seu principal competidor. Nas cenas que pude ver, não identifiquei a marca do estilo ophulsiano, porém elas prometiam uma boa diversão.

Magda Schneider e Wolfgang Liebeneiner em Uma História de Amor

O último filme realizado por Ophüls na Alemanha, Uma História de Amor Liebelei / 1933, adaptação (com algumas modificações da obra original, entre elas a  exposição da futilidade e estupidez da mentalidade teutônica do “código de honra”) de uma peça de Arthur Schnitzler, é um melodrama romântico melancólico e cruel, pondo em cena dois tenentes da cavalaria do exército austríaco do imperador Francisco José, que encontram o amor com duas jovens simples e sinceras. Fritz Lobheimer (Wolfgang Liebeneiner) está vivendo um romance adulterino com a Baronesa Eggersdorff  (Olga Tschechowa), mas se apaixona pela doce e pura, Christine Weiring (Magda Schneider), filha de um modesto músico de orquestra da Ópera,  (Paul Hörbinger) enquanto seu colega Theo Berg (Willi Eichbwerger), namora Mizzi Schlager (Luise Ullrich), amiga de Christine. Quando o Barão (Gustaf Gründgens) descobre a traição da esposa, desafia Fritz para um duelo. O Barão é o primeiro a atirar e ele mata Fritz. Quando Christine é informada de sua morte, ela se joga de uma janela.

Ophüls descreve, – com a câmera flutuante de Franz Planner que às vêzes omite tanto quanto mostra (v. g. Fritz morrendo no duelo; somente a janela aberta a indicar o salto de Christine para a morte) ou deixa planos vazios no início ou no fim de uma cena -, a passagem do sonho de amor da jovem vienense para um desenlace trágico, conseguindo fazer com que os próprios personagens transmitam suas emoções, principalmente Christine. A interpretação de Magda Schneider chega a ser profundamente tocante quando ela, em um longo close-upsob o fundo musical da Quinta Sinfonia de Beethoven, expressa seu desespêro – sem chorar nem sofrer um colapso nervoso -, ao ouvir a notícia devastadora de que Fritz perdeu sua vida por causa de outra mulher. Outra atuação marcante é a de Gustaf Gründgens, usando apenas seus gestos e olhares frios, exprimindo todo seu ódio e sua raiva pela fumaça de seu cigarro e pelas suas corridas – perseguidas velozmente pela câmera – atrás do amante de sua mulher.

Os nomes dos judeus Arthur Schnitzler e Max Ophüls foram retirados dos créditos e foi feita uma versão francêsa com Magda Schneider e Wolfgang Liebeneiner com os atores francêses Simone Héllard (no papel de Mizzi), Georges Rigaud (Theo) e Abel Tarride (Weiring). Em 1933, prevendo a ascendência nazista, Ophüls foi para a França onde, de 1934 a 1940, fêz sete filmes, intercalados entre uma realização na Itália e outra na Holanda. Em 1938, ele adquiriu a cidadania francêsa. Menciono em seguida os filmes francêses, dos quais vi apenas Yoshiwara, Le Roman de Werthere De Mayerling a Sarajevo.

Prisioneiro de uma Mulher/ On a Volé un Homme / 1934 (Rot: René Pujol, Hans Wilhelm), drama romântico no qual um jovem banqueiro, Jean de Lafaye (Henri Garat), está prestes a concluir um negócio que arruinará seus concorrentes. Estes o sequestram e o levam para uma casa de campo, onde ele fica sob a guarda de uma linda aventureira (Lili Damita). O banqueiro e sua carcereira se apaixonam e conseguem escapar e ajustar contas com os que tramaram contra ele.

Divine / 1935 (Rot: Colette baseado na sua peça “L ‘envers du Music Hall”). Adapt: M. Ophüls, Jean-Georges Aurio), melodrama focalizando uma jovem do interior, Ludivine Jarisse (Simone Berriau) que, convidada por sua amiga Roberte (Yvette Lebon), atriz em um music hall de Paris, aceita substituí-la, e se torna uma vedeta no L‘Empyrée sob o nome de Divine. Um de seus colegas tenta tirar vantagem de sua ingenuidade, mas quando ela resiste, ele a envolve em um negócio de entorpecentes, do qual ela se liberta graças ao amor de Antonin, um honesto e formoso leiteiro (Georges Rigaud). Ele lhe promete casamento e ela abandona o palco, para começar uma nova vida na região de onde veio.

Georges Vitray e Simone Berriau em La Tendre Ennemie

La Tendre Enemie / 1936 (Rot: Curt Alexander, M. Ophüls baseado na peça L‘Ennemie” de André-Paul Antoine), comédia romântico-fantástica com uma história original, cáustica e irônica, impulsionada por três fantasmas, que aparecem na festa de noivado de Line, (Jacqueline Daix), filha de Annette (Simone Berriau), a mulher que todos amaram no passado. Os três – um deles, Dupont (Georges Vitray) é o pai da noiva e os outros dois são o primeiro namorado da mãe dela, um marinheiro (Lucien Nat) e o seu ex- amante, um domador de leões (Marc Valbel) – relembram como seus relacionamentos com a “inimiga” (ela mesma vítima de um casamento arranjado)  arruinaram suas vida, e intervêm junto a Annette, a fim de que ela impeça o casamento. Sensível às preces que lhe dirigem essas testemunhas do seu passado, a velha senhora cede, e sua filha poderá esposar o intrépido piloto, que escolheu para marido.

Yoshiwara / Yoshiwara / 1937 (Rot: Arnold Lipp, W. Wilhelm, Dapoigny, M. Ophüls baseado no romance de Maurice Dekobra), drama sobre amor interracial com um pano de fundo de espionagem cuja ação transcorre em 1860 quando, após a morte de seu pai, que cometera o suicídio ao verificar que estava falido, Kohana (Michiko Tanaka) vai para Yoshiwara, o bairro da prostituição de Tokyo, para ser geisha. Neste local, Serge Polenoff (Pierre Richard-Willm), oficial da Marinha Russa, portador de documentos secretos do estado-maior japonês, apaixona-se por ela, e entra em conflito com um condutor de riquixá Yasamo (Sessue Hayakawa), que também a ama. O plano de Polenoff de levar Kohana consigo para São Petersburgo é frustrado quando Yasamo o denúncia ao serviço da contra-espionagem do país. Atacado e ferido, Polenoff entrega os documentos para Kohana, pedindo-lhe que o faça chegar a qualquer um de seus companheiros de farda. Mas Kohana é presa como cúmplice de Polenoff. Desesperado, Yosama avisa a Polenoff de que ela vai ser condenada à morte, e os dois partem para tentar salvá-la; porém, Polenoff morre em razão dos ferimentos enquanto Kohana é executada.

Michiko Tanaka e Pierre Richard-Willm em Yoshiwara

Ophüls fez o que pôde para disfarçar a falta de valores de produção, que prejudicou o seu cuidado especial para com os adornos cenográficos e talvez tenha contribuído para paralizar a sua câmera deambulatória; porém mesmo assim, ele conseguiu dar um sôpro melodramático e criar alguns toques mágicos nessa história de amor irrealizável, como naquela cena em que Polenoff expõe os seus sonhos de futuro e as maravilhas do mundo ocidental para a sua bela geisha.

Pierre Richard-Willm e Annie Verney em Le Roman de Werther

Le Roman de Werther / 1938 (Prod: Nero-Film (Seymour Nebenzal). Rot: Hans Wilhelm. Adapt: H. Wilhelm, M. Ophüls), baseado em “Leiden des jungen Werthers”, romance de Johan Wolfgang von Goethe), drama romântico sobre o amor impossível de Werther (Pierre Richard-Willm), jovem poeta e músico que chega em Walheim, na Alemanha, para assumir o posto de referendário no Palácio de Justiça local e Charlotte (Annie Vernay), que está prometida ao juiz Albert (Jean Galland), superior hierárquico de Werther. Quando Werther vem a saber disso, ele passa as noites no cabaré embriagando-se e se entrega a diversas extravagâncias, que suscitam a reprovação de Albert. Werther escreve uma carta para Charlotte, contendo um apelo desesperado. Em vez de responder, Charlotte vai se confessar (“Eu não mentí e não disse a verdade”, diz ela ao padre, referindo-se ao fato de não ter dito logo a Werther que estava noiva de Albert). Por ocasião de uma discussão profissional a respeito de um assassino que matou por amor, Albert, que desconfia de algo, ordena que Werther peça demissão. Uma noite, Werther vai para o lugar no campo em que ele encontrara Charlotte, e se mata com um tiro de pistola.

Ophüls consegue traduzir fielmente um romance epistolar em termos de cinema, sem torná-lo teatral, usando sua inventividade técnica para mantê-lo sempre interessante, até o desenlace trágico, pois na sociedade paternalista na qual Charlotte vive, sempre existe um limite para a paixão. A cena mais bonita é a do pedido de casamento que Werther faz a Charlotte diante de uma bela paisagem campestre e ela abaixa a cabeça, abraçando um buquê de flores. Aquele momento em que Charlotte finalmente revela a Werther que está comprometida com outro também está carregada de muita emoção. O cineasta não usa tanto os seus movimentos de câmera extravagantes, preferindo a sobreposição (v. g. dos sinos da igreja) e a elipse (v. g. não vemos a morte de Werther, somente seu cavalo, e ouvimos o tiro).

Georges Rigaud e, Edwige Feuillère em Sans Lendemain

Sans Lendemain / 1939 (Prod: Ciné-Alliance (Gregor Rabinovitch). Rot: Hans Wilhelm. Adapt: H. Wilhelm, Jacot, Curt Alexander, M. Ophüls), melodrama tendo como figura central, Evelyn Morin (Edwige Feuillère), dançarina em uma boate. Seu marido, aventureiro sem escrúpulos, abandonou-a friamente, deixando-a com um monte de dívidas e um filho de dez anos, que ela tenta educar como pode. O acaso a faz reencontrar um antigo amor, Dr. Georges Brandon (Georges Rigaud), agora um médico canadense de prestígio, ainda apaixonado, por ela. Para dissimular sua decadência, Evelyn pede dinheiro emprestado, e passa alguns dias na companhia de Brandon como uma mulher respeitável; porém, uma imprudência de seu filho a trai.  Decidida a se redimir, ela confia a guarda do filho ao generoso amigo, que retorna para o Canadá, prometendo juntar-se a eles brevemente. Depois, desaparece no nevoeiro.

Edwige Feuillère e John Lodge em De Mayerling a Sarajevo

De Mayerling a Sarajevo / De Mayerling à Sarajevo / 1940 (Prod: BUP e Eugène Tucherer. Rot: Carl Zuckmayer. Adapt: Curt Alexander, Marcelle Maurette, Jacques Natanson, André-Paul Antoine, M. Ophüls), drama histórico versando sobre um amor que terminou em tragédia. Franz Ferdinand (John Lodge) herdeiro do Império Austro-Húngaro, apaixona-se pela condessa Sophie Chotek (Edwige Feuillère). Ele já é um problema para a côrte por causa de suas idéias progressistas e esse caso de amor não é bem visto pela Corôa, que permite a união, mas impõe condições: um casamento morganático e proibição de desfrutar de quaisquer privilégios na côrte. O imperador ainda neutraliza Franz, nomeando-o inspetor geral do exército e enviando-o para longe do lar. Em junho de 1944, temendo por sua segurança, Sophie pede permissão para acompanhar Franz a Sarajevo; de acôrdo com o protocolo, nenhuma tropa do exército deve estar a serviço de Franz enquanto ela estiver presente. Um assassino ataca. Suas mortes em 28 de junho de 1914 acendem a faísca para a Primeira Guerra Mundial.

Ophüls apresenta uma visão nostálgica do fim do Império Austro-Húngaro, justapondo um romance pessoal com a história política, pois tanto a paixão do casal como os ideais avançados de Ferdinand são igualmente oprimidos pelas regras da sociedade repressora. O amor triunfa sobre a ordem e o dever, mas vem a ser derrotado pelo destino. Um bom exemplo disso, é a cena em que Sophie é barrada no salão de baile, o melhor momento do espetáculo. Tal como ocorreu em Yoshiwara, o cineasta usa a câmera com mais sobriedade mas, nesta oportunidade, teve meios para exercitar seu pendor ornamental.

 

Isa Miranda em La Signora di Tutti

No filme italiano, La Signora di Tutti / 1934 (Rot: Curt Alexander, Hans Wilhelm, M. Ophüls baseado no romance de Salvatore Gotta), após uma tentativa de suicídio, Gabriella Murge (Isa Miranda), que adotou o nome artístico de Gaby Doriat, e ficou conhecida como “la signora di tutti” por alusão ao título mais célebre de seus filmes, é transportada com urgência para um hospital. Conduzida para a sala de operação, a estrela, sob efeito da anestesia, recorda os episódios mais marcantes de sua existência; o escândalo provocado por sua beleza quando ainda era muito jovem; o acidente fatídico de Alma  (Tatyana Pavlova), a esposa paralítica de seu amante, o rico negociante Leonardo Nanni (Memo Benassi) e a falência e morte deste, depois que ela o deixou; sua ascenção no meio cinematográfico. O único homem que Gaby amou foi Roberto Nanni (Federico Benfer), filho de Leonardo, porém Roberto preferiu se casar com a irmã de Gaby, Anna (Nelly Corradi). Não encontrando mais nenhum sentido para sua existência infeliz, Gaby escolheu o suicídio. Quando a máscara de anestésico é retirada, os médicos confirmam seu falecimento.

Isa Miranda em La Signora di Tutti

Ophüls reencontra sua melhor forma neste estudo psicológico e melodramático de uma estrela de cinema que se liberta de um mundo patriarcal exacerbado e depois se torna vítima do seu rigor. Gaby vive sempre atormentada pela lembrança do comportamento de seu pai austero por ocasião do incidente ocorrido quando cantava no côro do colégio e fôra seduzida por um professor que abandonou a família, e acabou se matando. Mais tarde, ao se tornar amante do pai de seu amado, sente novamente o mesmo tormento, chegando à histeria e às alucinações (v. g. a música no fogo). Sua última decepção, leva-a forçosamente a tirar sua própria vida. No estúdio da Cines, Ophüls recobrou sua capacidade de invenção formal, recorrendo não só à sua câmera vertiginosa  (v. g.  a correria de um assistente de direção pelo estúdio; a dansa de Roberto e Gaby no baile) como também ao uso original da música (v. g. o disco rodando na vitrola, ouvindo-se uma voz feminina cantando “eu sou a senhora de todos”, uma presença simbólica da estrela enquanto seus empresários discutem sobre ela); do retrospecto (v. g. às vêzes é Gaby que se lembra do passado, outras, seu publicista narra a biografia de sua cliente); da panorâmica (v. g. Gaby remando no lago e, paralelamente, Leonardo acompanhando-a no seu carro pela estrada); da elipse (v. g. só ouvimos a voz do pai de Gaby esbravejando); do traveling (v. g. a câmera que vai e vem sobre a mesa de reunião na empresa de Leonardo); e finalmente  um maravilhoso close-up estático de Gaby quando ouve pelo telefone Roberto lhe dizendo que se casou com Anna, no qual se nota com maior evidência o excelente trabalho de interpretação de Isa Miranda. Sua Gaby é, sem dúvida, uma das figuras mais atraentes do universo feminino ophülsiano. O filme foi premiado no Festival de Veneza.

Cena de Komedie am Geld

O filme holandês, Komedie om Geld / 1936 (A Comédia do Dinheiro), com roteiro de Walter Schlee, M. Ophüls, Alex de Haas baseado em uma idéia de W. Schlee, tem início em um circo, onde o mestre de cerimônias  (Edwin Gubbins Doorenbos) narra para os espectadores uma comédia (mais uma farsa na verdade), que tem como herói um mensageiro de banco, Brand (Herman Bouber). Ele perde uma vultosa quantia de dinheiro sob sua responsabilidade (havia um furo na sua pasta) e, embora o desfalque não possa ser provado, Brand é demitido desonrosamente. As tentativas dele e de sua filha Willie (Rini Otte) para conseguir emprego falham e o pobre homem está tentado a cometer suicídio, quando acontece um milagre: os administradores do banco lhe oferecem a posição de diretor de uma sociedade imobiliária. Os magnatas da superendividada instituição de crédito pensam que Brand escondeu o dinheiro e pretendem se recapitalizar às suas custas. Brand aceita, mas posteriormente pede demissão, por se recusar a participar de operações inescrupulosas. Depois, ele por acaso recupera a quantia perdida, e imediatamente a devolve ao seu antigo empregador. Entretanto, a côrte de justiça entende que o numerário recuperado é a prova do desfalque, e o bancário é preso. Neste momento o diretor do circo intervém: “Querido público, não vamos deixar que este drama o deixe preocupado: encontraram uma testemunha a favor do bancário, e ele foi sôlto”.

Ophüls expõe com espírito satírico o lado sombrio do poder financeiro, deixando que o relato seja conduzido pelo mestre de cerimônias do circo, que interrompe o filme em alguns instantes, para se dirigir à platéia com uma canção ou um comentário. Além da crítica ao capitalismo, o diretor nos regala com as viravoltas da câmera algumas sombras expressionistas; magníficos close-ups; uma montagem paralela do conselho dos acionistas do banco que querem tomar uma decisão “radical” com o protagonista prestes a se enforcar; um pesadêlo surrealista do humilde empregado que se tornou patrão e não tem mais a consciência tranquila; e um palácio modernista filmado de todos os ângulos.

Quando a França foi ocupada pelos alemães, em 1940, Ophüls e sua família se refugiaram na Suiça, mas um problema de cidadania com o governo suiço, resultou no fim do seu projeto de filmar École des Femmes com a trupe de Louis Jouvet, e na sua expulsão do país.

Em 1941, Ophüls chega em Hollywood, após ter atravessado os Estados Unidos de automóvel com a mulher e os filhos. Os primeiros anos na “Cidade dos Sonhos” foram muito difíceis para o diretor e seus familiares. Ele vivia graças à ajuda dos amigos refugiados ou de antigos colegas de Berlim.  Ophüls ficou desempregado até 1946, quando Preston Sturges, impressionado com Liebelei, conseguiu que ele dirigisse Vendetta Vendetta para RKO; porém a filmagem foi muito conturbada,  notadamente pelas interferências constantes de Howard Hugues. Uma discordância com Hughes causou a saída de Ophüls, substituído por Preston Sturges, que foi também demitido. Stuart Heisler e Mel Ferrer ajudaram a terminar o filme, que só foi lançado em 1950.

 

 A primeira oportunidade de Ophüls sentar atrás das câmeras em Hollywood finalmente chegou com o auxílio de Robert Siodmak, que fez o que era necessário para que ele dirigisse Douglas Fairbanks, Jr. em O Exilado / The Exile / 1947, filme que o próprio ator escreveu e produziu, para ser distribuido pela Universal. Neste filme de aventura histórica, cuja ação transcorre em 1660, caçado pelos “Cabeças Redondas” de Oliver Cromwell, o rei Charles II está exilado na Holanda. Seus amigos o pressionam para retornar à Inglaterra, mas ele lhes diz que ainda é muito cedo para isso. Charles aguarda o apêlo unânime do seu povo e se esconde na estalagem de Katie (Paule Croset, outro nome artístico de Rita Corday), uma vendedora de tulipas e se coloca a seu serviço. Enquanto os homens de Cromwell, e notadamente o Coronel Ingram (Henry Daniels), pensam que ele está tramando contra o govêrno, Charles está ocupado com pintinhos, pescando ou ajudando sua hospedeira no mercado, por quem está apaixonado. Outro inglês exilado, o ator itinerante desempregado (Robert Coote), faz-se passar pelo rei, mas a visita de uma condessa francêsa (Maria Montez), que conhece o verdadeiro soberano, traz complicações. Finalmente, os “Cabeças Redondas” descobrem o paradeiro de Charles que, perseguido, trava um duelo com o Coronel Ingram (Henry Daniell), e o mata. Os partidários de Charles chegam em seu socorro. Ele volta para o seu trono, porém os deveres do cargo lhe obrigam a abandonar Katie.

Douglas Fairbanks Jr. e Maria Montez em O Exilado

Max Ophuls e Douglas Fairbanks Jr, em um intervalo de filmagem de O Exilado

Ophüls  (nos filmes americanos seu nome aparece nos créditos como Max Opuls) perde algum tempo até que o filme comece a ficar excitante, mas aos poucos a narrativa vai crescendo de intensidade, e vão surgindo bons momentos de criação cinematográfica (v. g. o primeiro beijo de Charles e Katie; o encontro na hospedaria do rei incógnito com o chefe dos “Cabeças Redondas”; o aparecimento do falso Charles II; e, principalmente, a perseguição e o duelo no moinho). O espetáculo foi fotografado em sepia por Franz Planner, o mesmo de Liebelei. Fairbanks Jr. desempenha as cenas agitadas com a destreza herdada do pai e compõe com sabedoria a personalidade daquele monarca que descobriu no destêrro a felicidade pessoal, e logo teve de esquecê-la, para se reintegrar na sua alta função.

O segundo filme americano de Ophüls, Carta de uma Desconhecida / Letter from an Unknown Woman / 1948, produzido por John Houseman para a Rampart Productions (fundada por William Dozier e sua então esposa Joan Fontaine) e distribuído pela Universal, é um melodrama (com roteiro de Howard Koch e M. Ophüls baseado na novela de Stefan Zweig), contando a história de um amor obsessivo e ilusório. O tema era perfeito para Ophüls e o diretor soube emprestar sobriedade à atmosfera do filme, evitando a pieguice e, com a força de seu estilo, impregná-lo de beleza plástica.

Louis Jourdan e Joan Fontaine em Carta de uma Desconhecida

Na Viena de 1900, pouco antes de participar de um duelo, do qual pretende fugir, Stefan Brand (Louis Jourdan), um pianista envelhecido e em decadência recebe uma longa carta de uma desconhecida, Lisa Berndle (Joan Fontaine), e se concentra na sua leitura. Ainda adolescente, Lisa se apaixonou por Stefan, que era seu vizinho. Um dia, sua mãe viúva (Mady Christians) anunciou que ia se casar com um comerciante de Linz, e era preciso que elas se mudassem para lá. No último minute antes de embarcar na estação ferroviária, Lisa decide voltar para casa, a fim de ver Stefan mais uma vez; porém surpreende-o com outra mulher. Aos dezoito anos de idade, um jovem tenente lhe propõe casamento porém, para espanto dele, ela responde que ficara noiva de um músico de Viena. Contrariando sua progenitora e seu padrasto, Lisa retorna para essa cidade e vai trabalhar como manequim em um  ateliê de moda. Todas as noites ela ronda a casa de Stefan e, uma vêz, ele lhe dirige a palavra. Eles passam então uma noite encantadora, jantando em um boxe recatado, “viajando” em um falso trem do parque de diversões, passeando pela cidade até que ele a conduz para o seu quarto. Algum tempo mais tarde, Stefan diz para Lisa que vai participar de um concerto em Milão por duas semanas, mas nunca mai volta. Lisa dá a luz uma criança e, quando o menino faz nove anos, ela se casa com um diplomata, Johann Staufer (Marcel Journet). Um dia, Lisa revê Stefan na Ópera, não resiste e,  contra o desejo do marido, vai procurá-lo. Stefan tenta seduzí-la como se nunca a tivesse visto, Liza compreende que ele a esquecera totalmente, e foge. Seu filho morre de tifo e ela foi atingida pelo mesmo mal. Uma nota acrescentada à carta, indica que Lisa morreu. O adversário de Stefan no duelo, Johann Staufer, chega com suas testemunhas. Stefan não foge. Ele está pronto para duelar e, sem dúvida, para morrer.

Max Ophuls e Joan Fontaine em um intervalo da filmagem de Carta de uma Desconhecida

Louis Jourdan e Joan Fontaine em Carta de uma Desconhecida

O drama nasce da incapacidade do egocêntrico Stefan enxergar o amor de Lisa e, ao mesmo tempo da ingenuidade, conjugada com um certo masoquismo, da jovem sonhadora. Inicialmente, Lisa está sempre escondida atrás de uma porta, de uma parede ou encoberta pelas sombras mas, mesmo quando fica diante de Stefan, ele não percebe o que ela sente por ele. Por outro lado, Lisa idealizou a figura de Stefan, e portanto não o conhece realmente pois, se conhecesse, saberia porque ele não se lembra dela. As consequências desse desconhecimento mútuo foram trágicas.  Lisa viveu toda a sua vida para Stefan e no final perdeu tudo por causa disso, e acabou morrendo. Ele, por sua vez, nunca compreendeu o que tinha até que era tarde demais. Quando ficou sabendo do que havia feito, entendeu que não havia mais razão para viver.

Joan Fontaine e Louis Jourdan em Carta de uma Desconhecida

Com a ajuda dos arranjos musicais de Daniele Amfitheatrof, direção de arte de Alexander Golitzen, fotografia de Franz Planner e figurinos de Travis Banton, Ophüls conduz o relato mórbido e fatalista, utilizando muito a câmera alta – sempre do alto de escadas fotogênicas – e os close-ups, além, é claro, de sua grua irriquieta, servindo-se outrossim da música erudita (Lizst, Mozart, Strauss) e dos cenários, para recriar com precisão os sentimentos dos personagens e os ambientes. Duas cenas simbólicas ficaram mais na memória dos espectadores. A primeira, é a do passeio no trem fictício do parque de diversões onde, em um vagão estático, Stefan e Lisa contemplam telões com paisagens pintadas da Suiça, que passam diante de sua janela, movidos febrilmente por um maquinista; a segunda, quando eles dançam ao som de uma valsa de Strauss, interpretada por uma orquestra de mulheres.

A carreira de Ophüls em Hollwood prossegue com mais dois filmes realizados em 1949: Coração Prisioneiro / Caught na Metro e Na Teia do Destino / The Reckless Moment na Columbia.

Robert Ryan e Barbara Bel Geddes em Coração Prisioneiro

Robert Ryan e Barbara Bel Geddes em Coração Prisioneiro

Em Coração Prisioneiro (Rot: Arthur Laurents baseado no romance “Wild Calendar” de Libbie Block), melodrama psicológico (e não filme noir como muitos o classificaram), Leonora Ames (Barbara Bel Geddes), que trabalha como garçonete, divide um modesto apartamento com sua companheira Maxine (Ruth Brady), e se matricula em uma escola de etiquêta para se tornar uma modelo e melhorar suas chances de subir na vida. Por acaso, seu caminho se cruza com o do multimilionário Smith Ohlrig (Robert Ryan). A princípio suspeitando que ela fosse uma caçadora de ouro, Ohlrig sente-se aos poucos atraído pelo seu decôro e pela sua resistência a um relacionamento ocasional. Os dois se casam e parece que os sonhos de Leonora vão se realizar, mas ela não estava preparada para a natureza fria e dominadora de seu marido. Deprimida, Leonora abandona Smith e obtém emprego como recepcionista em um consultório de dois médicos que atendem a uma clientela pobre, o pediatra Dr. Larry Quinada (James Mason) e o obstreta Dr. Hoffman (Frank Ferguson). O tempo passa, e Smith implora a Leonora que ela volte para ele. Ela retorna para a mansão, e tem uma nova desilusão. Leonora deixa seu marido mais uma vez e retoma sua função no consultório médico. Nasce então um romance entre Larry e Leonora, mas ela vai ter um filho de Smith, e este só lhe concederá o divórcio, se ficar com a guarda da criança. Leonora permanece na mansão de Smith, e passa seus dias isolada e triste. Uma noite, depois de um de seus acessos de raiva, Smith sofre um ataque cardíaco. Quando o bebê de Leonora nasce prematuramente e morre, Larry a convence de que a morte da criança a libertará de seus laços com o passado, e lhe permitirá começar uma nova vida com ele.

Ophüls limita-se a narrar fluentemente essa história com aspectos femininos – a moça pobre que procura um casamento rico e encontra um marido neurótico e autoritário – e sociais – a crítica ao sistema capitalista e aos valores burguêses – , mas  eventualmente surgem sinais do seu estilo típico como, por exemplo, na primeira aparição de Smith; na suntuosidade da decoração de sua mansão; na conversa entre Smith e Leonora no salão de bilhar; na cena em que Leonora e Larry dançam e ele a pede em casamento; e nos close-upsLarry e Smith quando este diz que é casado com Leonora. Paralelamente, a fotografia em claro-escuro de Lee Garmes ajuda o diretor a criar o clima dramático e a atmosfera opressiva do “cativeiro” de Leonora.

Em Na Teia do Destino (Rot: Henry Garson, Robert Soderberg baseado na história  “The Blank Wall” de Elisabeth Sanxay Holding publicada no Ladies Home Journal), drama criminal no seu subgênero filme noir (impuro), Lucia Harper (Joan Bennett) vive com sua família classe média em Balboa, no litoral da Califórnia. Na ausência do  marido, que viajou para Berlim, ela vai até Los Angeles procurar Ted Darby (Shepperd Strudwick), gigolô de meia-idade que está saindo com sua filha Bea (Geraldine Brooks). Darby pede dinheiro para deixar Bea e Lucia vai embora, indignada. Na mesma noite, Bea encontra-se com Darby na garagem de barcos. anexa à sua residência. Quando este admite que pediu dinheiro à sua mãe, Bea o golpeia na cabeça com uma lanterna, e foge assustada, sem saber que ele perdeu os sentidos, caiu sobre uma âncora, morrendo.  Pensando que Bea matou Darby, Lucia esconde o corpo dele em uma tentativa desesperada de proteger a família de um escândalo. É então que intervém um chantagista, Martin Donnelly (James Mason), oferecendo-lhe cartas de amor, que Bea trocara com Darby. Entretanto, Donnelly torna-se sensível à situação de sua vítima, passa a admirar Lucia e sua dedicação à família e, para ajudá-la, estrangula seu cúmplice Nagel (Roy Roberts) que, inconformado com a demora do pagamento da extorsão, fôra atormentá-la. Na sua fuga, Donnelly morre em um acidente de carro, após ter entregue as cartas de Bea para Lucia e se acusado falsamente da morte de Darby para a polícia.

James Mason e Joan Bennett em Na Teia do Destino

Joan Bennett em Na Teia do Destino

Lucia e Donnelly são protagonistas noirclássicos, oprimidos pelas circunstâncias. Lucia tem que manter a respeitabilidade de seu lar burguês e Donnelly é obrigado a praticar a chantagem que o sócio lhe impõe. Quando a simpatia por Lucia chega ao auge, Donnelly investe contra o parceiro com toda a sua angústia desesperada e obtém a redenção que tanto desejava. É bom notar que Lucia não é uma mulher fatal típica, mas uma daquelas heroínas igualmente poderosas que surgem nos filmes noirese penetram no labirinto de uma investigação e a fotografia de Burnett Guffey  – sem desprezar as sombras – dá mais preferência ao cinza do que ao preto e branco contrastado. Ophüls, sempre movimentando a câmera em panorâmicas e travelings velozes, soube evitar os escolhos melodramáticos da história e criar uma atmosfera de aflição, como na longa sequência praticamente muda, quando Lucia arrasta o cadáver de Darby pela praia até sair com a lancha, para se desfazer dele no mar.

W. S. VAN DYKE

Ele era um diretor típico de estúdio, técnico competente e confiável, conhecido por sua fidelidade ao orçamento e compromisso com o cronograma de trabalho. Por sua rapidez e eficiência como realizador ganhou o apelido de “One Take Woody” e seus filmes eram bem aceitos pelo público e, consequentemente, muito lucrativos.

W. S. Van Dyke

Woodbridge Strong Van Dyke II, conhecido como W. S. Van Dyke (1889 – 1943), era natural de San Diego, Califórnia, filho de Laura Winston e Woodbridge Strong Van Dyke, jovem advogado sócio do escritório de advocacia Hunsaker and Britt, e nasceu no dia seguinte da morte de seu pai aos 24 anos de idade. Mrs. Van Dyke mudou-se para San Francisco quando Woody tinha três anos de idade e aderiu à companhia de repertório Morosco Players, onde seu filho estreou no palco em um papel infantil na peça “Damon and Pythias”.

Mãe e filho continuaram atuando em companhias ambulantes, mas aos quatorze anos, Van Dyke, tendo completado seus estudos secundários, desejou entrar para uma universidade ou para uma escola de comércio. Como o dinheiro que ganhavam não era suficiente, ele resolveu ir para Seattle e viver com sua avó, até encontrar emprego fora do tablado. Alto e espantosamente forte, passava facilmente por um rapaz de dezoito anos, e assim exerceu várias atividades: empregado de um armazém, rapazinho de recados em uma estação ferroviária, vendedor de aspiradores de pó de porta em porta etc. Depois de terminar o curso de comércio, Van Dyke foi para Ashford, Washington, a fim de trabalhar em uma serraria, e lá conheceu Zina Ashford, filha do dono da única loja da cidade, que recebeu o seu nome. Após o casamento, Van Dyke reuniu-se novamente com sua mãe na companhia de repertório, e levou sua esposa com ele. Bonitão e simpático, ele interpretava os papéis principais contracenando com sua mãe, formando uma combinação inusitada, e poucas pessoas sabiam que eles eram mãe e filho, porque Mrs. Van Dyke continuara a ser anunciada como Laura Winston.

Woody, Ruth Mannix e filhos

Van Dyke chegou ao cinema por intermédio do ator Walter Long, que era amigo de sua progenitora, e o introduziu na equipe de Intolerância / Intolerance / 1916, de David Wark Griffith, primeiramente como figurante, passando depois a um dos vários segundo assistentes de direção que depois, tal como ele, se tornariam diretores (Tod Browning, Jack Conway, Allan Dwan, Victor Fleming, Sidney Franklyn, Christy Cabanne, George William Hill). Foi Van Dyke quem mostrou a Mr. Griffith como devia ser um rei babilônico, improvisando a maquilagem adequada e deixou o “Pai do Cinema” apoplético quando, ao conduzir uma biga, quase estragou a investida contra a cidade da Babilônia. Promovido a segundo assistente de direção, ele sempre dava um jeito de ficar perto do diretor, observando o que ele estava fazendo. Maravilhado com tudo o que via, convenceu-se de que havia encontrado o seu nicho. Não era o palco. Eram os filmes.

W. S. Van Dyke

Quando Griffith decidiu se dedicar a produções menos pretenciosas, teve que diminuir sua equipe, e Van Dyke estava entre os que foram dispensados; mas logo foi aproveitado como assistente de James Young, um dos diretores mais importantes do Famous Players-Lasky Studio. Young reconheceu talento no seu novo assistente e deixou que ele cuidasse de toda a sua montagem. Embora trabalhasse para Jesse L. Lasky, Van Dyke considerava Mr. Young como seu patrão, e ficou sempre perto dele, tal como fizera com Griffith. Quando Young foi para o Essanay Studios em Chicago, ele convidou Van Dyke para acompanhá-lo.

Os donos da Essanay eram o astro-cowboy “Broncho Billy” Anderson e George K. Spoor. “Broncho Billy” logo notou que Van Dyke tinha facilidade para escrever, especialmente histórias de cowboys, e o deixou inventar algumas para ele. Durante esse período na Essanay, Woody organizou a escala de trabalho das produções, tentnado colocar uma ordem, ajudando o estúdio a poupar dinheiro. Satisfeito, Spoor convidou-o para se encarregar do novo estúdio da companhia na Califórnia, para onde ele foi, acompanhado pela mãe, que já havia abandonado o teatro e aceitado um emprego na Vitagraph.

Na Essanay, Van Dyke dirigiu em 1917: The Land of the Long Shadows, The Range Boss, Open Places e Men of the Desert (todos estrelados por Jack Gardner) e Gift of Gab e Julinha Vai para o CéuSadie Goes to Heaven em 1918, o primeiro ainda com Gardner, e o segundo com Mary McAllister. Ainda em 1918, Van Dyke dirigiu ainda A Dama do EsconderijoThe Lady of the Dugout, western curiosamente estrelado por Al e Frank Jennings, os famosos ex-ladrões de banco na vida real, produzido por uma companhia fundada pelo próprio Jennings. Van Dyke fez também um short com Al Jennings intitulado Fate’s Frame-Up / 1919.

Depois dessa experiência inusitada, Woody começou a fazer seriados: O Homem de Ferro / The Hawk’s Trail / 1920 / Cia. Prod: Burston Films, com King Baggot; Vivo ou Morto / Daredevil Jack / 1920 / Cia. Prod: Pathé, com o pugilista Jack Dempsey; A Dupla Aventura / Double Adventure / 1921 / Cia. Prod: Pathé, com Charles Hutchinson; A Flecha Vingadora / The Avenging Arrow / 1921 e A Águia Branca / White Eagle / 1922, ambos também da Pathé, com Ruth Roland.

Ainda em 1922, Louis Burston percebeu que Van Dyke trabalhava mais rápido e melhor do que qualquer outro na sua equipe e o contratou para fazer dois filmes com seu astro, David Butler: o western The Milky Way (Cia. Prod: Western Pictures Exploitation Co.) e a comédia According to Hoyle. (Cia. Prod: David Butler Productions). Como resultado da qualidade do seu trabalho nestes dois filmes, Van Dyke teve a oportunidade de dirigir Não Te Esqueças de Mim / Forget Me Not / 1922, (Cia. Prod: Louis Burston Productions), história dramática de uma menina orfã, interpretada por Bessie Love. Quando Louis B. Myer, então um dos produtores independentes mais importantes da cidade, viu o filme, contratou Burston, David Butler e Van Dyke, para fazerem oito filmes, mas um acidente de automóvel tirou a vida de Burston, e Mayer cancelou o contrato, tendo em vista que, sem ele para supervisionar a produção, o estúdio não conseguiu um financiador.

Gareth Hughes e Bessie Love em Não Te Esqueças de Mim

Até ingressar na Metro-Goldwyn-Mayer, Van Dyke dirigiu 18 filmes (sendo um não creditado e por pouco tempo) para diversas companhias, entre os quais se destacam os estrelados por Buck Jones na Fox: O Novo Patrão / The Boss of Camp Four / 1922 (Fox, com Buck Jones); Diante do Perigo / You Are in Danger também conhecido como The Little Girl Next Door /1923 (Blair Coan Prod., com Pauline Starke); Anjo Exterminador / The Destroying Angel /1923 (Arthur F. Beck, Prod., com Leah Baird); The Miracle Makers / 1923 (Leah Baird Prod., com Leah Baird); Ruth, a Veloz / Ruth of The Range (Ruth Roland Serials – Pathé, seriado com Ruth Roland. Obs. O diretor Ernest C. Warde foi substituído temporariamente por Van Dyke e depois Frank Leon Smith entrou em seu lugar); Mentiras de Amor / Loving Lies / 1924 (Associated Authors, com Evelyn Brent, Monte Blue); Ladrões Terríveis / The Beautiful Sinner / 1924 (Perfection Pictures, com William Fairbanks, Eva Novak); A Força do Destino / Half a Dollar Bill / 1924 (Graf Prod., com Anna Q. Nilsson); Ou Tudo ou Nada / Winner Take All / 1924 (Fox, com Buck Jones, Peggy Shaw); Combatendo Por Quem Ama / The Battling Fool / 1924 (Perfection Pictures, William Fairbanks, Eva Novak); Corta-Vento / Gold Heels (Fox, com Robert Agnew, Peggy Shaw); O Nível do Amor / Barriers Burned Away / 1925 (Encore Pictures, com Mabel Ballin); Corações e Esporas / Hearts and Spurs / 1925 (Fox, com Buck Jones, Carole Lombard); O Estouro da Boiada / The Trail Rider /1925 (Fox, com Buck Jones); Amor Soberano / Ranger of the Big Pines / 1925 (Vitagraph, com Kenneth Harlan); O Lobo dos Montes / The Timber Wolf / 1925 (Fox, com Buck Jones); O Preço do Deserto / The Desert’s Price / 1925 (Fox, com Buck Jones); O Pacificador / The Gentle Cyclone / 1926 (Fox, com Buck Jones)

“Van Dyke, gostaríamos de tê-lo conosco”. “Não existe nenhum lugar no qual eu mais gostaria de estar, Mr. Mayer!” Eles se acertaram quanto ao salário, apertaram as mãos e Van Dyke disse: “Quando começo?”. “Agora mesmo”, respondeu Mayer. “Nós temos um novo astro sob contrato e depois da maneira esplêndida com que você lidou com Buck Jones, estamos convencidos de que você é o homem certo para o trabalho”. “Quem é o seu astro, Mr. Mayer?”. O astro era Tim McCoy. Assim teve início a longa carreira de Van Dyke na MGM, a companhia na qual realizou seus melhores filmes.

Nessa fase inicial, ele dirigiu o popular cowboy em 7 filmes (Surpresas de um Beijo / War Paint / 1926, com Pauline Starke; Espadas e Corações / Winners of the Wilderness / 1927, com Joan Crawford; Califórnia / Califórnia / 1927, com Dorothy Sebastian; Demônios Brancos / Foreign Devils / 1927, com Claire Windsor; Despojadores do Deserto / Spoilers of the West / 1927, com Marjorie Daw; Ódio Fraternal / Wyoming / 1928 e O AventureiroThe Adventurer / 1928, sendo que, neste último, ele substituiu, sem ser creditado, o diretor russo Viktor Tourjansky, afastado da produção por desentendimento com Irving Thalberg. No mesmo período, Van Dyke fez, ainda para a MGM: Sob a Águia Imperial / Under The Black Eagle / 1928, drama sobre um cão (Flash), que salva vidas durante a Primeira Guerra Mundial, estrelado por Ralph Forbes e Marceline Day e dois filmes para a efêmera H. C. Weaver Prod.: The Heart of the Yukon / 1927 e Olhos Felinos / The Eyes of the Totem / 1927, ambos com Anne Cornwall no elenco.

Monte Blue e Raquel Torres em Deus Branco

Filmagem de Deus Branco

Cenas de Deus Branco

Cena de Deus Branco

 

O próximo compromisso de Van Dyke foi um ponto decisivo na sua trajetória artística. Em novembro de 1927, A Metro-Goldwyn- Mayer concebeu um projeto de filme de aventura (que seria Deus Branco / White Shadows of the South Seas / 1928), introduzindo uma idéia nova: ficção, com um pano de fundo autêntico. Van Dyke desejava esta incumbência, porém o estúdio achou que a história requeria alguém que conhecesse bem as ilhas dos Mares do Sul, e trouxeram Robert Flaherty por causa de seu êxito fotografando O Homem  Perfeito / Moana of the South Seas  e Nanook do Norte / Nanook of the North.  A Van Dyke ofereceram o encargo de diretor associado, mas na divulgação do filme algum redator abreviou  a palavra “associate” e ela pareceu significar assistente. Segundo o Film Daily noticiou, “Flaherty cuidaria de todas as tomadas atmosféricas e da direção da expedição enquanto Van Dyke seria encarregado das sequências dramáticas.” Van Dyke passou três meses filmando no Tahiti, primeiramente em colaboração com o célebre documentarista, tornando-se depois  o único diretor, e durante esse tempo manteve um diário que em 1996 veio a ser publicado pela Scarecrow Press e anotado por Rudy Behlmer. O filme descrevia como a chegada do homem branco corrompeu as comunidades primitivas; daí o título . Monte Blue e Raquel Torres foram trazidos de Hollywood para os papéis principais , porém os ilhéus interpretaram a si mesmos.  A MGM decidiu adicionar música sincronizada e efeitos sonoros, e até uma palavra falada: “Hello”. Ponto alto do espetáculo  foram as imagens belíssimas que Clyde de Vinna extraiu das exóticas locações, sendo com toda justiça premiado como  o Oscar de Melhor Fotografia. O filme até hoje impressiona como uma fusão muito bem executada de drama, travelogue e ilustração romântica dos usos e costumes dos Mares do Sul.

No outono de 1928, Van Dyke estava de novo nos Mares do Sul, desta vez para filmar O Pagão / The Pagan / 1929, filme mudo com sequências musicadas sincronizadas pelo processo Movietone, apresentando um tema musical, “The Pagan Love Song”, que se popularizou por toda a nação.

Doroty Janis e Ramon Novarro em O Pagão.

Renne Adoree e Ramon Novarro em O Pagão

A equipe técnica era quase a mesma de Deus Branco, incluindo o fotógrafo Clyde De Vinna, e nos papéis principais estavam Ramon Novarro, Renee Adoree, Dorothy Janis, e Donald Crisp. Conjugando romance com o esplendor visual do ambiente paradisíaco a trama focaliza um mestiço, Henry Shoesmith, Jr. (Ramon Novarro), filho de um branco com uma nativa, que herdou um armazém e uma fazenda, mas está mais interessado em absorver as belezas naturais do que administrar seu negócio. Quando se apaixona por Tito (Dorothy Janis), jovem polinésia, também mestiça, Henry incorre na ira de um comerciante branco brutal, Roger Slater (Donald Crisp), que se diz guardião da moça, e acha que é seu “dever Cristão” civilizá-la, mas também a deseja. Renee Adoree faz o papel de uma prostituta de bom coração que gosta de Henry. No Brasil o filme foi ansiosamente aguardado pelo público graças a imensa propaganda que lhe dispensaram e a curiosidade de ouvir Ramon cantando, daí resultando um êxito retumbante, o qual aliás, ocorreu no mundo inteiro.

Cena de Trader Horn

Van Dyke na filmagem de Trader Horn

Harry Carey, Duncan Renaldo e Edwina Booth em Trader Horn

Cena de Trader Horn

Trader Horn / Trader Horn / 1931 clássico filme de aventuras na África, rodado em locação, sob árduas condições, foi outro tremendo sucesso de bilheteria mundial. Foram contratados Harry Carey para ser Trader Horn, Duncan Renaldo, Little Peru, e Edwina Booth, Nina T. a “Deusa Branca”. Van Dyke disse-lhes francamente sobre os perigos que teriam que enfrentar, e perguntou se ainda desejavam ir. Todos concordaram. Edwina contraiu febre tropical e nunca se recuperou totalmente, abrindo um rumoroso caso judicial contra a MGM. Insatisfeito com o copião apresentado por Van Dyke, o chefe de produção da MGM, Irving Thalberg mandou refazer algumas cenas e adicionou outras filmadas em estúdio e no México. Sua persistência valeu, pois, além da boa rentabilidade, o filme foi indicado para o Oscar.]

Leslie Howard e Conchita Montenegro em Delírio de Amor

Lionel Barrymore e Kay Francis em Mãos Culpadas

Lawrence Tibbett e Lupe Velez em Melodia Cubana

Ainda em 1931, Dyke fez três filmes mais modestos, porém interessantes: Delírio de Amor / Never the Twain Shall Meet, Mãos Culpadas / Guilty Hands e Melodia Cubana / Cuban Love Song. O primeiro, é um drama romântico no qual Conchita Montenegro é Tamea, a quase selvagem nativa de uma ilha da Polinésia, filha de um dos capitães dos navios de Dan Pritchard (Leslie Howard) que, ao morrer, a deixara sob a proteção do rico armador. Apesar de ser noivo de Maisie (Karen Morley), Dan se apaixona por Tamea, e vai viver com ela na ilha, mas se decepciona devido às diferenças culturais. O título original do filme é uma frase do poema de Rudyard Kipling, “East is east and west is west, and never the twain shall meet”, sempre citado como um exemplo das atitudes de Kipling em relação a raça e império. O segundo filme é um drama criminal no qual Lionel Barrymore interpreta um advogado, Richard Grant que, como ele diz para uns amigos logo no início da narrativa, entende que há casos nos quais o assassinato é justificado – e que é possível cometê-lo, sem ser descoberto. Ao saber que um cliente seu, Gordon Rich (Alan Mowbray), está seduzindo sua filha inocente, Barbara (Madge Evans), ele o mata, e depois ameaça incriminar Marjorie West (Kay Francis), sua amante de longa data, tudo terminando com um final surpreendente. O terceiro filme, é um musical romântico que conta a história de um fuzileiro naval, Terry (o barítono Lawrence Tibbett) que se apaixona por uma vendedora de amendoim, Nenita (Lupe Velez) em Havana. Ele vai lutar na França durante a Primeira Guerra Mundial, retorna ferido para o seu país e se casa com sua antiga namorada, Crystal (Karen Morley). Passam-se os anos, ele se lembra de Nenita, vai procurá-la em Havana, mas fica sabendo que ela faleceu, e lhe deixara um filho. Quando volta para casa é recebido por Crystal, que quer continuar a ser sua esposa e mãe de Terry Jr. Jimmy Durante e Ernest Torrence são os companheiros de Terry e se ocupam dos momentos cômicos.

Johnny Weissmuller e Maureen O’Sullivan em Tarzan, o Filho das Selvas

Maureen O’Sullivan e Johnny Weissmuller em Tarzan, o Filho das Selvas

Cena de Tarzan, o Filho das Selvas

A MGM não sabia o que fazer com as tomadas que haviam sobrado de sua produção, Trader Horn, quando surgiu a idéia de aproveitá-las em um filme de Tarzan. Escolhido para dirigir o primeiro exemplar da série, Van Dyke começou a procurar o ator ideal para o Rei das Selvas e, afinal, escolheu o campeão olímpico Johnny Weissmuller. Johnny foi o intérprete mais popular do personagem de Edgar Rice Burroughs, estrelando 12 filmes, sendo seis da MGM ao lado de Maureen O’ Sullivan. A de Van Dyke, Tarzan, o Filho das Selvas / Tarzan the Ape Man / 1932 e a segunda, A Companheira de Tarzan / Tarzan and His Mate / 1934, dirigida por Cedrick Gibbons e Jack Conway, são consideradas as melhores, não só pelos cuidados de produção como pelo erotismo, surpreendente para a época. A partir de 1934, o Código Hays obrigou Jane a vestir trajes menos sumários. Por seu charme absoluto (sem esquecer as macaquices de Cheeta) a série desafiou o tempo.

Depois de Tarzan, O Filho das Selvas, vieram: Injustiça / Night Court / 1932; Pela Vida de um Homem / Penthouse / 1933; O Pugilista e a Favorita / The Prizefighter and the Lady / 1933; Esquimó / Eskimo / 1933; Amor Selvagem / Laughing Boy / 1934; Vencido pela Lei / Manhattan Melodrama / 1934, uns melhores do que outros, mas todos – com exceção de um – cativantes.

Walter Huston e Anita Page em Injustiça

Injustiça, drama criminal eficaz sobre um magistrado corrupto (Walter Huston) que, não obstante a vigilância de um colega honrado (Lewis Stone), persegue um chofer de taxi (Phillips Holmes) e sua esposa (Anita Page), achando que eles têm a posse de um documento, comprovando seus malfeitos, e chega até a condenar a jovem inocente à prisão. O anúncio do filme no Brasil dizia: “Uma mulher atirada à lama da desonra pela própria Justiça”.

Myrna Loy e Warner Baxter em Pela Vida de Um Homem

Pela Vida de um Homem / Penthouse / 1933, agradável mistura de filme de gangster com comédia (emoldurada pela cenografia suntuosa de Cedric Gibbons), tendo Warner Baxter como Jackson Durant, um advogado criminal que recorre a uma garota de programa muito esperta Gertie Waxted (Myrna Loy) para expor as atividades de um chefão do crime (C. Henry Gordon). “Esta garota vai ser uma grande estrela”, declarou Van Dyke sobre Myrna Loy, que até então vinha desempenhando somente pequenos papéis exóticos. O próprio diretor se encarregou de concretizar a sua predicão escolhendo Myrna para formar a dupla famosa de A Ceia dos Acusados / The Thin Man, realizado no ano seguinte. Van Dyke dirigiu-a em um total de oito filmes.

Walter Huston e Max Baer em O Pugiiista e a Favorita

O Pugilista e a Favorita / The Prizefighter and the Lady / 1933, comédia romântica   divertida – sobre uma artista de boate Belle Mercer Morgan (Myrna Loy), que conquista o coração de um pugilista Steve Morgan (Max Baer) -, cujo climax é um combate (de mentirinha) entre o personagem de Baer e Primo Carnera. A filmagem desta cena foi um acontecimento no set, uma vez que Baer e Carnera disputavam na vida real o título de campeão de peso pesado. O ex-campeão Jack Dempsey era outra atração no papel do árbitro e Walter Huston era o empresário de Steve. Frances Marion ganhou uma indicação para o Oscar de Melhor História Original. Durante a realização de O Pugilista e a Favorita, Van Dyke foi apresentado a Ruth Mannix, sobrinha de Eddie Mannix, alto executivo da MGM e mais tarde gerente do estúdio. Após obter o divórcio de sua esposa Zina em janeiro de 1935 (por deserção pois ela o deixara em 1923), ele se casou com Ruth em fevereiro do mesmo ano em Nova Orleans. Eles tiveram três filhos: Barbara, Woodbridge III e Winston.

Cena de Esquimó

Cena de Esquimó

Esquimó / Eskimo / 1933, docudrama antropológico sobre um caçador esquimó Mala (interpretado por um nativo do norte do Alasca) procurado pela policia por ter matado o comerciante branco, que estuprou sua mulher. Após ter ido aos Mares do Sul para filmar Deus Branco e à África para filmar Trader Horn, Van Dyke dirigiu-se ao Ártico, onde filmou (com a ajuda inestimável de Clyde De Vinna e seus assistentes), as belas paisagens eternamente brancas, cenas da vida selvagem mostrando caçadas de morsas e baleias, milhares de renas em disparada, curiosidades do modus vivendi dos esquimós. Os nativos falam em língua esquimó, traduzida com legendas. Van Dyke aparece como um guarda da Polícia Montada do Canadá e Conrad Nervig arrebatou o Oscar de Melhor Montagem.

Lupe Velez e Ramon Novarro em Amor Selvagem

Amor Selvagem / Laughing Boy /1934, drama romântico em ambiente de western, girando em torno de um índio Navajo, Laughing Boy (Ramon Novarro), que, contra o desejo de sua família, casa-se com uma índia, Slim Girl (Lupe Velez), de moral questionável, devido ao contato com o homem branco, e tratada como uma desterrada. Slim tenta se comportar como uma boa esposa indígena, mas retorna aos maus costumes, ocasionando uma tragédia. Ao surpreendê-la com um amante, Laughing Boy desfecha uma flecha contra ele, porém atinge Slim Girl pelas costas. Ao morrer em seus braços, Slim pede perdão a Laughing Boy, e promete esperá-lo no Paraíso. O filme é moroso e Ramon (com uma peruca horrível) soa falso como índio, ainda mais trabalhando ao lado de índios navajos verdadeiros. Tanto ele como Lupe foram desastradamente escolhidos para interpretar seus personagens. O diretor tentou dar autenticidade ao relato inserindo tomadas de fundo projetado e acelerando as cenas de luta, mas isso só serviu para distrair a atenção do espectador. Incomodada com a interferência do Código Hays, a MGM lançou o filme discretamente. Ele foi desprezado pelos críticos e resultou em um fracasso de bilheteria. Foi logo depois desse fiasco que Ramon veio ao Brasil, apresentando-se com sucesso ao lado de sua irmã bailarina, Carmencita Samaniego,  no palco do Palácio-Theatro e arrebatando o público ao cantar em português, “Se a Lua Contasse” de Custódio Mesquita, já conhecida pela voz de Aurora Miranda.

Clark Gable e william Powell em Vencido pela Lei

Van Dyke dirige Vencido pela Lei

Vencido pela Lei / Manhattan Melodrama / 1934, drama criminal focalizando dois amigos de infância que seguem caminhos diferentes na vida. Jim Wade (William Powell), promotor público, tem de acusar Blackie Gallaghan (Clark Gable), que se tornara um delinquente e matara um bandido, para salvar a vida de Jim. Eleanor (Myrna Loy) começa como amante de Gable, mas depois se apaixona por Powell. A história original sensibilizou os membros da Academia rendendo um Oscar a seu autor Arthur Caesar. Bem preparada pelos roteiristas Joseph L. Mankiewicz e Oliver Garrett e conduzida fluentemente por Van Dyke, caiu também no gôsto do público. O filme adquiriu fama ainda por outro motivo: John Dillinger acabara de assistí-lo, quando foi morto pelos agentes do FBI, ao sair do cinema.

Myrna Loy, Asta e William Powell em A Ceia dos Acusados

Myrna Loy e William Powell em A Ceia dos Acusados

Filmagem de A Comédia dos Acusados

Baseado no romance de Dashiel Hammett, A Ceia dos Acusados / The Thin Man / 1934 mistura comédia sofisticada com policial de mistério e lança o mais charmoso casal de detetives de Hollywood, Nick e Nora Charles , saborosamente interpretados por William Powell e Myrna Loy. Van Duke, talvez inspirado pelo espirituoso e bem elaborado roteiro adaptado da obra de Dashiel Hammett elaborado por Albert Hackett e Francis Goodrich, improvisou bastante durante as filmagens, que levaram apenas 16 dias para serem feitas, fato raro na produção classe “A”. O filme foi indicado para o Oscar, o mesmo ocorrendo com Van Dyke, William Powell, Hackett e Goodrich e, de 1936 a 1947, o estúdio MGM realizou uma série de mais cinco exemplares (três dos quais também sob a direção de Van Dyke: A Comédia dos Acusados / After the Thin Man / 1936, O Hotel dos Acusados / Another Thin Man / 1939 e A Sombra dos Acusados / Shadow of the Thin Man / 1941) com os mesmos personagens, os mesmos predicados de um bom passatempo, e o cãozinho Asta, uma atração à parte.

Robert Montgomery, Joan Crawford e Clark Gable em Quando o Diabo Atiça

Depois de A Ceia dos Acusados, Van Dyke realizou outros dois bons entretenimentos: Amor Que Regenera / Hide-Out / 1934 e Quando o Diabo Atiça / Forsaking All Others / 1934. No primeiro filme, um gângster “Lucky” Wilson (Robert Montgomery) é ferido ao fugir da polícia e vaiesconder em uma propriedade rural. Alí ele se apaixona pela filha do fazendeiro, Pauline (Maureen O’Sullivan), e diante dos exemplos positivos das pessoas boas que a cercam, adota seus valores, regenerando-se. No segundo filme, Jeff Williams (Clark Gable) retorna do exterior a fim de propor casamento à socialite Mary Clay (Joan Crawford), a quem amava secretamente desde a infância, sem saber que Mary concordou em se casar com Dillon Todd (Robert Montgomery), por quem ela era apaixonada desde criança. Estes três grandes astros da MGM formam o triângulo amoroso nesta comédia romântica cujo roteiro, escrito por Joseph L. Mankiewicz, surpreende pela quantidade de cenas pastelão. Até Joan Crawford em certo ponto do relato se vê fazendo acrobacia em uma bicicleta, para acabar caindo em um chiqueiro. Van Dyke conseguiu que o filme alcançasse a sua finalidade: simplesmente divertir.

Jeanette MacDonald e Nelson Eddy em Oh, Marieta!

O ano de 1935 marcou o encontro de Van Dyke com a soprano Jeanette MacDonald e o barítono Nelson Eddy. A opereta Oh, Marieta! / Naughty Marietta / 1935,e passada a maior parte na Lousiana dos tempos coloniais, reúne pela primeira vez na tela a dupla famosa. Com roteiro agradável de John Lee Mahin, Frances Goodrich e Albert Hackett, score de Victor Herbert, do qual sobressai “Ah, Sweet Mystery of Life”, e direção competente de Van Dyke, a realização agradou em cheio o público, tendo sido escolhida para concorrer ao Oscar.

Jeanette MacDonald e NelsonEddy em Rose Marie

Era inevitável que a combinação de Jeanette MacDonald e Nelson Eddy tivesse que ser repetida tal como havia sido o caso de William Powell e Myrna Loy depois de A Ceia dos Acusados. Van Dyke dirigiu mais quatro filmes com eles – Rose Marie / Rose Marie /1936, Cancão de Amor / Sweethearts / 1938 Divino Tormento / Bitter Sweet / 1940 e Casei-me Com um Anjo / I Married an Angel / 1942 -, todos mantendo o mesmo nível artístico, e outros diretores se encarregaram dos demais.

Van Dyke, Nelson Eddy e Jeanette MacDonald conversam durante a filmagem de Canção de Amor

Entre os anos de 1935 até o final de sua carreira cinematográfica o prolífico Van Dyke incumbiu-se de mais 17 filmes, além dos já citados: Só Assim Quero Viver / I Live My Life / 1935 (comédia sofisticada com Joan Crawford e Brian Aherne); Cidade do Pecado / San Francisco / 1936; A Mulher do Meu Irmão / His Brother’s Wife / 1936 (drama romântico com Barbara Stanwyck e Robert Taylor; O Diabo é um Poltrão / The Devil is a Sissy / 1936 (comédia dramática com Freddie Bartholomew, Jackie Cooper e Mickey Rooney); Do Amor Ninguém Foge / Love on the Run / 1936 (comédia romântica com Joan Crawford, Clark Gable e Franchot Tone); Seu Criado, Obrigado / Personal Property / 1937 (comédia romântica com Jean Harlow e Robert Taylor); O Mundo Ensinou-me a Matar / They Gave Him a Gun / 1937 (drama criminal com Spencer Tracy, Franchot Tone e Gladys George); Rosalie / Rosalie / 1937 (adaptação de um musical da Broadway, renovado pelas canções de Cole Porter, com Nelson Eddy e Eleanor Powel) ; Maria Antonieta / Marie Antoinette / 1938; O Amor de um Espia / Stand Up and Fight / 1939 (drama histórico com Robert Taylor, Wallace Beery e Florence Rice);

Que Mundo Maravilhoso! / It’s a Wonderful World / 1939 (screwball comedy com Claudette Colbert e James Stewart); Andy Hardy é o Tal / Andy Hardy Gets Spring Fever / 1939 (comédia romântica da série Andy Hardy com Mickey Rooney, Lewis Stone e Ann Rutherford); A Mulher Que Eu Quero / I Take This Woman / 1940 (drama com Spencer Tracy e Hedy Lamarr); Nem Só Os Pombos Arrulham / I Love You Again / 1940 (comédia screwball com William Powell e Myrna Loy); Fúria no Céu / Rage in Heaven / 1941 (thriller psicológico com Robert Montgomery, Ingrid Bergman e George Sanders); Ciúme Não é Pecado / The Feminine Touch (comédia com Rosalind Russell, Dom Ameche e Kay Francis); Seu Grande Triunfo / Dr. Kildare ‘s Victory /1942 (drama criminal da série Dr. Kildare com Lew Ayres e Lionel Barrymore); Cairo / Cairo / 1942 (comédia-dramática com Jeanette MacDonald e Robert Young) e Sublime Alvorada / Journey for Margaret (drama passado durante a Segunda Guerra Mundial com Robert Young, Laraine Day e Margaret O’Brien).

Entre esses 17 filmes não há nenhum ruim, merecendo todos uma cotação entre regular e bom, com exceção de Cidade do Pecado e Maria Antonieta, que se destacam com uma melhor avaliação.

Clark Gable e Spencer Tracy em Cidade do Pecado

D.W. Griffith e W.S.Van Dyke na filmagem de Cidade do Pecado


Clark Gable, Jack Holt, Spencer Tracy e Jeanette MacDonald em Cidade do Pecado

A MGM gastou cerca de um milhão de dólares na produção de Cidade do Pecado, adaptação feita por Anita Loos da história de Robert Hopkins, cujo climax é a espetacular recriação do terremoto que devastou San Francisco em 1906, sequência com efeitos especiais a cargo de James Basevi e seus colaboradores, entre eles, no montage, Slavo Vorkapich. Blackie Norton (Clark Gable) é o dono de um cabaré em Barbary Coast e o Padre Tim Mullin (Spencer Tracy), seu amigo de infância. Ambos, cada um por motivos diferentes, se preocupam com Mary Blake (Jeanettte MacDonald), cantora cortejada por outro empresário Jack Burley (Jack Holt). Indicado para o Oscar, o filme faturou quatro milhões de dólares. Van Dyke, Spencer Tracy, Robert Hopkin e Joseph Newman (como assistente de diretor) também receberam indicações. Quando Van Dyke soube que David Wark Griffith ia visitar o seu set, ele mandou colocar o nome dele em uma cadeira de diretor: como gesto de seu profundo respeito pelo mestre, entregou-lhe a direção de uma das cenas do terremoto, e se colocou atrás dele ao fundo, observando-o.

Tyrone Power e Norma Shearer em Maria Antonieta

Van Dyke, Norma Shearer e Tyrone Power no intervalo de filmagem de Maria Antonieta

Retornando às telas depois de ficar afastada dois anos por causa da morte do marido, Irving Thalberg, Norma Shearer encabeçou o elenco de Maria Antonieta produção magnificente baseada na biografia de Stefan Zweig, que já vinha sendo planejada desde 1933. Para formar o par romântico, a MGM foi buscar Tyrone Power (Conde Fersen) na Fox e, para representar Luis XVI, depois de cogitado Charles Laughton, trouxe Robert Morley da Inglaterra. Depois de Norma Shearer (indicada para o Oscar) é Robert Morley (também indicado) quem marca melhor a presença, seguido por John Barrymore no pitoresco Louis XV. O diretor de arte Cedric Gibbons foi outro indicado para a estatueta da Academia. Às vésperas do primeiro dia de filmagem, Louis B. Mayer e o produtor Hunt Stromberg resolveram substituir o diretor Sidney Franklin pelo rápido Van Dyke.

Robert Morley e Norma Shearer em Maria Antonieta

Além de sua capacidade profissional, o cineasta ficou conhecido por ter empregado atores que estavam sem trabalho e em dificuldades. Ele também atuou anônimamente, refilmando cenas de filmes de outros diretores, com as quais o estúdio não estava satifeito (v. g. em O Prisioneiro de Zenda / The Prisoner of Zenda / 1937) ou, alternativamente, filmando cenas adicionais julgadas necessárias para uma boa continuidade.

Diagnosticado com câncer e um sério problema cardíaco no início dos anos 40, sendo um Cientista Cristão convicto, Van Dyke se recusou a se submeter a qualquer tratamento médico de suas doenças. Sua saúde deteriorou-se muito em 1943, e ele cometeu suicídio em 5 de fevereiro do mesmo ano. Tinha 53 anos de idade.

O PERIGO DE IR AO CINEMA NA AMÉRICA

Durante os primeiros cinquenta anos do Cinema Americano o ato de ir ao cinema era um processo arriscado, cheio de perigos físicos e morais. Os incêndios de filmes eram inúmeros, ceifando muitas vidas assim como os assaltos a cinemas, que se tornaram particularmente comuns durante a Grande Depressão. Disputas trabalhistas provocavam a explosão de bombas nos cinemas enquanto que assassinos, prostitutas e molestadores exerciam suas atividades nas salas escuras. Isso sem falar da propagação de doenças, tanto reais (v. g. gripe) como imaginárias (v. g. fadiga ocular), devido a locais de exibição sanitariamente precários e mal ventilados.

Os espectadores ainda se confrontavam com um conjunto de perigos morais combatidos por Leis Puritanas que proibiam exibição de filmes aos domingos. Prêmios e loterias nos palcos dos cinemas eram outro problema, condenados por políticos e clérigos por serem considerados um jogo imoral.

Em inúmeras ocasiões, ocorreram desabamentos do teto ou o elevado número de pessoas na sala de espera fez o assoalho desmoronar. Em outras vezes, os espectadores causavam distúrbios durante a projeção do filme, fazendo barulho, gritando palavras obcenas, jogando objetos contra a tela ou em outros membros da platéia, brigando entre si ou vandalizando o cinema. O pânico provocado por um alarme falso de incêndio ou um simples cheiro de fumaça também era um transtorno.

Fiquei ao par de tudo isto ao ler “The Perils of Moviegoing in America: 1896-1950” de Gary D. Rhodes (Continuum Press, 2012), pesquisa profunda, original e inédita sobre a prática de assistir filmes nas primeiras décadas do cinema. O autor, professor com doutorado da Queen’s University de Belfast, Irlanda do Norte, consultou centenas de jornais, revistas especializadas e outros documentos, e organizou seu livro em sete capítulos, cada qual abordando um perigo associado com o assunto tratado.

No primeiro capítulo, Rhodes investiga os inúmeros incêndios relacionados com a projeção de filmes que ocorreram entre 1897 e 1950, verdadeira praga nos primeiros tempos do novo invento, provocados por luzes muito quentes e próximas de materiais inflamáveis, como o celulóide em cabines de projeção improvisadas dentro de edifícios destinados a outros propósitos que o de exibir filmes – quando o filme de nitrato pegava fogo, ele queimava rapidamente, pois seu grau de combustão era 15 vezes maior que o da madeira, em parte porque gerava o seu próprio oxigênio.

Gary D. Rhodes

Rhodes cita vários incêndios ocorridos em diversas cidades dos Estados Unidos como, por exemplo, um ocorrido na cidade de Seneca Falls em 1889, quando as chamas do projetor incendiaram as cortinas e, durante o pânico, uma mulher deixou cair seu filhinho ao desmaiar; felizmente um fazendeiro conseguiu retornar pelo meio da multidão a fim de salvar a criança. Outro acidente mais dramático relatado por Rhodes, aconteceu em Lockport, Nova York em 1907. Albert Phillips, um projecionista de 21 anos do Arcana Theatre liderou o combate ao fogo que saiu de uma lâmpada que estava colocada diretamente sobre o seu projetor. Ajudado por duas pessoas da platéia, ele calmamente encaminhou as pessoas para a saída do cinema. Em consequência, todos escaparam ilesos. Todos menos Phillips. Mesmo quando suas roupas já estavam pegando fogo, ele permaneceu no recinto em um esforço inútil para extinguir as chamas com suas próprias mãos. Quando os bombeiros entraram na cabine de projeção, encontraram seu corpo carbonizado ao lado do projetor.

Incêndios criminosos também causaram muitos danos. Após alguns deles, bombeiros encontravam sinais como latas de gasolina entre os destroços mas geralmente tinham muita dificuldade em identificar os culpados. A sociedade secreta Mão Negra foi supostamente responsável por um incêndio em um cinema em Nova York. Um fato nada surpreendente foi a descoberta de que alguns incendiários mal intencionados eram exibidores que necessitavam do dinheiro do seguro.

Cinema Lyric

Muitos empregados dos cinemas ajudaram a fazer parar o pânico. Quando o barulho de uma tempestade levou uma jovem a gritar, “Fogo!”, em Hartford, Connecticut em 1911, um projecionista escreveu às pressas em um slide e exibiu na tela a mensagem: “Não corram para fora. Somente os pecadores têm medo de trovão”. Músicos que trabalhavam em cinemas obtiveram muito sucesso em interromper o pânico. No Cinema Lyric em Wheeling, West Virginia no mesmo ano de 1911, uma pianista de 13 anos de idade, Amy Harris gritou para a platéia “Permaneçam sentados”, e tocou uma marcha excitante, para impedir a fuga precipitada dos espectadores. Esses são apenas alguns exemplos do que Rhodes relata no seu magnífico livro.

No segundo capítulo, ele examina os roubos, centenas dos quais ocorreram entre os primórdios do cinema até os anos 40. Excluídos os bancos, poucos estabelecimentos – especialmente em tempos de dificuldades econômicas como o da Grande Depressão – tinham normalmente mais dinheiro à mão do que os cinemas. E ao contrário dos bancos, eles raramente contavam com guardas de segurança. Os roubos em cinemas eram em geral de diferentes categorias. Quando os nickelodeons começaram a proliferar, os batedores de carteira roubavam os espectadores enquanto eles aguardavam na fila, na sala de espera, no banheiro ou enquanto assistiam o filme. Mais tarde, com o advento do filme de longa-metragem, os ladrões começaram a roubar as receitas da bilheteria. Alguns esperavam que os cinemas fechassem, arrombando cofres. Outros assaltavam cinemas durante as suas horas de operação, frequentemente ameaçando as pessoas com armas de fogo. Alguns batedores de carteira eram muito inventivos. Rhodes cita um caso ocorrido em um cinema de Nova York em 1923, quando um deles jogou pimenta malagueta no homem sentado ao seu lado. Assim que o homem começou a espirrar, o ladrão meteu a mão no seu bolso e levou dez dólares.

North Center Theater

Bandidos inteligentes perceberam que podiam roubar o dinheiro de um cinema sem estar dentro dele. Em 1926, dois ladrões sequestraram o tesoureiro do North Center Theater em Chicago, obrigando-o a entrar no cinema e abrir o seu cofre. Um dos sequestros mais lucrativos ocorreu em Kansas City. Os ladrões prenderam a esposa de um gerente de cinema em 1930 até que o marido lhes entregasse oito mil dólares. Ele fez tudo o que lhe mandaram e os malfeitores libertaram sua mulher sem um arranhão.

Porém o negócio de roubar cinemas foi se tornando mais perigoso. Em 1929, oito bandidos roubaram o Fox Folly no Brooklyn durante a exibição de um filme. A polícia chegou e houve um tiroteiro. Em 1929, em Mansfield, Ohio, dois homens armados disfarçados de mulher penetraram na sala do gerente Edward Rafter. Apesar das ameaças, ele se recusou a abrir o cofre e se agarrou a um dos bandidos. O pistoleiro desfechou quatro tiros, três dos quais atingiram Rafter. A dupla fugiu sem levar nada, deixando um Rafter ensaguentado, murmurando: “Eu fiz o que pude, fiz o que pude”. Ele morreu alguns dias depois no hospital.

Assalto e tiroteio no Hollywood Boulevard

Rhodes encerra o segundo capítulo relatando três estudos de caso sobre roubos de cinemas, um dos quais relativo ao do Grauman Chinese Theatre no dia 15 de julho de 1929, com perseguição e troca de tiros entre um policial e os assaltantes pelo Hollywood Boulevard.

O terceiro capítulo explora o problema do contágio e doença nos nickelodeons. Nos primeiros tempos da exibição cinematográfica na América, muitos especialistas argumentavam que a experiência de ver filmes poderia ser perigosa, causando por exemplo uma “fraqueza dos nervos”. Em Nova York, uma mulher assistia uma exibição de The Forest Ranger (Essanay, 1910). Quando os índios na tela escalpelaram suas vítimas, a mulher deu um grito e caiu da sua poltrona, deixando seu bebê cair também. Acendendo as luzes da sala de projeção, a administração se deparou com a mulher se convulsionando, supostamente induzida pelo filme. O bebê não sofreu nada, mas a mulher teve que ser conduzida para um hospital próximo, onde as convulsões continuaram. Os médicos informaram ao The New York Times que ela estava quase morta.

Outra idéia era a de que ver muitos filmes afetava a visão, causando fadiga ocular, que ganhou um novo nome em 1908: “Picturitis”. Um estudo mais condenatório foi feito por Ernest A. Dench o qual declarou que ver filmes por muito tempo era um “mal” para os olhos e contou a historia de uma jovem que teve problemas de retina danificada pela visão de filmes tremeluzentes. O optometrista aconselhou-a a não ver filmes de novo, senão “a paralisia do nervo ótico poderia ocorrer”. O medo contínuo da “Picturitis” levou a uma variedade de novas invenções, para tentar eliminar o tremor das imagens na tela, tais como o Vanoscope ou a Glifograph Screen. Aos poucos, o medo foi desaparecendo. Houve um pequeno retorno dele, quando os estúdios lançaram o programa duplo, porém logo ninguém mais tocou no assunto.

Havia também o temor de apanhar doenças contagiosas dentro dos nickelodeons, que eram insalubres e abafados. Vários produtos emergiram nos anos 10 para ajudar a melhorar esse ambiente desde desinfetantes a perfumes desodorizantes, destacando-se os sistemas de ventilação à base de ozônio. Entre as doenças possíveis de contágio estavam, varíola, escarlatina, difteria, coqueluche, poliomielite e a gripe.

Antes do final de outubro de 1918 (quando a Gripe Espanhola, pandemia do virus influenza que se espalhou por quase toda parte do mundo), o U. S. Surgeon General anunciou que os cinemas e outros prédios públicos deveriam ser fechados em toda a comunidade americana, embora alguns médicos achassem que isto não fosse necessário. Alguns estados interromperam a exibição de filmes dentro de suas fronteiras e, nas cidades onde os cinemas puderam continuar abertos, as receitas de bilheteria cairam tanto que alguns exibidores acharam melhor fechar suas portas voluntariamente. No início de 1919, a epidemia de gripe se dissipou, mas outras ocorreram durante os anos vinte embora o número de cinemas fechados fosse diminuindo na medida em que o tempo passava.

Porém o debate sobre como ventilar os cinemas tomou novo vigor, surgindo vários sistemas fabricados por companhias como a Typhoon e Arctic Nu-Air. O método preferido durante o referido decênio foi o ”Mushroom Ventilation”, que utilizava túneis sob o cinema para soltar ar através de orifícios no auditório. Nos meados da década, uma quantidade de cinemas havia instalado ar condicionado e, por volta de 1932, aproximadamente 300 cinemas dos Estados Unidos já tinham feito o mesmo.

O capítulo quarto cobre as centenas de bombas que detonaram durante a projeção de filmes entre 1912 e 1941. Durante os anos vinte, o State, tornou-se o mais famoso palácio do cinema de Hammond, Indiana. Uma noite, em novembro de 1927, várias bombas explodiram, transformando a sua bela e ornamentada arquitetura em um monte de destroços. Meses se passaram até a polícia prender dois homens em março de 1928. Um deles assinou uma confissão, revelando que se tratava de um golpe do magnata William Kleiheg para entrar com um pedido de indenização junto a companhia seguradora. Kleiheg pagou 2.500 dólares ao projecionista Joseph Million para colocar as bombas.

Cinema Hammond destruído

Outras foram usadas por motivo de vendeta entre donos de cinema concorrentes ou por mera intenção de pregar uma peça em alguém e criar um caos, sendo usadas, nesses casos, bombas de mau cheiro. Entretanto, a maioria delas jogadas em cinemas não foram resultado de vinganças ou travessuras. A maior parte foi fruto de disputas entre os sindicatos e as administrações dos cinemas. As razões dessas disputas variaram através dos anos. Por exemplo, com o advento do cinema falado no final dos anos vinte muitos donos de cinema decidiram despedir os músicos de suas orquestras. Como consequência, músicos sindicalizados coordenaram ataques com bombas a esses cinemas.

Porém os projecionistas (ou “operadores” como eram mais comumente chamados) preocupavam mais os administradores dos cinemas do que qualquer outra espécie de empregado. Embora os sindicatos desaprovassem formalmente suas ações, eles foram responsáveis pela maioria dos ataques, pois viam como ininigo os mesmos cinemas que empregavam operadores não sindicalizados ou que empregavam membros de um sindicato rival. Algumas vezes eles coordenaram várias explosões no mesmo dia. Em abril de 1934, bombardeadores em Pittsburgh, colocaram dinamite em quatro cinemas para explodirem na mesma manhã. No mesmo ano, em New England, atentados abalaram quatro cinemas em três diferentes cidades em uma mesma noite.

Cinema Mayfair

Durante a Grande Depressão, cinemas de Nova York também sofreram ataques de bombas. Dois cinemas da cadeia Loew foram atingidos em 1932. Quatrocentos espectadores sairam correndo do Cinema Mayfair após a explosão de bombas de mau cheiro em 1934. Em fevereiro de 1937 bombas de gás explodiram simultaneamente em seis cinemas na área da Broadway. Cada qual estava com a lotação quase completa o que significa que aproximadamente 6 mil espectadores tiveram que escapar do gás. Na tarde de 12 de setembro de 1937, Manhattan e o Bronx experimentaram a mais elaborada e coordenada série de ataques jamais montada nos Estados Unidos, quando bombas de gás explodiram em 21 cinemas diferentes. Rhodes dá outros exemplos e, tal como fez no final do segundo capítulo, encerra este, narrando três estudos de caso sobre o assunto.

O capítulo quinto aponta os molestadores e assassinos, que se aproveitavam do escuro do cinema para as suas práticas libidinosas ou criminosas bem como a atividade sexual consentida e a prostituição ilegal que aconteciam nesse ambiente.

Já em 1907, dois padres em Pasterson, New Jersey, aconselharam as mulheres jovens a não frequentar nickelodeons e, em 1915, a cidade de Dallas decretou leis especificamente proibindo conduta “lasciva, indecente ou vulgar” nos cinemas. Os reformadores apontavam a escuridão como o principal problema e uma das críticas mais virulentas dos nickelodeons, Anna Richardson, ofereceu uma solução bem simples: “Luz”. Alguns donos de cinema concordaram. Um deles em Yanktown, South Dakota anunciou que seu cinema tinha luz suficiente no auditório para “ler um jornal sem dificuldade”. Delegacias de Polícia e o Corpo de Bombeiros determinaram uma melhor iluminação nas salas e um senador da Califórnia, chegou a propor um projeto de lei que proibia toda sessão de cinema que não fosse à luz do dia.

Inventores também responderam a esse movimento tentando criar projetos que superariam o motivo pelo qual a escuridão parecia ser necessária: uma qualidade de imagem aceitável. Em 1910, o Variety publicou uma reportagem sobre o processo “Photoplane”, inventado por S. L. Rothapfel e no ano seguinte a Moving Picture World descreveu o “Casey Process” como extraordinário. Porém, apesar do anúncio ocasional de novos projetores e telas, a maioria das salas de cinema permaneceram escuras durante os anos dez e na décadas que se seguiram.

Em consequência, algumas cidades procuraram outras espécies de respostas. Em 1914, autoridades de Chicago promoveram a idéia de segregar a platéia em três setores, uma para homens, uma para mulheres e uma para homens e mulheres que vieram assistir o filme juntos. Embora este plano pudesse limitar a possibilidade para as prostitutas encontrar seus clientes, ele não impediria a atividade entre os casais que entraram no cinema juntos e por isso a idéia não vingou. Nos anos dez, algumas comunidades designaram policiais femininas para manter uma vigilância cuidadosa sobre os espectadores, mas a preocupação com os contatos indesejáveis continuou.

Em 1913, o Atlanta Constitution declarou que as sessões de cinema eram “lugares de procriação de vício” como a prostituição, e uma conferência de clérigos em Nova York abordou até o tema de que mulheres jovens estavam sendo recrutadas para a prostituição durante as sessões de cinema.

Conforme Rhodes nos informa, uma boa quantidade de “paqueradores”” e predadores sexuais de mulheres e crianças, também se aproveitou, da escuridão das salas de cinema, assim como, embora menos comumente, assassinos e vítimas de suicídio. O autor descreve inúmeros casos ocorridos em cinemas bem como as providências que foram tomadas a respeito. Em muitos casos os “paqueradores” foram presos e condenados, mas nem todos aceitaram tranquilamente a sua punição. Após ter sido preso por assediar uma moça em um cinema em Chicago em 1936, Robert Chrisouslas de 40 anos despejou sua raiva para Irving Fehlberg, o gerente do cinema, para o qual atirou e matou. Logo depois da meia-noite no dia 15 de outubro de 1937 o estado de Illinois executou Chrisouslas na cadeira elétrica.

O capítulo sexto investiga o dilema moral de assistir filmes aos domingos e a resultante luta contra as Leis Puritanas (“Blue Laws” como eram conhecidas) inspiradas no livro do Genesis, 2.2-3. Para protegê-las e expandí-las, formaram-se diversas organizações religiosas, sendo a Lord’s Day Alliance a mais influente com escritório na 5a Avenida em Nova York. Mas nem todos clérigos e fiéis a apoiaram questionando inclusive a base Bíblica para o fechamento dos cinemas no sétimo dia da semana. Alguns párocos preferiram exibir filmes religiosos aos domingos em suas próprias igrejas.

A indústria promoveu várias campanhas contra esse tipo de legislação. Em 1921, a Universal produziu uma comédia de dois rolos, Blue Sunday, na qual a dupla cômica Eddy Lyons e Lee Moran se encontrava “em toda situação concebível em conexão com o mais azul dos Domingos Azuis”. Porém em muitas ocasiões as autoridades foram inflexíveis. Em um cinema em 1927, por exemplo, um policial marchou para o auditório durante uma exibição, instruiu o organista para parar de tocar e – enquanto as luzes ainda estavam apagadas – usou uma lanterna e leu uma proclamação, ordenando que os espectadores se dispersassem dentro de uma hora ou seriam presos. Um grupo tão grande recusou-se a sair, que a polícia só conseguiu forçar um vigésimo deles a entrar no seu carro de patrulha.

Cinema Belmont

O capítulo sete conclui o livro com um estudo sobre os prêmios e loterias nos palcos dos cinemas. Eles já existiam desde os primeiros tempos dos nickelodeons, mas se intensificaram durante a Grande Depressão, quando os prêmios aumentaram de valor, apesar das restrições morais e legais que eles sofriam. No verão de 1933, Spyros Cardas, gerente do Cinema Belmont em Los Angeles, inventou a “Catalina Night”, premiando o ganhador felizardo com duas viagens para a Catalina Island e duas caixas de cerveja. Para evitar a acusação de jogatina, Cardas distribuia cartões tanto para as pessoas que haviam comprado ingresso como para o público em geral que estava fora do cinema, separando assim a possibilidade de ganhar o prêmio da necessidade de comprar entrada. Cards acreditava que, como um vencedor em potencial não precisava pagar para poder ouvir o anúncio de sua vitória e receber o prêmio, a Catalina Night” era legal. Mas, em agosto de 1933, um juiz municipal entendeu que a “Catalina Night” privilegiava aqueles que estavam dentro do cinema no momento do sorteio e condenou Cardas por ter violado a lei da Califórnia sobre loterias. Entretanto, a Superior Court of Los Angeles County, revogou a sentença de primeira instância, abrindo caminho para mais distribuições de prêmios nos cinemas através da América.

Uma das loterias mais famosas foi a “Bank Night”, lançada por Charles Yeager em um pequeno cinema em Las Cruces, New Mexico em 1933, e depois espalhada por todo o país. Embora ele não pudesse estar presente no primeiro sorteio, telefonou para o gerente do cinema, e soube de duas notícias: de um lado, os jornais locais e um grupo de cidadãos se queixaram dizendo que se tratava de um jogo imoral. De outro, o cinema faturou mais com a “Bank Night” do que havia ganho durante toda a semana precedente. Em consequência, Yeager e seu patrão, Frank H. “Rick” Ricketson, Jr., um advogado dono de uma cadeia de cinemas, formaram uma companhia chamada Affiliated Enterprises, para explorar a “Bank Night” como uma franquia alugada aos cinemas por 5 a 50 dólares por semana, dependendo do seu tamanho. No esquema da “Bank Night”, qualquer pessoa podia assinar seu nome em um livro colocado no saguão do cinema, sem ser obrigada a comprar um ingresso. Um número era escrito ao lado da assinatura e depois os números eram colocados em um cilindro giratório. Na noite do sorteio uma pessoa (preferencialmente uma menina) era selecionada na platéia, para tirar um número do cilindro. As regras determinavam que o feliz possuidor deste número deveria reclamar o prêmio dentro cinco, dez ou quinze minutos (a critério do gerente do cinema) a partir do momento em que o número vencedor fosse anunciado. Não era necessário que o vencedor estivesse no auditório, na calçada, ou em casa. Desde que chegasse no cinema dentro do tempo estabelecido, ele poderia reclamar o prêmio. Os que estavam fora do cinema eram informados do resultado por um alto falante ou pela colocação do nome do vencedor na bilheteria. Se um vencedor não aparecesse para reclamr seu prêmio, o dinheiro ficava acumulado para o sorteio da próxima semana. Em muitos casos, muitas semanas se passaram antes que um vencedor aparecesse. Prosseguindo na sua impressionante pesquisa, Rhodes se refere a vários problemas ocorridos com a “Bank Night” envolvendo batalhas legais de toda espécie, incluindo até responsabilidade por acidentes e tragédias como, por exemplo, o caso do senhor Fred Jung, um carpinteiro de 65 anos desempregado que, ao ouvir seu número anunciado como vencedor do prêmio de 400 dólares, sofreu um ataque cardíaco e morreu mais tarde na mesma noite. E houve ainda seu enfrentamento contra os competidores: Screeno, Cash Night, Gold Mine, Treasury Nights etc.

Cenas de Cinema de Bairro

Os males da “Bank Night” foram expressos em uma comédia curta de Hal Roach, Cinema de Bairro / Neighborhood House / 1936 na qual Charley Chase (interpretando ele mesmo) vai à uma “Bank Night com sua esposa Rosina (Rosina Lawrence) e sua filha Mary (Darla Hood). Quando o gerente do cinema (George Meeker) pede um voluntário, Mary corre para o palco para retirar o número do felizardo que vai receber o prêmio de 500 dólares. A príncipio ela acidentalmente recita o número de Charley, levantando assim as suspeitas da platéia. Então o gerente lê o mesmo número corretamente que, coincidentemente, é o de Mary. Charley corre para o palco com a finalidade de acalmar a multidão cada vez mais enfurecida, e pede ao gerente para tirar um novo número. É quando Rosina vence. A assistência indignada persegue Charley até sua casa e seu patrão (Dick Elliott) imediatamente o despede. Para apaziguar os ânimos, Charley insiste em devolver o dinheiro, a fim de que o cinema faça outra “Bank Night.” A turba o congratula, embora insistindo que o juiz da cidade (Gus Leonard) tire o novo número. Sua excitação se transforma em fúria novamente quando o patrão de Charley vence.

Enfim, “The Perils of Moviegoing in America” (do qual dei apenas uma amostra) é um livro que recomendo entusiasticamente para todos os que se interesssam pela História do Cinema, e ele me fez lembrar dois acidente trágicos que aconteceram aqui no nosso país: o pseudo incêndio do Cinema Oberdan em São Paulo e o desabamento do Cinema Rink em Campinas.

Cinema Rink

O Cinema Oberdan, inaugurado em 1927 pela Empresa Taddeo de Cinemas de Fernando Taddeo e irmão, era uma sala elegantíssima, luxuosa e entre os cinemas do bairro do Brás o mais moderno de sua época. Decorado com grandes estátuas, teto ricamente ornamentado com azulejos portugueses e com uma cúpula que se assemelhava a do Teatro Municipal, era uma sala (de 1216 lugares), que vivia lotada tanto em seus horários noturnos como em suas concorridas matinês. Tudo ia bem até o fatídico dia 11 de abril de 1938, quando uma idéia infeliz de um garoto deu início a uma tragédia que contabilizaria 32 mortos (31 crianças e 1 mulher). Um menino que assistia à matinê, sentindo fortes dores de barriga, tentou o auxílio de um lanterninha para se dirigir até o banheiro e, não encontrando nenhum, ele seguiu sozinho até lá. Sem ter tempo de chegar, ele acabou por fazer parte de suas necessidades no caminho e, ao se encontrar no toalete, as luzes estavam desligadas. Não tendo como se limpar no escuro, o menino decidiu atear fogo em um pequeno pedaço de jornal. Uma pessoa viu a chama e pensando que se tratava de um incêndio, gritou “fogo!”. Imediatamente começou uma correria desesperada que provocou todas essas mortes, a maioria por pisoteamento. O filme que estava sendo exibido naquele momento era Criminosos do Ar / Criminals of the Air / 1937, produzido pela Columbia, com Rita Hayworth em início de carreira. Por causa do terrível acidente, o seriado que viria em seguida, Ameaça das Selvas / Jungle Menace / 1937, com Frank Buck, não pôde ser exibido.

Cinema Oberdan

Na tarde do dia 16 de setembro de 1951, um domingo, a notícia correu célere pelo Brasil afora. Cerca de 1.200 pessoas, na maioria crianças, constituiam a assistência imensa da matinê do Cinema Rink em Campinas, quando teve início a projeção do segundo filme do programa duplo, Amar foi Minha Ruína / Leave Her to Heaven / 1945 (o primeiro havia sido A Noiva Era Ele / I Was a Male War Bride / 1949). Eram precisamente, 15.30 horas, quando um barulho impressionante foi ouvido e a parte central do telhado veio abaixo, soterrando centenas de pessoas. O balanço trágico desse desabamento assim se traduziu: mortos – 19 crianças e 11 adultos; feridos – mais de duzentos. O Cinema Rink fora inaugurado em 1878, inicialmente com uma casa de espetáculos especializada em patinação, possuindo também um salão para bailes e conferências; a partir de 1901 passou a haver sessões regulares do Cinematógrafo.

Cinema Alhambra

Outro acidente lamentável foi o incêndio do Cinema Alhambra, que pertencia ao empresário Francisco Serrador, situado na Praça Mahatma Gandhi, e com capacidade para 1448 espectadores. Funcionou de 9 de junho de 1932 a 9 de abril de 1939. Depois do seu fechamento para ser demolido, foi atingido por um grande incêndio em 11 de março de 1940. Uma explosão no depósito que guardava os celulóides facilmente inflamáveis dos cinemas da Empresa Serrador na Cinelândia, iniciou o incêndio, que destruiu a sala de projeção e os pisos superiores do edifício, praticamente não atingindo as lojas que haviam no pavimento térreo viradas para a rua. Parte de sua estrutura foi aproveitada para a construção, que já era prevista, do Edifício Serrador. Felizmente só decorreram prejuízos materiais, perdendo-se os guarda- roupas, malas e cenários da Companhia Procópio Ferreira, que estavam guardados em uma das salas do prédio, no qual não havia ninguém por ocasião do sinistro.